quarta-feira, 30 de abril de 2025

Nota: 30 de abril de 2025 - Notas sobre o Anticristo.

O relato ficcional do tema, desenvolvido por autores como Robert Hugh Benson e Vladimir Soloviev, encontra respaldo considerável no vasto cabedal de informações disponíveis sobre o assunto. Quando estudado com afinco, o tema revela nuances profundas que, se ignoradas, impedem qualquer compreensão séria e fundamentada.

Importante destacar que esse tema não é exclusivo de uma única tradição religiosa. Relatos sobre uma figura antagônica à fé estão presentes nas principais religiões do mundo. No cristianismo, ele é representado como a Besta, o Anticristo — aquele que, no fim dos tempos, surgirá para enganar, um usurpador que iludirá o mundo inteiro, mas que será derrotado por Cristo em sua segunda vinda.

No Islã, essa figura é conhecida como Al-Masih ad-Dajjal, o falso messias, descrito como cego de um olho e destinado a se declarar Deus antes do juízo final — sendo vencido por Isa (Jesus).

No hinduísmo, sua contraparte aparece como Kali, o rei demoníaco, cuja presença marca o Kaliyuga, a era da degeneração espiritual. Ele será destruído por Kalki, o avatar final de Vishnu.

No zoroastrismo, a figura equivalente é Ahriman, o espírito do mal que trava uma batalha cósmica contra a ordem divina. No gnosticismo, surgem os Arcontes, entidades que aprisionam a alma e deturpam a verdade. Nas mitologias nórdicas, vemos essa mesma ideia manifestar-se na figura de Loki, o trapaceiro que provoca o caos e antecipa o Ragnarök.

Em todas essas tradições, trata-se de um sujeito dotado de autoridade — ainda que falsa — que usurpa, corrompe, degenera e se opõe a tudo que é bom; em suma, finge ser Deus e tem como intuito a destruição da ordem.

Dito isso, pensemos um pouco sobre o tema e comparemos com nossa condição real. É fato que existe uma ordem — uma estrutura que se finca na exposição daquilo que é sagrado: sua imagem, sua tradição. Essa ordem sustenta e movimenta nossa verdadeira condição — a de sermos seres humanos, dotados de consciência. Por meio dela, nossos instintos são elevados a uma dimensão sagrada, e a consciência, em comunhão com essa ordem, é o que nos torna santos.

Sem essa ordem e sua regência — por nós aceita — seríamos como animais, cuja única finalidade na vida se resumiria a prazeres e alimentos.

Além disso, essa ordem também nos torna únicos — indivíduos que, possuindo personalidade, manifestam por meio dela suas potencialidades. Logo, o fim dessa ordem representa o fim da unidade humana, reduzindo o homem a uma parte inerme de um todo desconhecido.

O homem foi feito para a Verdade — ele é assim, e assim será. Sem uma Verdade concreta, ele sucumbirá a qualquer outra que lhe pareça atraente. Em suma, o ser humano precisa estar imerso em algo maior do que si mesmo.

No que tange à ordem, como já dito, ela é representada pelas coisas que sempre foram — a tradição. São elas, as coisas estabelecidas, que estando como sempre estiveram, permitem ver, abstrair, comparar e decidir.

Um exemplo é a racionalização do tempo: a tradição nos ensina que aquilo que passou é fato consumado — e contra fatos, não há argumentos. Outro exemplo é o que a tradição nos diz acerca da fé: ela é confiança em algo ou alguém que, não podendo ser separado da fonte, tem sua força na certeza que depositamos nessa origem.

Assim, a tradição nos guia, nos orienta — e, em tempos de dissolução, é ela quem preserva o que ainda resta de humano em nós.

Em contrapartida, qualquer tentativa de domínio sobre o gênero humano, por parte de uma entidade antagônica, deverá necessariamente passar pelo crivo da destruição dessa ordem. Será preciso dissolvê-la para, então, propor uma nova — fundada em bases opostas àquelas que sustentaram a humanidade até aqui.

Nesse cenário de domínio, o antagonista terá, como descreve um dos autores — o de O Senhor do Mundo —, de conduzir os povos dos quatro cantos da Terra à completa descrença na ordem tradicional. Benson apresenta um personagem nascido nos Estados Unidos, que é alçado à condição de presidente das Américas, Europa, Ásia e Oceania, justamente por sua capacidade de libertar o homem das "amarras" do sagrado.

Para isso, ele faz uso da política como instrumento de manipulação, chegando ao ponto de proibir o culto a qualquer religião, perseguir os crentes e destruir os símbolos do sagrado. Por fim, conduz o mundo a uma guerra santa contra a única autoridade espiritual ainda viva — exilada, mas resistente — localizada nos confins do Oriente Médio, pois Roma já teria sido destruída.

Soloviev não difere muito. Em sua obra, também descreve uma guerra final, liderada pela representação de Cristo na Terra: a Igreja. Nos trechos finais, o Santo Padre — figura da fé e da tradição — trava uma luta magnânima contra o Anticristo, simbolizando o embate último entre a Verdade eterna e a mentira globalizada.

Nos dois autores citados, assim como na exposição das diversas crenças, vemos que é por meio da política e da descrença na tradição que o jugo do Anticristo se iniciará. Ele será um homem de fé sem nenhuma fé, de amor sem nenhuma caridade, e de compromisso sem nenhum bem. Representará, em sua plenitude, a última forma de nossa dúvida — uma dúvida total, sem nenhuma certeza, sem nenhuma luz.

Durante muitos anos da minha vida, estive afastado da Santa Igreja. Joguei com ideias que, à época, acreditei serem minhas — mas que, em essência, não eram. Submeti-me ao ceticismo próprio destes tempos e flertei com ideias agnósticas e heresias das quais brotavam as mais variadas bizarrices.

Hoje, percebo que essa confusão interior só foi possível porque a ordem havia sido momentaneamente silenciada dentro de mim. Foi ao reencontrá-la — pela graça, não pelo mérito — que comecei, enfim, a compreender o sentido de tudo isso: o mundo sem Deus não é o mundo, mas sua caricatura. E o Anticristo, no fundo, não é outra coisa senão a sombra amplificada de nosso abandono da verdade.

Abandono esse que, por um tempo, me fez acreditar que seria da própria Santa Igreja que brotaria o Antagônico — o reformulador da Tradição, o príncipe da ante-ordem. Mas hoje, não vejo mais assim. Quando esse ser vier, ele nascerá da oposição àquilo que se deve amar — e àquilo que o homem moderno, enganado e mentiroso, passou a odiar. Ele virá sustentado por vozes que proclamam amor ao que, em última instância, deveria ser rejeitado.

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