terça-feira, 28 de outubro de 2025

Comentários a Metafísica - Livro VI/VIII - Santo Alberto Magno.

 


ALBERTI MAGNI — SUPER LIBROS METAPHYSICORUM ARISTOTELIS

Liber Sextus – De principiis causandi

(Livro Sexto — Sobre os princípios de causar)

Quaestio I — Utrum omnis effectus habeat causam efficientem.
Se todo efeito possui uma causa eficiente.

Quaestio II — Utrum eadem res possit esse causa efficiens et materialis.
Se a mesma coisa pode ser causa eficiente e material.

Quaestio III — Utrum causa efficiens sit prior causa materiali.
Se a causa eficiente é anterior à causa material.

Quaestio IV — Utrum causa efficiens operetur per formam.
Se a causa eficiente opera por meio da forma.

Quaestio V — Utrum causa efficiens moveatur a fine.
Se a causa eficiente é movida pelo fim.

Quaestio VI — Utrum causa efficiens agat per intentionem vel per naturam.
Se a causa eficiente age por intenção ou por natureza.

Quaestio VII — Utrum in causis efficientibus sit processus infinitus.
Se nas causas eficientes há processo infinito.

Quaestio VIII — Utrum sit una prima causa efficiens immota.
Se existe uma única causa eficiente primeira e imóvel.

Quaestio IX — Utrum causa efficiens sit causa essendi vel fiendi.
Se a causa eficiente é causa do ser ou do vir-a-ser.

Quaestio X — Utrum forma sit principium actionis in causis naturalibus.
Se a forma é o princípio da ação nas causas naturais.

Quaestio XI — Utrum agens agat propter assimilationem ad effectum.
Se o agente age por assimilação ao efeito.

Quaestio XII — Utrum agens et patiens conveniant in materia.
Se o agente e o paciente coincidem na matéria.

Quaestio XIII — Utrum agens per se differat ab agente per accidens.
Se o agente por si difere do agente por acidente.

Quaestio XIV — Utrum causa efficiens possit esse causa causarum.
Se a causa eficiente pode ser causa das causas.

Quaestio XV — Utrum agens naturale agat necessario.
Se o agente natural age necessariamente.

Quaestio XVI — Utrum agens voluntarium agat contingenter.
Se o agente voluntário age contingentemente.

Quaestio XVII — Utrum omne agens agat propter bonum.
Se todo agente age por causa do bem.

Quaestio XVIII — Utrum in causis agentibus sit ordo secundum dignitatem.
Se nas causas agentes há ordem segundo a dignidade.

Quaestio XIX — Utrum causa prima contineat virtute omnes causas inferiores.
Se a causa primeira contém virtualmente todas as causas inferiores.

Quaestio XX — Utrum causa prima agat in omnibus immediate.
Se a causa primeira age em todas as coisas de modo imediato.

Quaestio I — Utrum omnis effectus habeat causam efficientem

(Se todo efeito possui uma causa eficiente)

Objeções.

  1. Parece que nem todo efeito tem causa eficiente. Pois alguns seres são eternos, como as substâncias separadas e os corpos celestes. Ora, o que é eterno não tem princípio de movimento ou de geração. Logo, tais entes não possuem causa eficiente.
  2. Além disso, a forma substancial é princípio do ser das coisas. Ora, a forma é intrínseca e não agente. Logo, há efeitos que têm princípio formal, mas não eficiente.
  3. Ademais, a matéria-prima é princípio de individuação e de possibilidade do ser. Contudo, ela é pura potência e não age. Logo, há princípio sem causa eficiente.
  4. Ainda, Deus é o primeiro ser e não efeito de nada. Ora, se Ele é ente e não tem causa eficiente, nem todo ente é efeito que possua causa eficiente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro II da Física, ensina: “Omnis effectus reducitur ad aliquam causam efficientem.”
E Alberto comenta: “Nullum est quod fiat nisi ab aliquo agente; quia esse in effectu est per motum a causa efficiente.”
Logo, todo efeito tem uma causa eficiente.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que todo efeito possui uma causa eficiente, porque nada passa do não-ser ao ser senão por meio de um princípio em ato, que atualiza a potência e confere existência.

Com efeito, a causa eficiente é a origem do movimento e da mudança, e todo vir-a-ser implica passagem de potência para ato.
Ora, nada pode passar da potência ao ato por si mesmo, pois o mesmo seria causa de si — o que é impossível. Logo, toda produção requer um agente que mova e atue.

Assim, o efeito, enquanto efeito, depende essencialmente da causa eficiente, pois ser efeito significa ter recebido o ser de outro.
Alberto exprime isso com clareza:
“Causa efficiens est per quam aliquid est in actu quod prius erat in potentia.”
A causa eficiente é aquela pela qual algo está em ato, sendo antes em potência.

Por conseguinte, todo efeito, enquanto tal, tem uma causa eficiente — seja imediata, seja mediata, seja principal, seja instrumental.

Entretanto, há distinção entre dois modos de causalidade:

  1. Causa per se, que produz o efeito segundo sua própria virtude e intenção, como o artífice faz a estátua.
  2. Causa per accidens, que coopera indiretamente, como o operário que acidentalmente ajuda o artífice.

Mesmo assim, todo efeito procede de alguma causa eficiente, porque a inexistência absoluta de agente destruiria a possibilidade de produção.

Nos entes eternos e nos atos divinos, não há efeito no tempo, mas há razão causal eterna: Deus é causa eficiente não temporal, mas eterna, e os movimentos celestes são efeitos dependentes de sua influência constante.

Assim, pode-se dizer que todo efeito tem causa eficiente, seja no tempo, seja na eternidade, porque a causalidade não se reduz à sucessão temporal, mas à dependência ontológica.

E porque o ser do efeito depende da ação, e a ação depende do agente, a ausência de causa eficiente implicaria negação de ser.

Por isso, Alberto conclui:
“Sicut nihil est quod moveat se ipsum, ita nihil est quod efficiat se ipsum. Omnis effectus ergo habet causam efficientem.”
Assim como nada move a si mesmo, nada produz a si mesmo. Logo, todo efeito tem uma causa eficiente.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que os entes eternos não têm causa eficiente quanto ao início de seu ser, mas têm-na quanto à sua conservação e dependência de Deus, que é sua causa eficiente não temporal, mas essencial.
  2. À segunda, responde-se que a forma é princípio intrínseco, mas não eficiente. Ela determina o modo de ser, mas não confere o ser. O ato de dar o ser pertence à causa eficiente, não à forma enquanto tal.
  3. À terceira, deve-se dizer que a matéria é princípio de possibilidade, mas não de operação. Ela recebe, mas não produz. E tudo que é recebido procede de um agente que o dá. Logo, o ser da matéria mesma vem da causa eficiente suprema.
  4. À quarta, responde-se que Deus é exceção quanto ao ser efeito, porque é causa primeira e ato puro. Logo, Ele não é efeito, mas causa eficiente de todos os efeitos. Assim, o princípio da universalidade causal não se aplica àquele que é causa primeira.

Conclusão.

Todo efeito tem causa eficiente, porque nada pode passar do não-ser ao ser sem um princípio ativo que mova e atualize.
Mesmo os entes eternos dependem, quanto ao ser e à ordem, da Causa Primeira, cuja ação é eterna e imediata.

Por isso, Alberto conclui:
“Omnis effectus habet causam efficientem, vel temporalem vel aeternam; quia nulla res est quae non sit ab alio in actu.”
Todo efeito tem uma causa eficiente, temporal ou eterna, pois não há coisa alguma que não seja posta em ato por outro.

Quaestio II — Utrum eadem res possit esse causa efficiens et materialis

(Se a mesma coisa pode ser causa eficiente e material)

Objeções.

  1. Parece que a mesma coisa pode ser causa eficiente e material. Pois o homem gera o homem, e aquele que gera é causa eficiente, enquanto o gerado é constituído da mesma matéria específica. Logo, a mesma natureza que é matéria no gerado é agente no gerador.
  2. Além disso, em todas as mudanças naturais, a forma do agente e a forma do paciente são da mesma espécie; ora, a matéria do paciente é o sujeito que recebe a forma. Portanto, a forma que move e a matéria que é movida participam da mesma essência. Logo, parece que a mesma realidade pode ser, sob certo aspecto, causa eficiente e material.
  3. Ademais, Aristóteles afirma que “em certos seres a causa e o causado são um e o mesmo segundo o gênero, embora distintos segundo o ser”. Ora, a matéria e o agente pertencem a um mesmo gênero natural, ainda que diversos na operação. Logo, a mesma coisa pode ser, em certo sentido, causa eficiente e material.
  4. Ainda, tudo que é perfeito pode comunicar sua perfeição. Ora, a matéria é princípio potencial do ser, e quando atualizada, pode agir. Logo, a mesma realidade pode ser primeiro matéria e depois causa eficiente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro II da Física, ensina: “Nihil agit in se ipsum.”
E Alberto comenta: “Causa efficiens et materialis opponuntur sicut agens et patiens; non potest ergo idem esse utrumque secundum eandem rationem.”
Logo, a mesma coisa não pode ser simultaneamente causa eficiente e material.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que é impossível que a mesma coisa seja simultaneamente, segundo a mesma razão, causa eficiente e material, porque esses dois princípios se opõem formalmente: o agente é princípio de movimento, o paciente (ou a matéria) é o que é movido.

A causa eficiente atua em razão do ato, e a causa material recebe em razão da potência. Ora, ato e potência não podem coexistir no mesmo sujeito sob a mesma relação.
Assim, enquanto algo é agente, está em ato; enquanto é matéria, está em potência. Logo, a mesma coisa não pode ser, ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto, causa eficiente e material.

Contudo, pode sê-lo por analogia ou sob diversos aspectos.
Há três modos em que isso ocorre:

  1. Por identidade específica e distinção numérica.
    Assim, o homem gera o homem: a natureza humana é uma só em espécie, mas diversa em número entre o gerador e o gerado. O agente e o paciente pertencem à mesma espécie, mas não ao mesmo indivíduo.
  2. Por sucessão de estados.
    Em um mesmo sujeito, algo pode ser matéria antes e agente depois. Por exemplo, o ar é matéria enquanto recebe a luz, e causa eficiente enquanto a reflete. Aqui há alternância, não simultaneidade.
  3. Por participação causal.
    Em certos seres inferiores, a matéria age por virtude de uma forma recebida. Assim, o ferro aquecido queima; ele é material quanto ao calor recebido, mas eficiente quanto ao efeito que produz sobre outro corpo. Nesse caso, a causalidade eficiente é acidental, derivada da forma e não da matéria como tal.

Portanto, a mesma coisa pode ser eficiente e material secundum quid, mas não simpliciter.
Alberto expressa isso claramente:
“Eadem res potest esse efficiens et materialis secundum aliud et aliud; sed non secundum idem.”
A mesma coisa pode ser eficiente e material segundo aspectos diversos, mas não segundo o mesmo.

Logo, a distinção essencial permanece:
– a causa material é princípio passivo e receptivo;
– a causa eficiente é princípio ativo e produtivo;
– e a passagem de uma à outra só ocorre pela atualização da potência, isto é, pela forma que comunica o ato.

Assim, em toda produção, há distância ontológica entre o que age e o que é agido, ainda que ambos compartilhem a mesma espécie.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o homem gera o homem, mas não a si mesmo. O gerador e o gerado têm a mesma natureza específica, não o mesmo indivíduo. Assim, o agente e o paciente são semelhantes, mas distintos; logo, não são a mesma coisa.
  2. À segunda, responde-se que a semelhança entre forma agente e forma paciente é de espécie, não de número. Assim, o que é movido e o que move têm a mesma natureza, mas não a mesma existência.
  3. À terceira, deve-se dizer que a unidade de gênero entre causa e causado não implica identidade de essência. O fogo e o carvão pertencem ao mesmo gênero físico, mas o fogo é agente e o carvão paciente.
  4. À quarta, responde-se que a matéria pode tornar-se causa eficiente, mas somente após receber forma, não enquanto é pura potência. Assim, o que é primeiro matéria pode, depois de atualizado, agir como agente; mas não o faz enquanto matéria, e sim enquanto forma.

Conclusão.

A mesma coisa não pode ser simultaneamente causa eficiente e material sob o mesmo aspecto, pois o agente é em ato e a matéria é em potência.
Contudo, pode sê-lo por analogia, sucessão ou participação, conforme a distinção de modos de causalidade.

Por isso, Alberto conclui:
“Non est idem simpliciter efficiens et materiale; sed idem potest utrumque esse diversis modis et respectibus.”
Não é o mesmo, de modo absoluto, o que é eficiente e o que é material; mas a mesma coisa pode ser ambos sob modos e relações diversas.

Quaestio III — Utrum causa efficiens sit prior causa materiali

(Se a causa eficiente é anterior à causa material)

Objeções.

  1. Parece que a causa eficiente não é anterior à causa material. Pois a matéria é o primeiro sujeito do ser, e o ser de toda coisa composta depende dela. Ora, o que é princípio do ser é naturalmente anterior ao que move para o ser. Logo, a causa material é anterior à causa eficiente.
  2. Além disso, o agente não pode agir senão sobre algo já existente. Ora, o existente sobre o qual o agente atua é a matéria. Logo, a matéria precede o agente, e, portanto, a causa eficiente não é anterior à causa material.
  3. Ademais, a potência é naturalmente anterior ao ato, porque o ato a supõe e a aperfeiçoa. Ora, a matéria é potência, e a causa eficiente é ato. Logo, a matéria é naturalmente anterior à causa eficiente.
  4. Ainda, em toda geração, a causa eficiente requer matéria prévia, como no caso do escultor que precisa do bronze. Logo, a matéria é anterior à causa eficiente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro II da Física, ensina: “Agens est principium motus in alio.”
E Alberto comenta: “Causa efficiens est prior materiali ordine perfectionis, quia materia non movetur nisi mota ab agente.”
Logo, a causa eficiente é anterior à causa material segundo a ordem de perfeição e causalidade.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a causa eficiente é anterior à causa material, não segundo a ordem do tempo ou da existência passiva, mas segundo a ordem da perfeição e da razão de causalidade.

Com efeito, a matéria é princípio potencial do ser, e a causa eficiente é princípio atual. Ora, o ato é naturalmente anterior à potência, porque a potência se define pela ordenação ao ato, e não o contrário.
Assim, a causa eficiente é anterior à causa material em dignidade e natureza, embora a matéria seja anterior quanto ao sujeito sobre o qual se age.

Alberto distingue três modos de anterioridade:

  1. Segundo o tempo: neste sentido, a matéria precede, porque o agente encontra o sujeito já existente.
  2. Segundo a natureza: o agente é anterior, porque é por sua virtude que a matéria se move à forma e ao ser.
  3. Segundo a perfeição: o agente é mais nobre e mais próximo do ato puro, enquanto a matéria permanece no grau inferior da potência.

Logo, a prioridade não é cronológica, mas ontológica: o agente é o fundamento do ser da matéria enquanto ordenada à forma, pois sem o influxo da causa eficiente, a matéria permaneceria em pura indeterminação.

Assim, Alberto escreve:
“Agens est prius quam materia, quia materia non haberet ordinem ad formam nisi ab agente.”
O agente é anterior à matéria, porque esta não teria ordem à forma senão por causa do agente.

Portanto, embora a matéria preexista em certo sentido, sua ordenação ao ato depende essencialmente da causa eficiente.
Sem o agente, não há atualização da potência, nem movimento, nem geração.

Por isso, Aristóteles chama o agente de “primum movens secundum esse”, pois ele é o primeiro em dignidade e causalidade, ainda que atue sobre o que preexiste.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a matéria é princípio do ser composto, mas não princípio do movimento nem da atualização. O agente é anterior quanto à origem do ato, e a matéria apenas quanto ao sujeito passivo.
  2. À segunda, responde-se que a preexistência da matéria não implica prioridade de natureza, mas de tempo e de posição. A matéria é sujeito, mas o agente é princípio de operação. O que move é mais nobre do que o que é movido.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora a potência seja anterior ao ato segundo o conceito de possibilidade, é posterior segundo o conceito de perfeição e de causa. A potência não se define senão em relação ao ato, que é o seu fim.
  4. À quarta, responde-se que a necessidade de matéria para a operação não destrói a prioridade do agente, mas a confirma. Pois o agente é o que dá à matéria a capacidade de receber a forma. Assim, o escultor depende do bronze para agir, mas o bronze depende mais do escultor para tornar-se estátua.

Conclusão.

A causa eficiente é anterior à causa material, não no tempo, mas na ordem da natureza e da perfeição, pois a matéria é potência que recebe, e o agente é ato que move e determina.
A anterioridade do agente é a da nobreza e do fundamento do ser, sem o qual a matéria seria pura indeterminação.

Por isso, Alberto conclui:
“Causa efficiens est prior materiali ordine perfectionis et naturae, licet posterior tempore in operatione.”
A causa eficiente é anterior à material segundo a ordem da perfeição e da natureza, ainda que posterior no tempo da operação.

Quaestio IV — Utrum causa efficiens operetur per formam

(Se a causa eficiente opera por meio da forma)

Objeções.

  1. Parece que a causa eficiente não opera por meio da forma. Pois o agente é princípio do movimento, e o movimento se inicia na vontade ou no apetite, que não são forma, mas potências. Logo, o princípio da operação não é a forma, mas a potência apetitiva.
  2. Além disso, o fogo aquece porque é quente. Ora, o calor é acidente, e não forma substancial. Portanto, o agente não age por meio da forma, mas por meio do acidente.
  3. Ademais, o agente natural age necessariamente. Ora, a necessidade pertence ao movimento enquanto tal, e não à forma. Logo, o princípio da operação é o movimento, não a forma.
  4. Ainda, nas ações espirituais, como o conhecimento e o amor, a operação procede do intelecto e da vontade, que são potências, não formas. Portanto, o agente não opera por meio da forma.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro II da Física, ensina: “Omne agens agit per formam quam habet.”
E Alberto comenta: “Forma est radix operationis, quia per eam agens est in actu.”
Logo, a causa eficiente opera por meio da forma que possui.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que toda causa eficiente opera por meio da forma, pois nada age senão enquanto está em ato, e a forma é precisamente o ato pelo qual o agente é tal qual é.

A forma é o princípio pelo qual o agente participa do ser em ato; assim, o calor no fogo é o que o torna aquecedor, e a alma no homem é o que o torna vivente e cognoscente.
Por conseguinte, a operação deriva formalmente da forma e instrumentalmente das potências que a seguem.

De fato, o agente natural age porque possui uma forma que é semelhança exemplar daquilo que produz no efeito.
Assim, o fogo aquece por causa de sua forma ígnea, e o homem gera o homem segundo a forma específica que nele reside.
Por isso, Aristóteles chama a forma de principium agendi in omnibus agentibus naturalibus.

Todavia, é preciso distinguir três modos de causalidade formal no agir:

  1. Forma como princípio intrínseco da operação:
    Em todo agente natural, a forma é o fundamento pelo qual ele opera.
    Exemplo: o calor é a razão formal pela qual o fogo aquece.
  2. Forma como razão exemplar:
    Em agentes intelectuais, a forma inteligida (a espécie no intelecto) é a causa pela qual o artífice produz a obra.
    Assim, o artífice faz a casa segundo a forma da casa que tem em sua mente.
  3. Forma como comunicação de ato:
    Todo agente produz no paciente uma semelhança de sua própria forma; por isso, a ação é sempre “per assimilationem formae”.
    Assim, o agente não transfere substância, mas comunica a similitude de sua forma.

Deste modo, a forma é o princípio imediato do agir, e as potências são apenas meios pelos quais a forma se manifesta.
Alberto expressa isso claramente:
“Agens non agit nisi secundum quod est in actu, et hoc habet per formam; ergo agit per formam.”
O agente não age senão enquanto está em ato, e isso ele tem pela forma; logo, age por meio da forma.

Portanto, a operação é efeito da forma em ato, não da matéria em potência.
Mesmo nas potências intelectuais e volitivas, a forma inteligida ou amada é o termo que move à ação; pois o intelecto age conforme a espécie inteligida, e a vontade conforme o bem apreendido.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o apetite e a vontade não agem por si mesmos, mas em virtude da forma do bem apreendido. A potência é o instrumento; a forma apreendida é o motivo e princípio da operação.
  2. À segunda, responde-se que o calor, embora acidente, deriva da forma substancial do fogo. Assim, o fogo não aquece enquanto possui um acidente isolado, mas enquanto esse acidente exprime a forma ígnea que é ato substancial.
  3. À terceira, deve-se dizer que o movimento segue a forma do agente. A necessidade de agir deriva da forma necessária — por exemplo, o fogo age necessariamente porque sua forma é tal que não pode não agir.
  4. À quarta, responde-se que nas ações espirituais também se opera por meio da forma: o intelecto entende pela forma inteligida e a vontade ama pela forma do bem. Logo, também aí a forma é princípio do agir, embora em modo superior.

Conclusão.

A causa eficiente opera por meio da forma, porque a forma é o princípio do ato, e nada age senão enquanto está em ato.
Assim, toda operação é a comunicação de uma forma, seja física, seja intelectual, seja espiritual.

Por isso, Alberto conclui:
“Omne agens agit per formam suam; quia forma est actus, et actus est principium agendi.”
Todo agente age por sua forma; pois a forma é ato, e o ato é o princípio de agir.

Quaestio V — Utrum causa efficiens moveatur a fine

(Se a causa eficiente é movida pelo fim)

Objeções.

  1. Parece que a causa eficiente não é movida pelo fim. Pois o fim é o termo do movimento, e o agente é o princípio do movimento; ora, o princípio não depende de seu termo para existir. Logo, o agente não é movido pelo fim.
  2. Além disso, o fim, enquanto futuro, ainda não é; mas o que não é não pode mover nem causar. Portanto, o fim não pode mover o agente.
  3. Ademais, em agentes naturais, como o fogo que aquece, não há conhecimento do fim nem deliberação sobre ele. Portanto, o fim não move o agente natural, e, por conseguinte, a causa eficiente não é movida pelo fim.
  4. Ainda, o fim pertence à ordem da causa final, e a causa eficiente à ordem da produção; logo, sendo ordens diversas, uma não move a outra.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro II da Física, ensina: “Finis est causa causarum et movet agentem.”
E Alberto comenta: “Finis movet causam efficientem, quia ipsum appetitur tam in naturalibus quam in voluntariis.”
Logo, a causa eficiente é movida pelo fim.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que toda causa eficiente é movida pelo fim, ao menos sob algum aspecto, pois nada age senão em ordem a algo que é considerado bom ou conveniente.

O fim é aquilo por causa do qual o agente age (propter quod agit).
Assim, o fim é, em certo sentido, primeiro na intenção, ainda que último na execução.
E porque o agente tende ao fim, é movido por ele, não como por uma causa eficiente anterior, mas como por um motivo de movimento, que o atrai ou o determina à ação.

Há, porém, duas maneiras pelas quais o fim move o agente:

  1. Por conhecimento e deliberação, como ocorre nos agentes voluntários.
    O homem age visando um bem conhecido e desejado; e, portanto, o fim é aqui causa real do movimento da vontade, que move as potências executivas.
  2. Por inclinação natural, como ocorre nos agentes naturais.
    Assim, o fogo tende naturalmente a comunicar o calor e a subir, porque seu fim natural é conservar sua forma e agir conforme ela.
    Neste caso, o fim não é conhecido, mas é impresso na natureza do agente pela inteligência divina que ordena todas as coisas ao bem.

Deste modo, o fim é causa do movimento em todos os níveis de causalidade:
nas coisas naturais, pela inclinação impressa;
nas racionais, pela deliberação e vontade;
nas causas primeiras, pela identidade entre ato e fim.

Por isso, Alberto afirma:
“Finis movet agentem sicut amatum movet appetentem.”
O fim move o agente como o amado move aquele que ama.

Em consequência, o fim é, em toda operação, o princípio formal da ordem causal, pois é por ele que o agente determina a si mesmo e às suas operações.
A ausência do fim tornaria a ação indeterminada, sem direção nem unidade.

Logo, o fim é causa das causas, pois:
a causa material é tal por causa do fim (é escolhida em vista dele);
a causa formal é especificada em vista do fim;
a causa eficiente é movida a agir por causa do fim.

Por conseguinte, o fim é a primeira causa em intenção, mas a última em execução.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o fim, embora último na ordem do movimento, é primeiro na ordem da intenção. Assim, o agente depende do fim não quanto ao ser, mas quanto ao agir.
  2. À segunda, responde-se que o fim, enquanto futuro no tempo, é presente na intenção do agente; logo, move não como existente atual, mas como objeto conhecido ou desejado, o que é suficiente para mover.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora os agentes naturais não conheçam o fim, são movidos por ele segundo uma ordenação divina, que lhes imprime uma inclinação natural para alcançá-lo. Assim, o fim move-os não por deliberação, mas por inclinação natural.
  4. À quarta, responde-se que a distinção entre causa final e eficiente não impede a ordenação de uma à outra; pelo contrário, exige-a, pois a causa eficiente seria cega sem o fim que a dirige.

Conclusão.

A causa eficiente é movida pelo fim, porque nada age senão em vista de algo que é ou parece bom.
O fim é, portanto, o primeiro na intenção e o último na execução, e move o agente tanto pela deliberação (nas causas voluntárias) quanto pela inclinação natural (nas causas naturais).

Por isso, Alberto conclui:
“Finis est causa causarum, quia movet efficientem et determinat omnes causas ad actum suum.”
O fim é a causa das causas, porque move a eficiente e determina todas as causas ao seu ato próprio.

Quaestio VI — Utrum causa efficiens agat per intentionem vel per naturam

(Se a causa eficiente age por intenção ou por natureza)

Objeções.

  1. Parece que toda causa eficiente age por intenção, e não por natureza. Pois agir implica direção a um fim, e a direção a um fim requer conhecimento. Mas o conhecimento pertence à intenção e não à natureza. Logo, o agente natural não pode agir senão por intenção.
  2. Ademais, tudo o que é ordenado para um fim é de algum modo deliberado. Ora, toda causa eficiente é ordenada para um fim. Logo, toda ação procede de uma intenção racional.
  3. Além disso, a ação que não é intencional é fortuita e sem razão. Ora, as ações naturais são ordenadas e regulares. Portanto, elas não podem proceder senão da intenção.
  4. Por fim, o próprio Deus, causa primeira de todas as coisas, age com sabedoria e intenção. Portanto, também todas as causas inferiores, participando de sua causalidade, agem intencionalmente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles diz, no Livro II da Física: “Quaedam agunt per naturam, quaedam per intellectum.”
E Alberto comenta: “Naturalia agunt sine cognitione finis, sed propter finem.”
Logo, há agentes que agem por natureza, e não por intenção.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que há dois modos de ação da causa eficiente:
um por intenção, outro por natureza.

O agente que age por intenção é aquele que conhece o fim e ordena os meios para alcançá-lo.
O agente que age por natureza é aquele que, sem conhecer o fim, é movido a agir por uma inclinação natural impressa nele, como o fogo que aquece e se eleva.

A diferença essencial entre os dois reside no modo de possuir o princípio do agir:
– o agente intencional possui-o por conhecimento e eleição,
– o agente natural possui-o por inclinação e necessidade.

No entanto, ambos agem por causa do fim, ainda que de modos diversos.
O agente natural tende ao fim sem conhecê-lo, porque sua forma o inclina a produzir um efeito semelhante a si;
o agente intencional tende ao fim conhecendo-o, porque a forma do efeito já está em sua mente como exemplar.

Por isso, Aristóteles afirma que “intellectus et natura operantur ad idem”: ambos produzem efeitos ordenados ao fim, mas o intelecto o faz com consciência, e a natureza o faz por determinação interna.

Alberto distingue, portanto, três níveis hierárquicos de causalidade eficiente:

  1. Causa voluntária e intencional, como o homem ou o artífice, que conhece o fim e elege os meios.
    Age libere e contingenter, segundo o bem apreendido.
  2. Causa natural, que age necessariamente, segundo a forma impressa.
    Não conhece o fim, mas é dirigida por outro que o conhece — isto é, pela inteligência divina.
  3. Causa divina, que é simultaneamente natureza e intenção, pois em Deus o intelecto é a própria natureza.
    Ele age por intenção, mas sem deliberação; sua ciência é seu ser, e seu ato é necessário.

Deste modo, toda causa eficiente inferior que age por natureza é, em última análise, ordenada por uma causa superior que age por intenção.
Assim, “intentionale est primum movens, naturale autem motum” — o intencional é o primeiro movente, o natural é o movido.

Logo, os agentes naturais são executores do plano da inteligência divina, que os move como instrumentos para a realização dos fins ordenados desde o princípio.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a direção ao fim pode existir sem conhecimento, pois deriva da forma natural, que é uma semelhança do fim. Assim, o fogo se move para aquecer não porque entende o fim, mas porque sua forma o inclina a produzir o semelhante.
  2. À segunda, responde-se que a ordenação ao fim nas coisas naturais é pela disposição divina, não por deliberação própria. Deus é quem conhece o fim, e a natureza é o meio pelo qual o fim é alcançado.
  3. À terceira, deve-se dizer que a regularidade das ações naturais não prova que procedam de conhecimento, mas sim de uma determinação fixa derivada da forma impressa pelo agente primeiro.
  4. À quarta, responde-se que as causas inferiores participam da causalidade divina segundo o modo de sua natureza.
    Assim, o homem participa pela razão, e o fogo pela inclinação natural; ambos, contudo, são movidos pelo mesmo intelecto divino.

Conclusão.

A causa eficiente age por intenção ou por natureza, conforme o modo de seu ser.
O agente racional age por intenção, o natural por inclinação; mas ambos são ordenados ao fim pelo mesmo princípio superior.

Assim, a natureza é o instrumento da inteligência divina, e a intenção é a expressão dessa inteligência em ato.
Por isso, Alberto conclui:
“Omne agens, sive per naturam sive per intellectum, agit propter finem; sed intellectus agit ut sciens, natura ut mota.”
Todo agente, quer por natureza, quer por intelecto, age por causa do fim; mas o intelecto age como conhecedor, a natureza como movida.

Quaestio VII — Utrum in causis efficientibus sit processus infinitus

(Se nas causas eficientes há processo infinito)

Objeções.

  1. Parece que nas causas eficientes há processo infinito. Pois todo agente é movido por outro, e se esse outro também é movido, segue-se que haverá uma série sem fim de agentes. Assim, se removermos o primeiro, o segundo não age; mas se não há primeiro, também não haverá último. Portanto, parece necessário admitir um processo infinito nas causas eficientes.
  2. Ademais, a natureza é infinita em potência, e o movimento natural é perpétuo. Ora, toda causa eficiente é princípio de movimento. Logo, também nas causas eficientes deve haver uma série infinita.
  3. Ainda, em cada geração, o agente recebe a potência de agir de outro agente anterior, e assim indefinidamente. Logo, as causas eficientes se estendem ao infinito, pois sempre há uma anterior que confere poder à seguinte.
  4. Além disso, se cada agente depende de outro quanto à sua virtude, e não há contradição em supor tal dependência sem termo, nada impede uma regressão infinita nas causas eficientes.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro II da Física e no Livro II da Metafísica, ensina:
“In causis efficientibus non est procedere in infinitum.”
E Alberto comenta: “Omnis actio dependet ab uno primo movente, quod est actu; si tollatur hoc, tollitur omnis actio.”
Logo, não é possível processo infinito nas causas eficientes.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que não é possível processo infinito nas causas eficientes, porque toda série de causas subordinadas depende de um primeiro princípio que age não por participação, mas por essência.

Se houvesse uma série infinita de agentes, cada um recebendo sua virtude de outro, nunca se atingiria a causa em ato puro, da qual procede o movimento e o ser de todos os demais.
Mas o que está em potência não se move nem age senão pelo que está em ato.
Portanto, é necessário deter-se num primeiro agente em ato, que move todos os outros e de quem todos recebem a capacidade de agir.

Alberto distingue aqui três modos de série causal:

  1. Série essencial (secundum ordinem naturae) — na qual o efeito depende do agente enquanto este age atualmente, como o movimento depende do motor presente.
    Nessa série, é impossível processo infinito, porque, se não houver primeiro, não haverá sequer segundo; pois o movimento depende do ato atual do primeiro.
  2. Série acidental (secundum ordinem temporis) — como no caso de gerações sucessivas, onde o pai gera o filho, e este outro, e assim por diante.
    Nessa série, pode haver processo indefinido segundo o tempo, mas não infinito segundo a simultaneidade da causalidade.
  3. Série participada (secundum ordinem virtutis) — em que a virtude do agente é recebida de outro mais nobre.
    Nessa, o infinito é igualmente impossível, porque toda potência participada remete a uma fonte de perfeição que a comunique.

Assim, se houvesse processo infinito nas causas eficientes, não existiria ação nem efeito, porque todos dependeriam de causas que nunca chegariam ao ato puro.
Por isso, Aristóteles afirma que a série infinita “destruit totam rationem causae” — destrói a própria noção de causa.

Portanto, é necessário afirmar um primeiro agente, que é causa de todos os demais, mas que não é causado por outro — e este é o Primeiro Motor Imóvel, a causa eficiente primeira, Deus.

Alberto conclui:
“In causis efficientibus oportet devenire ad primum, quod est actus purus et movet omnia, nec ab alio movetur.”


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora cada agente possa ser movido por outro, a série não pode prosseguir ao infinito, pois é necessário que haja um primeiro que mova sem ser movido, caso contrário o movimento jamais começaria.
  2. À segunda, responde-se que a natureza é infinita em potência, mas finita em ato. Assim, ainda que as causas naturais se sucedam indefinidamente no tempo, dependem de uma causa primeira eterna, que é ato puro.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora o poder de agir seja comunicado sucessivamente, tal comunicação exige uma fonte que a possua em ato primeiro e essencialmente, não por participação.
  4. À quarta, responde-se que uma regressão infinita destruiria a possibilidade de ato, pois tudo ficaria em potência.
    Logo, é necessário que haja um princípio primeiro, do qual derive toda virtude eficiente.

Conclusão.

Nas causas eficientes não há processo infinito, porque toda causalidade depende de um primeiro agente que é em ato puro, e sem o qual não haveria movimento, ação nem ser.

Assim, o Primeiro Motor, que é Deus, é o fundamento necessário de toda série causal.
Por isso, Alberto encerra:
“Processus in infinitum est impossibilis, quia oportet stare in aliquo quod est primum in essendo et in movendo.”
O processo infinito é impossível, porque é necessário deter-se em algo que é primeiro no ser e no mover.

Quaestio VIII — Utrum sit una prima causa efficiens immota

(Se existe uma única causa eficiente primeira e imóvel)

Objeções.

  1. Parece que não existe uma única causa eficiente primeira e imóvel. Pois em cada gênero de coisas há um primeiro agente, como o sol nas causas naturais, a alma nas causas vitais, e o intelecto nas causas espirituais. Ora, o múltiplo dos gêneros implica pluralidade de primeiros. Logo, não há uma única causa eficiente primeira.
  2. Além disso, o movimento dos corpos celestes é múltiplo e diverso, e cada um parece depender de uma substância motora distinta. Portanto, há várias causas eficientes primeiras e imóveis, correspondendo aos diferentes movimentos.
  3. Ademais, a perfeição exige pluralidade de princípios proporcionais aos efeitos. Se há diversas ordens de seres — espirituais, celestes, naturais —, deve haver diversos princípios primeiros de ação. Logo, não há uma causa única.
  4. Ainda, se toda causa eficiente move em virtude de sua forma, e as formas são múltiplas, então há múltiplas causas primeiras conforme a diversidade das formas supremas.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro XII da Metafísica, ensina:
“Necesse est esse unum primum movens immobile.”
E Alberto comenta:
“Quia unitas ordinis universi provenit ex unitate primi moventis.”
Logo, existe uma única causa eficiente primeira e imóvel.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que há uma única causa eficiente primeira e imóvel, e que esta é a fonte e o princípio de toda ordem de causas, de toda pluralidade e de toda operação.

Com efeito, é impossível que haja muitos primeiros absolutamente, pois o que é primeiro por essência deve ser simples, uno e não participado.
Ora, se houvesse muitos primeiros, cada um teria algo pelo qual se distinguiria dos demais; e essa distinção implicaria composição, limitação e dependência, o que repugna à noção de “primeiro”.

O primeiro agente, portanto, deve ser absolutamente uno, porque é ato puro, sem mistura de potência, e porque a pluralidade é sinal de imperfeição.
Tudo o que é composto ou múltiplo é causado por outro; mas o primeiro não pode ser causado, logo não pode ser múltiplo.

Assim, toda a série das causas eficientes depende de um só princípio imóvel e simples, que comunica o ser e o movimento a todas as coisas.
E como a causalidade do primeiro é universal e perpétua, é necessário que seja imóvel, pois o movimento supõe potência, e no primeiro não há potência alguma.

Portanto, há um só primeiro motor, uma só causa eficiente primeira, uma só fonte de todo ato e de todo ser — o qual Aristóteles e Alberto identificam com o Deus vivo e eterno, actus purus, mens prima, forma formarum, motor immotus.

A ordem do universo confirma isso: todas as causas estão subordinadas em unidade e harmonia, o que não seria possível se houvesse vários princípios primeiros.
Assim, como uma orquestra requer um só regente, a totalidade do ser requer um só motor universal, sob cuja influência cada coisa age segundo sua natureza própria.

Alberto resume com clareza:
“Sicut unitas mundi demonstrat unitatem causae efficientis, ita multiplicitas causarum inferiorum ostendit virtutem primi unam esse et universalem.”
Assim como a unidade do mundo demonstra a unidade da causa eficiente, a multiplicidade das causas inferiores mostra que a virtude do primeiro é una e universal.

Logo, Deus é o primeiro motor imóvel, porque move tudo sem ser movido, e é causa eficiente primeira, porque tudo age em virtude dele.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora haja muitos primeiros em cada gênero, todos dependem de um primeiro absoluto, que é o princípio de todo gênero e de toda ordem. Assim, o sol é primeiro entre os agentes naturais, mas o é em virtude do primeiro universal.
  2. À segunda, responde-se que a multiplicidade dos movimentos celestes não implica multiplicidade de causas primeiras, mas de causas segundas. Pois todas as inteligências celestes são movidas pelo amor e pela dependência do mesmo primeiro motor imóvel.
  3. À terceira, deve-se dizer que a perfeição das coisas inferiores exige diversidade de causas próximas, mas não de causas supremas. A variedade dos efeitos manifesta a riqueza da causa primeira, não sua multiplicação.
  4. À quarta, responde-se que as formas supremas são múltiplas apenas nas criaturas, não no primeiro princípio. Em Deus, a forma e o ser coincidem, e nele toda perfeição é uma só essência.

Conclusão.

uma única causa eficiente primeira e imóvel, que é ato puro, simples e eterna fonte de toda causalidade.
Todas as outras causas agem em virtude dela e participam de sua potência.
Sem esse princípio uno, não haveria ordem, unidade nem movimento no universo.

Por isso, Alberto conclui:
“Est una prima causa efficiens et immota, quae est Deus; et ab ipso omnis virtus efficiens derivatur sicut lumen a sole.”
Existe uma única causa eficiente e imóvel, que é Deus; e dele toda virtude eficiente deriva, como a luz do sol.

Quaestio IX — Utrum causa efficiens sit causa essendi vel fiendi

(Se a causa eficiente é causa do ser ou do vir-a-ser)

Objeções.

  1. Parece que a causa eficiente é causa do vir-a-ser e não do ser. Pois o ser (esse) é o termo do movimento e do devir; e o agente é princípio do movimento, não do termo. Logo, a causa eficiente causa o vir-a-ser (fiendum), não o ser (esse).
  2. Além disso, Aristóteles diz, no Livro II da Física, que “agens est principium motus in altero.” Ora, o movimento pertence ao devir, e não ao ser que é imóvel. Logo, a causa eficiente é causa do devir, não do ser.
  3. Ademais, a forma é que dá o ser à matéria. Ora, a forma é princípio formal, não eficiente. Logo, a causa eficiente não causa o ser, mas apenas a passagem da potência ao ato, isto é, o devir.
  4. Ainda, o ser é participado segundo a semelhança da causa exemplar e depende da causa final; a causa eficiente é intermediária. Portanto, parece mais apropriado dizer que ela causa o movimento em direção ao ser, e não o próprio ser.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VII da Metafísica, ensina:
“Agens et faciens est causa ut sit.”
E Alberto comenta:
“Causa efficiens dat esse, quia actus ejus terminatur ad esse.”
Logo, a causa eficiente é causa do ser.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a causa eficiente é causa tanto do vir-a-ser quanto do ser, mas em modos diversos:
causa essendi per respectum ad actum completum,
causa fiendi per respectum ad motum in via ad actum.

Com efeito, o mesmo agente que move também produz o ser, mas enquanto o movimento permanece, ele é causa do devir; e quando o movimento termina, é causa do ser.

O agente natural, por exemplo, que gera um homem, é causa do vir-a-ser enquanto há passagem da potência à forma; mas é causa do ser enquanto comunica a forma e conserva o composto na existência.

Assim, há uma dupla causalidade na ação eficiente:

  1. Causalidade transitiva, pela qual o agente introduz a forma no sujeito — e isto é causar o vir-a-ser;
  2. Causalidade conservativa, pela qual o mesmo agente sustenta o ser do efeito enquanto permanece a dependência de sua virtude — e isto é causar o ser.

Alberto distingue com precisão:

“Omnis causa efficiens, dum agit, causat fieri; sed dum conservat effectum, causat esse.”

A diferença, portanto, é de razão, não de sujeito: o mesmo princípio é causa de ambos, mas de modos diferentes.
Deus, porém, é causa do ser de modo absoluto e contínuo, porque em tudo o que existe depende-se de sua ação para conservar-se no ser.
Nas criaturas, a causalidade eficiente termina com o ato; em Deus, ela é perpétua, pois Ele é ato puro e fonte constante do ser.

Assim, em Deus, causar é conservar, porque seu ato não passa, mas permanece; e todo ente criado tem o ser não por si, mas por participação contínua no influxo divino.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o agente natural é causa do vir-a-ser enquanto há movimento, mas também do ser, enquanto o efeito subsiste pela virtude que dele deriva. O termo do movimento pertence à sua causalidade como fim do ato.
  2. À segunda, responde-se que, embora Aristóteles diga que o agente é princípio do movimento, ele o entende secundum prius et posterius. O agente primeiro é princípio não apenas do movimento, mas do ser do móvel. Assim, Deus é princípio do ser, e os agentes inferiores apenas do vir-a-ser.
  3. À terceira, deve-se dizer que a forma dá o ser formalmente, mas não eficiente; a forma é princípio intrínseco, a causa eficiente é princípio extrínseco. Contudo, a forma só dá o ser porque foi introduzida pela ação da causa eficiente.
  4. À quarta, responde-se que a causa exemplar e a causa final determinam o modo do ser, mas a causa eficiente confere a existência atual. Ela é, portanto, causa do ser segundo o influxo que procede do agente.

Conclusão.

A causa eficiente é simultaneamente causa do vir-a-ser e do ser:
causa fiendi, enquanto produz o efeito em movimento;
causa essendi, enquanto confere e conserva o ser atual.

Nas criaturas, esta dupla causalidade é sucessiva; em Deus, é simultânea e eterna.

Por isso, Alberto encerra a questão dizendo:
“Agens naturale causat fieri et esse successive; sed agens primum, quod est Deus, causat utrumque simul, quia actus ejus est sine mutatione.”
O agente natural causa o vir-a-ser e o ser sucessivamente; mas o agente primeiro, que é Deus, causa ambos ao mesmo tempo, pois seu ato é sem mutação.

Quaestio X — Utrum forma sit principium actionis in causis naturalibus

(Se a forma é o princípio da ação nas causas naturais)

Objeções.

  1. Parece que a forma não é o princípio da ação nas causas naturais. Pois o que é princípio da ação é mais nobre que a ação. Ora, a forma é o termo da ação e pertence ao composto. Logo, não é princípio de agir, mas resultado do agir.
  2. Além disso, Aristóteles diz, no Livro II da Física, que “agens agit in virtute formae”, e não que a forma age. Logo, o princípio da ação é algo que possui a forma, não a forma mesma.
  3. Ademais, a matéria é princípio de individuação e é por ela que a forma atua neste sujeito determinado. Se, portanto, a forma fosse princípio de ação, agiria indiferentemente em qualquer matéria. Mas como age sempre em determinada, parece que o princípio é a matéria, não a forma.
  4. Ainda, a forma é ato e perfeição do ente, não movimento. Ora, agir pertence ao movimento e à transição do ato à potência. Logo, a forma, que é ato puro, não é princípio da ação.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VIII da Metafísica, afirma:
“Omne agens agit per formam.”
E Alberto comenta:
“Forma est principium agendi, quia per eam agens est in actu.”
Logo, a forma é o princípio da ação nas causas naturais.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a forma é, propriamente, o princípio da ação nas causas naturais, não enquanto é apenas termo ou figura, mas enquanto é ato e perfeição do sujeito agente.

Com efeito, o agir é ato de um ente em ato. Ora, o que atualiza o ente é a forma. Assim, o agente age na medida em que está em ato, e está em ato pela forma.
Portanto, toda ação natural procede da forma como de seu princípio intrínseco e formal.

A forma não atua como causa separada, mas como raiz da operação, porque é pela forma que a potência se torna atual e apta para agir.
Por isso, o calor aquece por causa da forma de calor; e o médico cura por causa da forma de arte médica que o atualiza como agente.

Há, pois, dois modos de causalidade formal na ação:

  1. Formal intrínseca, pela qual a forma é ato do agente — como a forma do fogo, que o faz aquecer;
  2. Formal participada, pela qual a forma do agente é comunicada ao paciente — como o fogo comunica a forma do calor ao que é aquecido.

Assim, a forma é princípio de operação porque é o que faz o ente ser tal qual é, e agir segundo o que é.
Como ensina Aristóteles:
“Unumquodque agit secundum quod est actu.”
E como Alberto explica:
“Actio est sequela formae; unde forma est principium formale agendi.”

Além disso, o fim da ação é a assimilação do efeito à forma do agente; logo, a forma é tanto princípio quanto termo da operação natural — princípio, enquanto dá o poder de agir; termo, enquanto é comunicada ao efeito.

Em Deus, porém, a forma e o ato coincidem na essência; por isso Ele é causa eficiente e formal simultaneamente, e sua ação é sua própria substância.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a forma é termo da ação quanto ao paciente, mas princípio quanto ao agente. Pois o mesmo que é recebido num ser é também o que faz outro ser. Assim, a forma de calor é o termo da calefação no aquecido, mas é o princípio de aquecer no fogo.
  2. À segunda, responde-se que Aristóteles disse que o agente age em virtude da forma, não sem a forma. O “em virtude de” indica dependência e causalidade formal. Assim, a forma não é agente separada, mas é o que faz o agente ser tal e agir tal.
  3. À terceira, deve-se dizer que a matéria determina o sujeito em que a forma age, mas não é princípio do agir. A matéria é princípio de individuação, não de operação; e opera apenas enquanto informada.
  4. À quarta, responde-se que a forma é ato, e é justamente por ser ato que é princípio de ação. O movimento pertence ao composto, mas o princípio do movimento é o ato formal que atualiza o agente.

Conclusão.

A forma é o princípio formal e intrínseco da ação nas causas naturais:
é pela forma que o agente está em ato, e é por ela que comunica ao outro o ser semelhante a si.

Por isso, Alberto conclui:
“Forma est principium agendi, quia per eam agens est in actu, et per eam producit simile sibi in altero.”
A forma é princípio de agir, porque por ela o agente está em ato, e por ela produz algo semelhante a si em outro.

Quaestio XI — Utrum agens agat propter assimilationem ad effectum

(Se o agente age por assimilação ao efeito)

Objeções.

  1. Parece que o agente não age por assimilação ao efeito. Pois a assimilação é consequência da ação, não sua causa. O fogo aquece e, por isso, o aquecido se torna semelhante ao fogo; mas o fogo não aquece para tornar o outro semelhante a si, e sim porque é sua natureza agir assim.
  2. Ademais, Aristóteles diz que “omne agens agit propter finem.” Ora, o fim do agente é o bem ou a perfeição, não a mera semelhança. Logo, o agente não age por assimilação ao efeito, mas por alcançar o bem que é o fim da ação.
  3. Ainda, nem toda ação produz semelhança: o construtor edifica uma casa, mas a casa não é semelhante ao construtor; o médico cura, mas o corpo são não é semelhante à arte médica. Logo, a assimilação não é razão universal de toda ação.
  4. Além disso, se o agente agisse para produzir algo semelhante a si, então todo agente desejaria multiplicar-se; mas isso é próprio apenas das naturezas geradoras, não das causas eficientes universais.

Em contrário (Sed contra).

Dionísio, no De Divinis Nominibus, capítulo IV, ensina:
“Omne bonum est diffusivum sui.”
E Alberto comenta:
“Agens agit propter assimilationem, quia appetit communicare similitudinem sui.”
Logo, todo agente age por assimilação ao efeito.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que todo agente age de algum modo para produzir uma assimilação ao efeito, mas essa assimilação é entendida de diversos modos, conforme a ordem das causas.

Nas causas naturais, a assimilação é material e formal: o agente comunica ao paciente uma semelhança de sua forma, como o fogo comunica o calor, e o gerador comunica a natureza específica ao gerado.
Assim, omne agens naturale agit propter assimilationem formae, porque o efeito é semelhança formal do agente.

Nas causas artificiais, a assimilação é intencional: o artífice imprime no efeito a forma que está em seu intelecto, e assim o artefato se torna semelhante à ideia concebida.
Nesse sentido, agens intelligens agit propter assimilationem conceptionis mentis.

Nas causas voluntárias e divinas, a assimilação é participativa e exemplar: Deus age comunicando o ser e a bondade segundo a medida da semelhança que as criaturas podem receber.
Assim, agens supremum agit propter assimilationem perfectionis suae, não por necessidade, mas por superabundância de perfeição e bondade.

Portanto, a razão profunda da ação é a difusão do ato e da forma; e, como ensina Aristóteles, “unumquodque agit secundum quod est actu.”
Logo, o ato tende naturalmente a comunicar-se e a produzir outro que o imite segundo sua semelhança.

Por isso, toda ação, seja natural, racional ou divina, é ordenada à assimilação, porque o efeito é o espelho do ato do agente.
E é nesse sentido que Alberto afirma:
“Assimilatio est ratio actionis, quia in ea agens manifestat virtutem suae formae.”


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a assimilação é efeito da ação quanto à execução, mas é causa final quanto à intenção natural. Pois a natureza tende à semelhança como ao seu bem. Assim, o fogo não delibera sobre aquecer, mas sua ação é naturalmente ordenada à produção de algo semelhante a si.
  2. À segunda, responde-se que o bem e a assimilação não se opõem: a semelhança é o bem do efeito, porque todo ente é bom na medida em que participa da forma do agente. Assim, o fim da ação é o bem, e esse bem consiste na assimilação.
  3. À terceira, deve-se dizer que, nas artes, a assimilação não é segundo a matéria, mas segundo a forma intencional. A casa não é semelhante ao construtor quanto à substância, mas é semelhante à forma que existia em sua mente.
  4. À quarta, responde-se que o desejo de semelhança não implica multiplicação de substância, mas difusão de perfeição. As naturezas geradoras reproduzem-se para perpetuar a espécie; as intelectuais comunicam formas e razões; e Deus comunica o ser. Assim, cada ordem de agente age por assimilação, mas em grau distinto.

Conclusão.

Todo agente, natural ou intelectual, age por assimilação, isto é, para comunicar sua forma ou perfeição ao efeito.
Nas criaturas, essa assimilação é limitada e parcial; em Deus, é universal e fontal, porque Ele é a plenitude do ser e a origem de toda semelhança.

Por isso, Alberto conclui:
“Omnis actio est propter assimilationem: in naturalibus propter similitudinem formae, in rationalibus propter similitudinem artis, in divinis propter similitudinem bonitatis.”
Toda ação é por assimilação: nas coisas naturais, por semelhança de forma; nas racionais, por semelhança de arte; nas divinas, por semelhança de bondade.

Quaestio XII — Utrum agens et patiens conveniant in materia

(Se o agente e o paciente coincidem na matéria)

Objeções.

  1. Parece que o agente e o paciente não coincidem na matéria. Pois o agente é em ato, o paciente em potência; mas ato e potência são contrários e não podem coexistir no mesmo sujeito sob o mesmo aspecto. Logo, é impossível que agente e paciente coincidam na mesma matéria.
  2. Além disso, Aristóteles diz, no Livro III da Física: “Agens et patiens non sunt idem secundum substantiam.” Ora, a matéria é parte substancial. Portanto, se não são os mesmos segundo a substância, não coincidem na matéria.
  3. Ademais, o fogo aquece a água, mas o fogo e a água não têm a mesma matéria, pois pertencem a elementos diversos. Logo, o agente e o paciente não compartilham a mesma matéria.
  4. Ainda, o agente deve ser separado do paciente para que o movimento ocorra; se fossem o mesmo quanto à matéria, o agente agiria sobre si mesmo, o que é absurdo.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VII da Metafísica, afirma:
“Omne agens et patiens conveniunt in materia subiecta.”
E Alberto comenta:
“Non idem numero, sed idem specie, conveniunt in materia, quia est fundamentum generationis utriusque.”
Logo, o agente e o paciente coincidem na matéria, ainda que não numericamente, mas segundo a espécie.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o agente e o paciente coincidem na matéria, mas não numericamente, e sim segundo a espécie ou o gênero, conforme a ordem da natureza.

Pois toda ação natural se dá entre coisas que pertencem ao mesmo gênero de ser; e isso porque a forma do agente deve ser capaz de existir potencialmente no paciente.
Assim, o fogo aquece a água porque o calor, que está em ato no fogo, pode estar em potência na água; e a madeira é aquecida porque é matéria susceptível de calor.

Logo, há coincidência de matéria não segundo o número, mas segundo a capacidade comum de receber a mesma forma.
A diferença está apenas na disposição: no agente, a forma é em ato; no paciente, em potência.

Por conseguinte, o mesmo sujeito material pode ser, em tempos diversos, agente e paciente: o corpo aquecido pode, depois, aquecer outro.
Assim, a natureza conserva uma continuidade de matéria que permite a comunicação da forma através dos contrários.

Alberto distingue três modos de conveniência entre agente e paciente:

  1. Causalidade genérica, pela qual ambos pertencem ao mesmo gênero natural — como o fogo e a água, ambos corpos elementares;
  2. Causalidade formal, pela qual a forma do agente é possível de estar no paciente — como o calor pode estar tanto no fogo quanto na água;
  3. Causalidade material, pela qual a matéria dos dois é de uma mesma raiz — pois, segundo Aristóteles, todos os corpos elementares têm uma matéria comum subjacente.

Portanto, o agente e o paciente coincidem na matéria segundo a espécie, porque sua base é a mesma potência primeira, ainda que em diferentes estados de atualização.

E é essa comunhão de matéria que torna possível a ação e a paixão:
“Si non esset aliquid commune in subiecto, nec actio nec passio fieret,” ensina Alberto.

O motor não move senão o que é passível de receber sua forma; e isso requer identidade material no fundamento do ser.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o agente e o paciente não coincidem na matéria sob o mesmo aspecto. No agente, a matéria é em ato pela forma; no paciente, está em potência para recebê-la. Assim, há distinção de relação, não de essência material.
  2. À segunda, responde-se que Aristóteles fala de distinção segundo a substância composta, não quanto à matéria primeira. A matéria é comum como princípio potencial, mas as substâncias compostas diferem pela forma atual.
  3. À terceira, deve-se dizer que o fogo e a água diferem segundo a disposição de suas matérias, mas a raiz de ambas é a mesma matéria prima, de onde provêm todas as formas elementares. Assim, há unidade de fundo, ainda que diversidade de ato.
  4. À quarta, responde-se que o agente e o paciente devem ser distintos quanto ao ato e à potência, não quanto ao sujeito material em espécie. Assim, o agente não age sobre si mesmo, mas sobre outro que participa da mesma natureza material.

Conclusão.

O agente e o paciente coincidem na matéria segundo a espécie, pois toda ação natural exige uma base comum que possa receber e comunicar a mesma forma.
Diferem apenas quanto ao estado: o agente é em ato, o paciente em potência.

Por isso, Alberto conclui:
“Agens et patiens conveniunt in materia secundum speciem, quia forma unius est possibilis in altero; et ex hac convenientia oritur actio naturalis.”
O agente e o paciente coincidem na matéria segundo a espécie, porque a forma de um é possível no outro; e dessa conveniência nasce a ação natural.

Quaestio XIII — Utrum agens per se differat ab agente per accidens

(Se o agente por si difere do agente por acidente)

Objeções.

  1. Parece que o agente por si não difere do agente por acidente. Pois toda ação depende do mesmo princípio eficiente, e se o agente acidental produz efeito, o faz pela mesma potência do agente principal. Logo, não há diferença real, mas apenas de modo de consideração.
  2. Ademais, Aristóteles diz, no Livro II da Física, que “omne agens agit inquantum est in actu.” Ora, tanto o agente per se quanto o per accidens estão em ato. Logo, não diferem quanto à causa da ação, mas apenas quanto à denominação.
  3. Ainda, o que age por acidente muitas vezes causa efeito verdadeiro, como quando o construtor cura, não como construtor, mas como médico. Ora, o efeito é real e procede de um ato verdadeiro. Logo, não há diferença de causalidade entre o agente por si e o por acidente.
  4. Além disso, se o agente por acidente produz efeito sem intenção, e o agente por si com intenção, a diferença será apenas quanto ao modo de operação, não quanto à causa em si.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro V da Metafísica, distingue expressamente:
“Agens per se est cui convenit agere secundum propriam naturam; agens per accidens est cui hoc convenit secundum aliud.”
E Alberto comenta:
“Per se agens est vere causa; per accidens autem est causa non vere, sed per concomitantiam.”
Logo, há diferença verdadeira e essencial entre os dois modos de agente.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o agente por si e o agente por acidente diferem essencialmente, tanto quanto à ordem da natureza quanto à intenção de causalidade.

O agente por si (agens per se) é aquele cuja ação procede segundo a sua forma própria e ordenada à produção do efeito conforme a razão da sua espécie.
Assim, o fogo aquece porque o aquecer pertence à forma de fogo; e o médico cura porque curar pertence à arte médica.

O agente por acidente (agens per accidens), ao contrário, é aquele em que a ação não se segue da forma própria, mas de algo que lhe advém por concomitância ou casualidade.
Por exemplo: o músico constrói, não enquanto músico, mas enquanto acaso é também construtor; e o homem branco cura, não enquanto branco, mas enquanto é médico.

Logo, no agente per se há ordem essencial entre forma, ação e efeito; no agente per accidens, há apenas conexão acidental e contingente.

Albertus distingue quatro modos principais do agente acidental:

  1. Per compositionem, quando uma qualidade se junta a outra pessoa que age — como “o homem branco cura”;
  2. Per concomitantiam, quando duas potências coexistem — como “o músico caminha”;
  3. Per privationem, quando algo age não por si, mas por ausência de outro — como “o cego guia outro” por acaso;
  4. Per ordinem causae remotae, quando a ação resulta de algo que, embora cause, não é ordenado diretamente ao efeito — como “o pai do construtor edifica” enquanto causa remota.

Portanto, o agente per se é causa secundum essentiam; o agente per accidens, secundum eventum.

O primeiro age necessariamente, conforme sua natureza; o segundo, fortuitamente e sem intenção.
Por isso, Aristóteles afirma:
“Causa per accidens est in his quae raro contingunt.”
E Alberto explica:
“Agens per accidens non habet ordinem ad effectum, sed ad aliud cui coniungitur.”

Assim, enquanto o agente per se é causa própria, universal e intencional, o per accidens é causa imprópria, temporal e dependente do acaso.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a potência pela qual o agente acidental age é a mesma, mas o modo de uso é diverso. No agente por si, a potência é ordenada formalmente ao efeito; no agente por acidente, o efeito ocorre fora da intenção do princípio.
  2. À segunda, responde-se que ambos estão em ato, mas o ato do agente per se é determinatus ad effectum, enquanto o do agente per accidens é indeterminatus et concomitans. Assim, diferem quanto à ordem causal, ainda que não quanto à atualização.
  3. À terceira, deve-se dizer que o efeito verdadeiro produzido por agente acidental não é atribuído a ele enquanto tal, mas ao princípio que atua por si. Assim, se o médico construtor cura, não é enquanto construtor, mas enquanto médico que se dá o efeito.
  4. À quarta, responde-se que o agente por acidente é desprovido de intenção causal formal; mas essa falta de intenção não é mera diferença de modo, e sim de essência, pois remove a ordenação da forma ao efeito.

Conclusão.

O agente por si e o agente por acidente diferem essencialmente:
— o primeiro é causa verdadeira, ordenada e necessária;
— o segundo é causa acidental, fortuita e sem ordenação formal ao efeito.

Por isso, Alberto conclui:
“Agens per se est causa proprie dicta; agens per accidens est causa improprie, quia actio ejus non est secundum formam sed per aliud coniunctum.”
O agente por si é causa propriamente dita; o agente por acidente é causa de modo impróprio, porque sua ação não procede de sua forma, mas de algo a ela acidentalmente unido.

Quaestio XIV — Utrum causa efficiens possit esse causa causarum

(Se a causa eficiente pode ser causa das causas)

Objeções.

  1. Parece que a causa eficiente não pode ser causa das causas. Pois a causa eficiente age sobre o efeito, e as causas são princípios do efeito. Logo, é impossível que o mesmo que causa o efeito seja também causa das causas, pois a ordem se inverteria.
  2. Além disso, Aristóteles diz que “causa efficiens et finalis se invicem consequuntur.” Ora, se a causa eficiente fosse causa das causas, seria também causa da final e da material, o que parece absurdo, já que estas têm natureza diversa.
  3. Ademais, as causas são correlativas: nenhuma é causa da outra, mas todas concorrem para o mesmo efeito. Logo, não é possível que uma seja princípio das demais.
  4. Ainda, se a causa eficiente fosse causa das causas, haveria uma regressão infinita na ordem das causalidades, pois cada causa teria sua própria causa.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro XII da Metafísica, ensina:
“Est aliquid quod est causa causarum.”
E Alberto comenta:
“Causa prima efficiens est causa causarum, quia dat esse et virtutem omnibus causis.”
Logo, a causa eficiente primeira é causa das causas.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a causa eficiente pode ser causa das causas, não em toda a ordem, mas segundo a prioridade de natureza e de virtude.

Pois entre as causas há uma hierarquia: umas são primeiras e fontais, outras segundas e derivadas.
Assim, a causa eficiente primeira, que é ato puro e fonte universal do ser, comunica o poder de causar às causas inferiores.

Logo, a causa eficiente é causa das causas em dois sentidos:

  1. Formaliter et virtualiter, porque dá às demais causas o ser e a virtude pela qual causam;
  2. Ordinative et gubernative, porque dispõe e ordena todas as causas ao fim comum do universo.

Por exemplo: o sol é causa eficiente das plantas, mas também é causa das causas que produzem vida, porque comunica a virtude vital aos princípios inferiores.
Do mesmo modo, Deus é causa eficiente das coisas, e também causa das causas, porque é Ele quem dá às criaturas o poder de agir segundo sua forma e natureza.

Assim, todas as causas segundas são instrumentos da primeira causa, que age nelas e por elas.
E como ensina Alberto:
“Virtus causarum inferiorum dependet a prima causa sicut lumen a sole.”
A virtude das causas inferiores depende da primeira como a luz do sol.

Portanto, o que faz com que algo seja causa é a influência da causa eficiente primeira.
Ela é o princípio universal não só do ser, mas também da causalidade.
Por isso, Aristóteles diz que o primeiro motor é causa causarum, porque move todos os motores e age em todos.

No entanto, essa causalidade é dupla:

  • Imediata, em relação ao ser e ao poder causal — como Deus, que dá o ser e a potência de agir;
  • Mediata, em relação à execução da ação — como quando o artífice, ao mover o instrumento, faz com que ele seja causa de outro efeito.

Assim, a causa eficiente primeira não destrói a causalidade das segundas, mas a funda e conserva.
As causas segundas verdadeiramente agem, mas agem in virtute primae causae, e não por poder próprio absoluto.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a causa eficiente é princípio das causas, não quanto à ordem dos efeitos, mas quanto ao ser e à virtude de causar. Ela não é causa do efeito apenas, mas do próprio poder de causar nos intermediários.
  2. À segunda, responde-se que a causa eficiente primeira é causa da final e das outras, não segundo a razão formal de suas naturezas, mas enquanto dá o ser e a ordenação a todas. Assim, causa a finalidade enquanto ordena o universo ao bem supremo, e causa a material enquanto a conserva na existência.
  3. À terceira, deve-se dizer que as causas são correlativas apenas quanto ao efeito, mas não quanto ao ser. Uma pode preceder a outra em virtude e dignidade, e assim a primeira é causa das segundas.
  4. À quarta, responde-se que não há regressão infinita, porque a série das causas se detém na primeira, que é causa sem ser causada.

Conclusão.

A causa eficiente primeira é causa das causas, porque dá a todas as causas inferiores o ser, a potência e a ordem de agir.
Sem ela, nenhuma outra causa poderia existir nem operar.

Por isso, Alberto conclui:
“Causa efficiens prima est vere causa causarum, quia per eam omnes causae sunt et agunt.”
A causa eficiente primeira é verdadeiramente causa das causas, porque por ela todas as causas existem e agem.

Quaestio XV — Utrum agens naturale agat necessario

(Se o agente natural age necessariamente)

Objeções.

  1. Parece que o agente natural não age necessariamente, pois a necessidade exclui a contingência. Ora, há ações naturais que falham, como o nascimento de monstros, a corrupção imprevista de corpos, ou o desvio de movimentos celestes segundo acidentes particulares. Logo, o agente natural não age necessariamente.
  2. Além disso, a necessidade pertence ao que é eterno e imutável; mas os agentes naturais são sujeitos à mudança. Logo, seu modo de agir não é necessário, mas contingente.
  3. Ademais, toda ação natural depende de circunstâncias externas — do meio, do tempo, e das disposições da matéria. Ora, aquilo que depende de muitos condicionantes não é necessário, mas condicionado e variável.
  4. Ainda, Aristóteles diz, no Livro II da Física, que “natura deficit quando impeditur.” Mas o que pode ser impedido não age necessariamente. Logo, a ação natural não é necessária, mas condicionada.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VIII da Metafísica, afirma:
“Natura operatur semper similiter, nisi aliquid impediat.”
E Alberto comenta:
“Agens naturale agit necessario secundum ordinem formae, licet non necessario in omnibus circumstantiis.”
Logo, o agente natural age necessariamente quanto à sua essência e à sua forma.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o agente natural age necessariamente, mas essa necessidade é secundum quid (de modo relativo), e não simpliciter (de modo absoluto).

Com efeito, há dois tipos de necessidade:

  1. Necessitas absoluta, que se encontra em Deus e nas causas eternas, cuja ação é idêntica ao seu ser;
  2. Necessitas ex suppositione, que se encontra nas causas naturais, cuja ação segue necessariamente da forma, posita forma, sequitur actio.

Assim, dado que a natureza é determinada por sua forma, ela age sempre do mesmo modo enquanto a forma permanece.
Por isso, o fogo aquece necessariamente, e a pedra cai necessariamente, segundo sua inclinação natural.

A necessidade da ação natural, portanto, provém da forma, que é o princípio interno de movimento e operação.
Mas essa necessidade pode ser impedida por causas externas — como um obstáculo, corrupção ou privação da potência.
Assim, a necessidade é condicional e dependente da ordem natural, não absoluta como a de Deus.

Albertus distingue três modos de necessidade na ação natural:

  1. Necessitas naturalis, pela qual o agente opera conforme a forma que o constitui — como o fogo, que aquece por ser quente;
  2. Necessitas per ordinem universi, pela qual cada causa natural é ordenada a conservar a harmonia do todo — como o sol, que se move necessariamente segundo a ordem celeste;
  3. Necessitas per dependentiam a prima causa, pela qual todo agente natural é movido pela vontade de Deus, que é ato puro e causa universal da ordem da natureza.

Dessa forma, o agente natural age necessariamente quanto à sua forma, mas não quanto às condições externas ou impedimentos.
Por isso, Aristóteles diz: “Natura deficit non ex se, sed ex impedimento.”

Portanto, o modo necessário de ação natural deriva da essência formal, mas a contingência surge da matéria e dos acasos que se interpõem.

Assim, a natureza não erra enquanto natureza; os defeitos pertencem ao composto material e não à essência da causa natural.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que as falhas da natureza provêm de impedimentos acidentais, não da deficiência da causa formal. O nascimento monstruoso ocorre não porque a natureza queira falhar, mas porque a matéria resiste à forma.
  2. À segunda, responde-se que, embora os agentes naturais sejam mutáveis, a forma segundo a qual agem é estável enquanto permanece. Assim, a necessidade não pertence à substância composta, mas à razão formal que a dirige.
  3. À terceira, deve-se dizer que as circunstâncias externas condicionam a execução, não a essência da ação. A forma é causa da necessidade intrínseca; o meio apenas determina quando e como a ação se realiza.
  4. À quarta, responde-se que o impedimento não destrói a necessidade, mas a suspende. A natureza agiria necessariamente se nada a impedisse; por isso, sua necessidade é condicional, não absoluta.

Conclusão.

O agente natural age necessariamente, enquanto sua ação procede da forma, que é princípio determinado e constante; mas essa necessidade é relativa e pode ser impedida por causas externas.

Por isso, Alberto conclui:
“Agens naturale agit necessario, inquantum agit per formam determinatam; sed propter impedimenta contingit defectus, non propter defectum naturae.”
O agente natural age necessariamente, enquanto age por forma determinada; mas os defeitos ocorrem por impedimentos, não por defeito da natureza.

Quaestio XVI — Utrum agens voluntarium agat contingenter

(Se o agente voluntário age contingentemente)

Objeções.

  1. Parece que o agente voluntário não age contingentemente, mas necessariamente. Pois o que é movido por um fim determinado tende a ele com necessidade, uma vez conhecido como bem. Ora, a vontade busca necessariamente o bem, e Deus mesmo é objeto necessário da vontade. Logo, o agente voluntário não age contingentemente, mas por necessidade do bem.
  2. Além disso, todo ato voluntário procede de um juízo do intelecto. Ora, o intelecto, conhecendo o melhor, determina necessariamente o que deve ser feito. Logo, também a vontade, que segue o juízo da razão, age necessariamente.
  3. Ademais, se o agente voluntário agisse contingentemente, poderia não agir segundo o bem conhecido. Isso implicaria desordem no princípio racional, o que é absurdo. Logo, o agente voluntário não age contingentemente, mas segundo necessidade de razão.
  4. Ainda, nas criaturas superiores e em Deus não há erro nem mudança de vontade. Ora, neles a ação é voluntária. Logo, toda ação voluntária é necessária, pois é imutável segundo a intenção do bem.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Ética, diz:
“Voluntarium est cuius principium est in ipso agente, cum scientia singularum circumstantiarum.”
E Alberto comenta:
“Voluntas est causa contingentiae, quia potest velle et non velle.”
Logo, o agente voluntário age contingentemente.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o agente voluntário age contingentemente, porque a vontade, diferentemente da natureza, não é determinada por forma única e necessária, mas pode inclinar-se a diversos bens sob razão de bem.

Com efeito, a necessidade pertence ao que é determinado por sua forma; mas a contingência pertence ao que pode agir ou não agir, e agir de modos diversos.
Ora, a vontade é potência racional, cujo objeto é o bem apreendido pelo intelecto.
Mas o bem, enquanto apreendido, apresenta-se sob múltiplas condições — e, por isso, a vontade pode escolher entre muitos bens, e até recusar aquele que lhe é proposto.

Assim, nas ações voluntárias há contingência segundo a escolha (electio) e segundo o exercício do ato (actus voluntatis):

  • Secundum electionem, porque a vontade pode escolher entre contrários;
  • Secundum exercitium actus, porque pode também não agir de modo algum.

A contingência voluntária, porém, não é desordem, mas expressão da liberdade que pertence à razão.
Pois a vontade segue o juízo do intelecto, mas não de modo necessário, senão enquanto o juízo propõe o bem como tal.
Quando o bem é proposto sob razão de bem universal (como Deus para a vontade bem-aventurada), o movimento é necessário; mas quando é proposto sob razão de bem particular, o movimento é contingente.

Por isso, Alberto distingue três graus de necessidade e contingência no ato voluntário:

  1. Necessitas simpliciter, que pertence à vontade divina, porque nela o bem é idêntico ao ser, e não há potência para o contrário;
  2. Necessitas ex hypothesi, que ocorre quando o fim é proposto como necessário para outro fim — por exemplo, “quem quer viver, quer necessariamente comer”;
  3. Contingentia simpliciter, que pertence à vontade humana e às vontades criadas racionais, porque podem querer ou não querer, e escolher entre contrários.

Portanto, o agente voluntário age contingentemente, porque seu princípio é livre e não determinado, e porque o bem é apreendido sob múltiplas razões, não sob uma só.
E isso é o que distingue o movimento natural do movimento racional: o primeiro é necessário, o segundo é livre e contingente.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a vontade busca necessariamente o bem em geral, mas não este ou aquele bem particular. O bem enquanto tal é objeto necessário; mas o modo como ele é concretizado depende da escolha. Assim, o homem pode querer o bem e, contudo, errar quanto ao objeto.
  2. À segunda, responde-se que o juízo do intelecto não impõe necessidade à vontade, a menos que apresente o bem como absolutamente necessário. Quando o bem é proposto sob razão particular, a vontade permanece livre.
  3. À terceira, deve-se dizer que o poder de não agir ou de agir diversamente não implica desordem, mas perfeição, pois manifesta domínio racional sobre os meios. A desordem ocorre apenas quando a razão é obscurecida.
  4. À quarta, responde-se que nas vontades superiores há contingência quanto à eleição possível, mas não quanto à execução. Em Deus, o ato é necessário porque é idêntico à essência; nas criaturas racionais, há contingência porque há distinção entre potência e ato.

Conclusão.

O agente voluntário age contingentemente, porque a vontade é potência racional que pode agir ou não agir, e escolher entre contrários, conforme o modo como o intelecto apreende o bem.
A contingência, assim, é efeito da liberdade, e a liberdade é perfeição do agente racional.

Por isso, Alberto conclui:
“Voluntas agit contingenter, quia in potestate ejus est velle et non velle; et ideo dicitur causa contingentiae in rebus.”
A vontade age contingentemente, porque está em seu poder querer ou não querer; e por isso é dita causa da contingência nas coisas.

Quaestio XVII — Utrum omne agens agat propter bonum

(Se todo agente age por causa do bem)

Objeções.

  1. Parece que nem todo agente age por causa do bem. Pois muitos agentes operam por necessidade natural, sem conhecimento ou intenção do bem — como o fogo aquece, a pedra cai, o corpo pesado se move para o centro. Ora, onde não há conhecimento do fim, não pode haver intenção do bem. Logo, nem todo agente age por causa do bem.
  2. Além disso, o mal também é causa de movimento e ação, como se vê nas paixões desordenadas, na inveja, na ira ou na concupiscência. Ora, o mal é contrário ao bem. Logo, nem todo agente age por causa do bem.
  3. Ademais, nas ações violentas ou forçadas, o agente é movido contra sua inclinação natural. Ora, agir contra a inclinação é agir contra o bem próprio. Logo, nem todo agir é por causa do bem.
  4. Ainda, muitos agentes operam por hábito ou por instinto, e não deliberadamente. Ora, onde não há deliberação, não parece haver intenção do bem. Logo, nem todo agente age por causa do bem.

Em contrário (Sed contra).

Dionísio, no De Divinis Nominibus, capítulo IV, ensina:
“Omnia appetunt bonum.”
E Aristóteles, no Livro I da Ética, diz:
“Bonum est quod omnia appetunt.”
E Alberto comenta:
“Omnis actio est propter bonum, quia actus est perfectio, et perfectio est bonum.”
Logo, todo agente age por causa do bem.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que todo agente, de qualquer ordem, age por causa do bem, mas o faz de modos diversos, conforme o grau de conhecimento e de participação no ser.

Com efeito, o bem e o fim são convertíveis, pois “bonum et finis idem sunt secundum rem.”
O bem é aquilo que todas as coisas desejam, porque cada ente tende naturalmente à sua perfeição; e perfeição nada mais é que a atualização do ser segundo a forma própria.

Assim, toda ação visa o bem — seja o bem real, seja o bem aparente —, pois agir é sempre tender a uma forma ou estado de perfeição.
E como o ser (esse) e o bem (bonum) se convertem, toda causa eficiente tende, por sua própria natureza, a comunicar o ser, isto é, o bem.

Distinguem-se, porém, três modos de agentes, e em cada um deles o “agir por causa do bem” se realiza de maneira distinta:

  1. Agente natural, que age por inclinação da forma — como o fogo aquece e tende a comunicar sua perfeição. Age por causa do bem natural, que é a conservação e difusão da própria forma.
  2. Agente animal, que age por apetite sensitivo e imaginação. Age por causa do bem particular, isto é, daquilo que lhe parece agradável ou conveniente.
  3. Agente racional e voluntário, que age por conhecimento do fim. Age por causa do bem universal, que é apreendido como perfeição e desejado sob razão de bem.

Por isso, mesmo quando o homem escolhe o mal, o faz sob aparência de bem — como quem busca prazer, utilidade ou glória, julgando-os desejáveis.
Assim, o mal não é fim em si mesmo, mas somente um defeito no modo de buscar o bem.

Deus, que é o bem supremo, age também por causa do bem, mas não para adquiri-lo, e sim para comunicá-lo.
Nas criaturas, o bem é fim desejado; em Deus, é bem difusivo.
Por isso, Dionísio afirma: “Divina bonitas est causa omnium bonorum, quia in se ipsa est effusiva et communicativa.”

Assim, agir por causa do bem é o selo de toda causalidade: toda forma tende a difundir-se, todo ser tende a conservar-se, toda inteligência tende a compartilhar o que é perfeito.

Logo, é universal o axioma: “Omne agens agit propter bonum, sive sciat sive nesciat.”
O que não conhece o bem, tende a ele naturalmente; o que o conhece, tende a ele voluntariamente.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o agente natural, embora não conheça o bem, age por ele enquanto o bem é idêntico à perfeição da forma. Assim, o fogo aquece buscando conservar sua forma e comunicar seu ato, que é seu bem próprio.
  2. À segunda, responde-se que o mal nunca é fim, mas privação de bem. Quem age por maldade busca, sob aparência de bem, algum prazer ou satisfação. Assim, o mal é desejado apenas enquanto revestido de bem aparente.
  3. À terceira, deve-se dizer que o agente forçado não age propriamente, mas é movido. A violência é impedimento do movimento natural em direção ao bem. Logo, não destrói o princípio, mas o suspende.
  4. À quarta, responde-se que o hábito e o instinto são modos de inclinação natural. Assim como a natureza tende ao bem físico, o instinto tende ao bem conveniente à espécie. Mesmo sem deliberação, o fim é sempre o bem.

Conclusão.

Todo agente, natural ou livre, age por causa do bem, porque toda ação é ordenada à perfeição, e toda perfeição é bem.
O bem é, portanto, o fim de toda causalidade e o termo de todo movimento.

Por isso, Alberto conclui:
“Omne agens agit propter bonum: quia bonum est quod omnia appetunt, sive naturaliter, sive per intellectum.”
Todo agente age por causa do bem: porque o bem é aquilo que todas as coisas desejam, seja naturalmente, seja intelectualmente.

Quaestio XVIII — Utrum in causis agentibus sit ordo secundum dignitatem

(Se nas causas agentes há uma ordem segundo a dignidade)

Objeções.

  1. Parece que não há ordem segundo a dignidade entre as causas agentes. Pois toda causa eficiente age apenas enquanto está em ato. Ora, a ação segue o ato, não a dignidade. Logo, a ordem das causas agentes é de potência, não de dignidade.
  2. Além disso, as causas segundas muitas vezes produzem efeitos que as causas primeiras não produzem — como o fogo, que aquece, embora a causa primeira não aqueça corporalmente. Logo, não há ordem segundo dignidade, mas segundo diversidade de operação.
  3. Ademais, os agentes inferiores agem imediatamente sobre as coisas sensíveis, e produzem efeitos visíveis, ao passo que os superiores agem de modo oculto e remoto. Ora, o que é mais imediato parece mais perfeito na execução. Logo, não há ordem de dignidade, mas de distância causal.
  4. Ainda, a dignidade pertence ao fim, não à causa eficiente. Ora, o fim é causa final, não causa eficiente. Logo, a ordem de dignidade não convém às causas agentes, mas aos fins.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro XII da Metafísica, ensina:
“In moventibus et movendis est ordo; et primum movens est nobilius.”
E Alberto comenta:
“Ordo causarum agentium est secundum dignitatem virtutis et propinquitatem ad primum.”
Logo, nas causas agentes há uma ordem segundo a dignidade.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que em todas as causas agentes há uma ordem segundo a dignidade, e que essa ordem é fundada na participação da virtude do primeiro agente.

Com efeito, a dignidade de uma causa eficiente não se mede pela quantidade do efeito, mas pela proximidade ao primeiro princípio, que é causa universal e perfeita.
Assim, quanto mais uma causa participa da virtude e da universalidade do primeiro agente, tanto mais é digna.

A ordem das causas, portanto, segue uma hierarquia de dependência:

  • No ápice está o primeiro agente, que é Deus, ato puro, causa universal de todo ser e de toda ação.
  • Abaixo dele estão os agentes universais secundários, como as inteligências celestes, que movem por virtude recebida.
  • Em seguida, as causas particulares naturais, que agem por participação mais limitada dessa virtude.
  • Por fim, as causas instrumentais, cuja ação depende totalmente daquelas superiores.

Assim, toda ordem causal é uma gradação de dignidade, conforme a medida da luz que cada causa recebe do primeiro.
Como o sol ilumina diversos corpos com intensidade diversa, também a causa primeira comunica sua virtude a muitas causas segundo diferentes graus de perfeição.

Dessa maneira, há nas causas agentes uma dupla hierarquia:

  1. Hierarquia essencial, segundo a nobreza da forma e da virtude — pois quanto mais perfeita a forma, mais perfeita a ação;
  2. Hierarquia operacional, segundo a universalidade do efeito — pois quanto mais universal é a ação, mais digna é a causa.

Assim, a alma é mais digna que o corpo, porque move por virtude espiritual; o intelecto é mais digno que a imaginação; e a causa celeste é mais digna que a elementar.

A dignidade, portanto, segue a proximidade com o princípio de causalidade, que é ato puro.
E como ensina Alberto:
“Dignitas agentis est secundum participationem primi actus, qui est Deus.”

Logo, a ordem das causas agentes é uma ordem de luz: cada uma age segundo o grau de perfeição que recebeu do primeiro agente.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o ato é fundamento da ação, mas a dignidade é medida pela perfeição do ato. Assim, duas causas agem em ato, mas a mais perfeita em ser e forma é mais digna.
  2. À segunda, responde-se que os efeitos das causas inferiores não são mais perfeitos que os das superiores, mas mais particulares. A perfeição está na universalidade e na dependência do princípio. Assim, o fogo aquece corporalmente, mas não causa o ser; o sol dá a vida universalmente, logo é mais digno.
  3. À terceira, deve-se dizer que a distância na operação não destrói a dignidade, pois as causas superiores operam universalmente e invisivelmente, e nisso consiste sua excelência. O mais imediato não é o mais perfeito, mas o mais material.
  4. À quarta, responde-se que a dignidade pertence primariamente ao fim, mas também ao agente, enquanto ele é ordenado ao fim e participa de sua perfeição. Assim, a nobreza da causa eficiente deriva da semelhança com o fim que ela realiza.

Conclusão.

Há, pois, uma ordem de dignidade nas causas agentes, segundo o grau de perfeição com que participam da virtude do primeiro agente.
Essa ordem constitui a harmonia do universo e reflete a hierarquia do ser.

Por isso, Alberto conclui:
“In causis agentibus est ordo secundum dignitatem, quia inferiores agunt in virtute superiorum, et omnes in virtute primi, quod est Deus.”
Nas causas agentes há uma ordem segundo a dignidade, porque as inferiores agem na virtude das superiores, e todas na virtude do primeiro, que é Deus.

Quaestio XIX — Utrum causa prima contineat virtute omnes causas inferiores

(Se a causa primeira contém virtualmente todas as causas inferiores)

Objeções.

  1. Parece que a causa primeira não contém virtualmente todas as causas inferiores. Pois o que é universal não contém propriamente o que é particular, mas o transcende. Ora, a causa primeira é universal, e as causas inferiores são particulares. Logo, a causa primeira não contém as inferiores, mas apenas as antecede.
  2. Além disso, aquilo que contém outro em virtude deve ter uma semelhança formal com o contido. Ora, a causa primeira é imaterial, e muitas causas inferiores são corpóreas e materiais. Logo, a causa primeira não pode conter virtualmente as inferiores, porque nelas não há semelhança de forma.
  3. Ademais, se a causa primeira contivesse todas as causas inferiores, então toda operação destas seria operação daquela. Ora, as causas inferiores muitas vezes produzem efeitos contingentes e variáveis, o que não convém à causa primeira, que é imutável. Logo, esta não as contém virtualmente.
  4. Ainda, se a causa primeira contivesse virtualmente as inferiores, então o poder destas seria desnecessário, e todas as causas segundas seriam suprimidas. Mas a ordem da natureza mostra a necessidade das causas intermediárias. Logo, a causa primeira não as contém, senão as move e conserva.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro XII da Metafísica, ensina:
“Primum movens movet omnia, et omnia in eo dependent sicut in principio.”
E Alberto comenta:
“Causa prima continet virtute omnes inferiores, quia dat eis formam, ordinem et virtutem agendi.”
Logo, a causa primeira contém virtualmente todas as causas inferiores.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a causa primeira contém virtualmente todas as causas inferiores, porque toda virtude agente que existe em qualquer causa criada procede da virtude da primeira, e nela está contida eminenter e fontalmente.

Com efeito, toda causalidade criada é participação da causalidade divina.
Assim como a luz solar contém virtualmente todas as cores, e delas é princípio, também a causa primeira contém virtualmente todos os modos de causar das causas inferiores.

Pois a causa primeira é ato puro e perfeição universal; por isso, tudo o que nas causas segundas se encontra particularizado e limitado, nela está contido de modo eminente e infinito.
Por isso se diz que Deus é virtus virtutum, e que omnia sunt in Deo secundum modum causae et non causati.

Ora, uma coisa é conter formaliter, outra é conter virtualiter:

  • Formaliter contém aquilo que possui sob a mesma razão de forma e espécie;
  • Virtualiter contém aquilo que possui sob razão de poder e eminência.

Assim, Deus não contém as formas materiais formalmente, mas contém-nas virtualmente, porque é o poder universal de todas as formas.
Do mesmo modo, a causa superior contém as inferiores não porque as repita, mas porque é princípio de seu poder.

Daí que todas as causas inferiores agem in virtute primae causae, isto é, porque a primeira age nelas e por elas.
O sol ilumina as cores não porque se multiplique em cada corpo, mas porque comunica a todos a sua luz; assim também a causa primeira move todas as causas pela sua virtude presente.

Além disso, a virtude da causa primeira não se divide, mas comunica-se sem diminuição, permanecendo inteira em si mesma e inteira em cada causa secundária segundo o grau de recepção.
Por isso, as causas inferiores participam dela segundo proporção e ordem, como espelhos que refletem a luz em graus diversos.

E é assim que se mantém a hierarquia do universo: o primeiro contém tudo, e o que é posterior existe e age pela virtude do anterior.
A causa primeira é, portanto, não só princípio do ser, mas também princípio de toda causalidade.

Como ensina Alberto:
“In Deo sunt omnes causae, quia in ipso est ratio omnis virtutis et omnis ordinis causarum.”
Em Deus estão todas as causas, porque n’Ele está a razão de toda virtude e de toda ordem das causas.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o universal não contém o particular formalmente, mas eminenter. Assim, a causa primeira, sendo universal, não contém as causas inferiores sob a mesma forma, mas as precede e as envolve na raiz de seu poder.
  2. À segunda, responde-se que a semelhança formal não é requerida para a contenção virtual. Basta a semelhança de potência e de origem. Assim, o espiritual contém o material como causa contém seu efeito, não por igualdade, mas por excelência.
  3. À terceira, deve-se dizer que as operações variáveis das causas inferiores não implicam mudança na causa primeira, porque ela age nelas como princípio estável. A mutabilidade está nos receptores, não no doador. Assim como o sol é imóvel e, contudo, causa movimentos diversos na terra.
  4. À quarta, responde-se que a participação da virtude não destrói, mas funda a necessidade das causas intermediárias. Pois Deus quis que sua causalidade se comunicasse por graus, a fim de que o universo fosse ordenado e hierárquico. Assim, as causas segundas são necessárias, não por indigência da primeira, mas para manifestar sua abundância.

Conclusão.

A causa primeira contém virtualmente todas as causas inferiores, porque é princípio de seu ser, de sua ordem e de sua virtude de agir.
Tudo o que as causas inferiores possuem, possuem por participação da virtude suprema.

Por isso, Alberto conclui:
“Causa prima continet omnes causas virtute et eminentia, quia in ipsa est fons omnis virtutis et ratio omnis ordinis causarum.”
A causa primeira contém todas as causas por virtude e eminência, porque nela está a fonte de toda virtude e a razão de toda ordem das causas.

Quaestio XX — Utrum causa prima agat in omnibus immediate

(Se a causa primeira age em todas as coisas de modo imediato)

Objeções.

  1. Parece que a causa primeira não age em todas as coisas de modo imediato, pois se assim fosse, as causas segundas seriam supérfluas, e a ordem da natureza seria destruída. Ora, vemos que os efeitos se produzem por meio de causas intermediárias, como o calor do fogo aquece, e o sol faz germinar as plantas. Logo, a causa primeira não age imediatamente em tudo, mas por intermédio das segundas.
  2. Além disso, o que age imediatamente age sem meio, e o que age sem meio não admite gradação de potência ou de distância. Ora, os efeitos do primeiro agente aparecem graduados e proporcionados — uns mais perfeitos, outros menos. Logo, a causa primeira não age em tudo de modo imediato.
  3. Ademais, a causa primeira é incorpórea e infinita, enquanto as causas segundas são corpóreas e finitas. Ora, entre o infinito e o finito não pode haver proporção direta nem contato imediato. Logo, a causa primeira não pode agir imediatamente sobre todas as coisas.
  4. Ainda, se a causa primeira agisse em todas as coisas de modo imediato, nada escaparia à sua ação. Mas há males e deficiências na natureza, e defeitos nos efeitos. Logo, a causa primeira não age em tudo de modo imediato, senão mediatamente, por intermédio de causas particulares sujeitas à corrupção.

Em contrário (Sed contra).

Dionísio, no De Divinis Nominibus, capítulo IV, ensina:
“Divina bonitas immediate attingit omnia et conservat omnia.”
E Alberto comenta:
“Causa prima agit immediate in omnibus, quia est in omnibus per essentiam, praesentiam et potentiam.”
Logo, a causa primeira age em todas as coisas de modo imediato.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a causa primeira age em todas as coisas de modo imediato, mas de maneira diversa segundo o grau dos efeitos e a ordem das causas.

Com efeito, há dupla mediação nas ações:

  • Uma de execução, pela qual uma causa age através de outra como instrumento;
  • Outra de dependência, pela qual a causa inferior recebe o poder de agir da superior.

Ora, quanto à execução, a causa primeira muitas vezes age por meio das causas segundas, para que a ordem do universo se conserve;
mas quanto à virtude e influxo, age imediatamente em todas, porque nenhuma causa pode agir senão pela virtude que dela procede.

Assim, o poder do primeiro agente penetra todas as coisas, e nelas está presente como raiz do ser e do operar.
Por isso se diz que “Deus est causa causarum et virtus virtutum”.

A ação imediata da causa primeira, portanto, não exclui a mediação das causas secundárias, mas as fundamenta e conserva, pois nelas e por elas age.
Do mesmo modo que a luz do sol ilumina o ar imediatamente e, por meio dele, ilumina as coisas inferiores, assim também Deus atua em todas as causas imediatamente, e, por meio delas, nos efeitos.

Logo, a causa primeira age em tudo immediate quanto à virtude, mas mediate quanto à execução e ao modo da operação.

Essa distinção permite compreender três níveis de causalidade divina:

  1. Causalitas immediata in esse — porque Deus dá e conserva o ser de todas as coisas sem intermediário;
  2. Causalitas mediate in fieri — porque ordena a produção dos efeitos através de causas segundas;
  3. Causalitas immediata in gubernatione — porque dirige todos os movimentos e efeitos ao fim último, que é Ele mesmo.

Assim, o influxo da causa primeira é universal e contínuo:
tudo o que age, age em virtude dela;
tudo o que subsiste, subsiste pela sua presença;
tudo o que tende a um fim, tende pela sua ordenação.

E como ensina Alberto:
“Sicut artifex est in instrumento per virtutem artis, ita Deus est in omnibus per virtutem essendi et operandi.”
Como o artífice está presente no instrumento pela virtude da arte, assim Deus está em todas as coisas pela virtude de ser e de operar.

Logo, embora a causa primeira seja absolutamente transcendente, sua ação é imediata em todas as coisas, porque é causa interior e fontal, não apenas exterior e motriz.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que as causas segundas não são inúteis, pois são modos ordenados de participação da causa primeira. Deus age nelas e por elas, como o artífice age por meio dos instrumentos, sem que estes percam sua causalidade própria.
  2. À segunda, responde-se que a gradação dos efeitos não provém da distância da causa primeira, mas da capacidade diversa dos receptores. Assim como a luz do sol é a mesma em si, mas é recebida diferentemente pelos corpos transparentes e opacos.
  3. À terceira, deve-se dizer que entre o infinito e o finito não há proporção de igualdade, mas de dependência: o finito depende totalmente do infinito. Assim, a causa primeira toca todas as coisas sem distância, não por contato local, mas por presença essencial.
  4. À quarta, responde-se que o mal e a deficiência não provêm da ação da causa primeira, mas da limitação das causas secundárias. A ação de Deus é sempre boa e perfeita, mas, ao passar pelos instrumentos finitos, é recebida com limitação.

Conclusão.

A causa primeira age imediatamente em todas as coisas, porque é a fonte universal de ser, de virtude e de operação.
As causas segundas são instrumentos dessa ação e participações ordenadas de sua potência.

Por isso, Alberto conclui:
“Causa prima agit immediate in omnibus, quia in omnibus est per virtutem suam, et per eam omnes aliae agunt.”
A causa primeira age imediatamente em todas as coisas, porque em todas está por sua virtude, e por ela todas as outras agem.

ALBERTI MAGNI — SUPER LIBROS METAPHYSICORUM ARISTOTELIS

Liber Septimus – De substantia et essentia

(Livro Sétimo — Sobre a substância e a essência)

1.      Quaestio I — Utrum substantia sit quod habet esse per se et non in alio.
 Se a substância é aquilo que tem o ser por si e não em outro.

2.      Quaestio II — Utrum substantia dividatur in primam et secundam.
 Se a substância se divide em primeira e segunda.

3.      Quaestio III — Utrum substantia prima sit individuum materiale.
 Se a substância primeira é o indivíduo material.

4.      Quaestio IV — Utrum substantia secunda sit species vel genus.
 Se a substância segunda é a espécie ou o gênero.

5.      Quaestio V — Utrum substantia sit causa essendi aliis.
 Se a substância é causa do ser para as outras coisas.

6.      Quaestio VI — Utrum essentia et substantia differant.
 Se essência e substância diferem.

7.      Quaestio VII — Utrum essentia sit forma vel compositum.
 Se a essência é forma ou composto.

8.      Quaestio VIII — Utrum essentia sit eadem in omnibus individuis speciei.
 Se a essência é a mesma em todos os indivíduos de uma espécie.

9.      Quaestio IX — Utrum essentia habeat esse reale in rebus.
 Se a essência tem ser real nas coisas.

10.  Quaestio X — Utrum esse sit aliud ab essentia.
 Se o ser é distinto da essência.

11.  Quaestio XI — Utrum esse sit actus essentiae.
 Se o ser é ato da essência.

12.  Quaestio XII — Utrum essentia sit potentia respectu esse.
 Se a essência é potência em relação ao ser.

13.  Quaestio XIII — Utrum compositio essentiae et esse sit realis vel rationis tantum.
 Se a composição de essência e ser é real ou apenas de razão.

14.  Quaestio XIV — Utrum in substantiis separatis sit compositio essentiae et esse.
 Se nas substâncias separadas há composição de essência e ser.

15.  Quaestio XV — Utrum Deus sit ipsa essentia suum esse.
 Se Deus é sua própria essência e ser.

16.  Quaestio XVI — Utrum esse creatum participet esse divinum.
 Se o ser criado participa do ser divino.

17.  Quaestio XVII — Utrum essentia creata possit existere sine participatione esse.
 Se a essência criada pode existir sem participação do ser.

18.  Quaestio XVIII — Utrum esse et essentia se habeant ut actus et potentia.
 Se o ser e a essência se relacionam como ato e potência.

19.  Quaestio XIX — Utrum essentia determinat modum essendi.
 Se a essência determina o modo de ser.

20.  Quaestio XX — Utrum essentia sit principium individuationis.
 Se a essência é o princípio de individuação.

Quaestio I — Utrum substantia sit quod habet esse per se et non in alio

(Se a substância é aquilo que tem o ser por si e não em outro)

Objeções.

  1. Parece que a substância não é aquilo que tem o ser por si e não em outro. Pois a forma, sendo princípio do ser, é aquilo por meio do qual a coisa existe em ato. Ora, a forma está em outro, isto é, na matéria. Logo, se a substância é aquilo que tem o ser, e a forma tem o ser, a substância está em outro, e não por si mesma.
  2. Além disso, a definição parece excluir de “substância” os acidentes, mas também as formas substanciais. Ora, as formas substanciais são substâncias, segundo Aristóteles no Livro VII da Metafísica, onde diz: “Formae sunt substantiae.” Logo, se a substância é o que tem o ser por si e não em outro, as formas não seriam substâncias, o que é falso.
  3. Ademais, o que existe “por si” é o ser necessário, cuja essência implica o existir. Mas as substâncias criadas não são necessárias por si, pois recebem o ser de outro. Logo, não podem ser ditas ter o ser por si, e portanto, não se aplicaria a elas tal definição.
  4. Ainda, toda coisa que tem o ser “por si” parece ser simples e imutável. Ora, as substâncias corporais são compostas e sujeitas à mutação. Logo, não têm o ser por si, mas por outro; e, portanto, a definição não lhes convém.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro V da Metafísica, diz:
“Substantia est quod per se est et non in subiecto.”
E Boécio, no De Trinitate, afirma:
“Substantia est id quod subsistit et sustinet accidentia.”
Logo, a substância é aquilo que tem o ser por si e não em outro.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a substância é propriamente aquilo que tem o ser por si e não em outro, e essa definição é a mais adequada conforme o modo de inteligir do ser em Aristóteles.

Com efeito, a distinção entre substância e acidente funda-se no modo de participar do ser (esse).
A substância participa do ser per se, enquanto o acidente participa in alio.
A substância tem o ser em si mesma (in se), o acidente tem o ser em outro (in alio).

Assim, a substância é o ente primeiro, e o acidente é ente segundo.
A substância subsiste, o acidente insiste.
A substância é fundamento, o acidente é disposição.

Portanto, dizer que a substância “tem o ser por si” não significa que ela tenha o ser “a partir de si mesma”, como se fosse causa de seu próprio existir, mas que não o tem como estando em outro.
A expressão per se denota aqui não a causa eficiente, mas o modo de subsistência.

Dessa forma, o ser da substância é absoluto, o do acidente é relativo.
A substância existe secundum se totam, o acidente existe secundum partem ou in alio.

E, portanto, conforme a tradição peripatética, entende-se que “ter o ser por si” equivale a “subsistir”, e “não estar em outro” equivale a “não ser sustentado como forma em sujeito”.

Daí que Aristóteles, ao introduzir as categorias, tenha dito:
“Substantia est quae neque in subiecto est neque de subiecto dicitur.”
Isto é, a substância não está em outro como em um sujeito, nem se predica de outro como um acidente.

Por conseguinte, há dois modos de substância:

  1. A substância primeira, que é o indivíduo subsistente (hoc aliquid), como “este homem”, “este cavalo”;
  2. A substância segunda, que é a natureza universal ou espécie, como “homem”, “animal”, que não está em outro, mas se predica de muitos.

Ambas têm o ser por si, mas a primeira de modo completo e singular, a segunda de modo comum e essencial.

A substância, portanto, é o sujeito último do ser e o princípio primeiro da predicação, razão pela qual tudo o mais se diz “do ser” por relação a ela.
E é nesse sentido que Alberto comenta:
“Substantia dicitur quasi substans, id est sustinens.”
Ou seja: substância é aquilo que está sob as outras realidades, sustentando-as no ser.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a forma, embora esteja na matéria, é princípio de subsistência da substância, e não substância enquanto está em outro, mas enquanto constitui o composto que subsiste. Assim, a forma substancial é causa da substância, não seu sujeito.
  2. À segunda, responde-se que a forma substancial é chamada “substância” não enquanto está na matéria, mas enquanto dá o ser substancial ao composto. Portanto, é substância per participationem, não per subsistentiam.
  3. À terceira, deve-se dizer que “ter o ser por si” não significa ter o ser sem causa, mas não tê-lo em outro. Assim, as substâncias criadas têm o ser por si quanto ao modo de existir, mas por outro quanto à origem do ser.
  4. À quarta, responde-se que a mutabilidade das substâncias corporais não impede que tenham o ser por si, pois essa mutabilidade é acidental, não essencial. Elas subsistem por si, embora possam mudar quanto às disposições.

Conclusão.

A substância é aquilo que tem o ser por si e não em outro, porque subsiste no ser de modo próprio e absoluto, sendo o fundamento de todas as outras realidades.

Por isso, Alberto conclui:
“Substantia est id quod habet esse per se et non in alio; unde est prima inter entia et sustentatrix omnium.”
A substância é aquilo que tem o ser por si e não em outro; por isso é a primeira entre os entes e a sustentadora de todos.

Quaestio II — Utrum substantia dividatur in primam et secundam

(Se a substância se divide em primeira e segunda)

Objeções.

  1. Parece que a substância não se divide em primeira e segunda. Pois a divisão deve ser feita segundo partes que pertençam à mesma natureza do dividido. Ora, a substância primeira é o indivíduo, e a segunda é a espécie ou o gênero, que se dizem de muitos. Mas o indivíduo e a espécie não pertencem à mesma natureza do modo como as partes pertencem ao todo. Logo, não se deve dizer que a substância se divide em primeira e segunda.
  2. Além disso, aquilo que é dividido deve ser comum às partes. Ora, a substância primeira não é comum, mas singular, e não se comunica a muitos. Logo, a substância, enquanto comum, não se divide propriamente em primeira e segunda.
  3. Ademais, as divisões verdadeiras devem ser exaustivas e opostas. Ora, a substância primeira e a segunda não são opostas, pois uma contém a razão da outra: o indivíduo participa da espécie, e a espécie se realiza no indivíduo. Logo, essa divisão não é verdadeira nem natural.
  4. Ainda, se a substância se divide em primeira e segunda, a substância primeira não poderia ser dita “substância” propriamente, porque estaria contida sob outra, e não seria mais “o que é por si”. Mas Aristóteles diz que a substância é precisamente o que é por si e não em outro. Logo, a divisão em primeira e segunda é inadequada.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro V das Categorias, afirma expressamente:
“Substantia prima est quae neque in subiecto est neque de subiecto dicitur; substantia secunda est quae de primis dicuntur.”
E Alberto comenta:
“Divisio substantiae in primam et secundam est divisio secundum modum essendi et praedicandi.”
Logo, a substância se divide em primeira e segunda.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a divisão da substância em primeira e segunda é legítima e necessária, segundo o duplo modo pelo qual a substância se considera:
— quanto ao ser (esse), e
— quanto ao dizer-se (praedicari).

A substância primeira é aquela que existe por si, individualmente e na ordem do ser: é o hoc aliquid, aquilo que é “este ente”.
A substância segunda é aquela que se diz de muitos, na ordem da razão e da definição: é a natureza comum, como “homem”, “animal”, “corpo”.

Assim, a distinção entre ambas não é segundo a essência formal, mas segundo o modo de existir e o modo de ser conhecido.
A mesma natureza que, enquanto concebida universalmente, é substância segunda, é, enquanto subsiste individualmente, substância primeira.

Por isso, Aristóteles estabelece a divisão não como divisão de espécies contrárias, mas como distinção de ordem lógica e ontológica:
a substância primeira é princípio de individuação, a segunda é princípio de conhecimento.

A substância primeira é o fundamento da realidade; a segunda, o fundamento da ciência.
A primeira é causa do “ser”; a segunda, causa do “dizer”.
A primeira é “o que é”, a segunda é “aquilo de que se diz o que é”.

Com efeito, a substância primeira não se predica de outro, mas é aquilo de que tudo o mais se predica;
a substância segunda se predica da primeira, significando a essência e a espécie.

Daí que Aristóteles diga que “as substâncias primeiras são os indivíduos, e as segundas são as espécies e os gêneros.”

E Alberto acrescenta:
“Substantia secunda est conceptus naturae communis, quae salvatur in multis; substantia prima est individuum in quo talis natura subsistit.”
Ou seja: a substância segunda é o conceito da natureza comum, que se conserva em muitos; a substância primeira é o indivíduo no qual essa natureza subsiste.

Portanto, ambas se relacionam como o universal e o singular, o inteligível e o sensível, o essencial e o existente.
Mas a prioridade pertence à substância primeira, porque nela a segunda é realizada, e sem ela não teria ser fora do intelecto.

Por isso, a ordem é tal:

  • A substância primeira é fundamento da essência real;
  • A substância segunda é fundamento da predicação e da ciência.

Assim, toda ciência das coisas naturais considera as substâncias segundas, mas tem por sujeito as primeiras; porque conhecer é conhecer o universal, mas o ser pertence ao individual.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a divisão não é feita por partes materiais, mas por modos de consideração. O mesmo ente pode ser considerado enquanto existente (substantia prima) e enquanto universal (substantia secunda).
  2. À segunda, responde-se que a substância primeira é singular quanto ao ser, mas comum quanto à noção de natureza. A divisão é feita segundo esta noção, não segundo a comunicação atual.
  3. À terceira, deve-se dizer que a primeira e a segunda não são opostas, mas correlativas: a segunda se diz da primeira, e a primeira realiza a segunda. A divisão, portanto, não é de contrariedade, mas de relação entre id quod est e quo significatur quod est.
  4. À quarta, responde-se que a substância primeira, embora esteja sob a segunda quanto à predicação, não está sob outra quanto ao ser. É “por si” quanto à existência, mas “em outro” quanto ao conceito universal, que dela se abstrai.

Conclusão.

A substância divide-se em primeira e segunda, não como partes contrárias, mas como modos diversos do mesmo ser:
— a primeira é o ente singular e subsistente;
— a segunda é a natureza comum inteligida.

Por isso, Alberto conclui:
“Divisio substantiae in primam et secundam est necessaria, quia prima est quod subsistit in se, secunda est quod intelligitur de multis.”
A divisão da substância em primeira e segunda é necessária, porque a primeira é o que subsiste em si, e a segunda é o que se entende como pertencente a muitos.

Quaestio III — Utrum substantia prima sit individuum materiale

(Se a substância primeira é o indivíduo material)

Objeções.

  1. Parece que a substância primeira não é o indivíduo material. Pois Aristóteles diz que “as formas são substâncias em grau máximo” (Metaph., VII, c.7). Ora, a forma, sendo ato e princípio do ser, é mais perfeita que a matéria e o composto material. Logo, a substância primeira não é o indivíduo material, mas a forma.
  2. Além disso, a matéria, por si, é potência, e o composto material participa de potência e de corrupção. Ora, o que é substância primeira deve ser ser por excelência, e não potência. Logo, o indivíduo material, que é sujeito à mudança, não pode ser substância primeira.
  3. Ademais, o que é primeiro na ordem do ser é simples e indivisível. Ora, o indivíduo material é composto de matéria e forma, e, portanto, divisível. Logo, não é o primeiro na ordem substancial.
  4. Ainda, as substâncias separadas — isto é, as inteligências e as almas — existem e subsistem por si, e não em outro. Ora, isso é o que constitui a definição de substância. Logo, elas deveriam ser chamadas substâncias primeiras, e não os indivíduos materiais.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VII da Metafísica, afirma claramente:
“Substantiae primae sunt quae neque de subiecto dicuntur neque in subiecto sunt.”
E imediatamente acrescenta:
“Tales sunt singulares, ut hic homo, hic equus.”
Logo, a substância primeira é o indivíduo material, como “este homem”, “este cavalo”.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a substância primeira é o indivíduo material, não porque a matéria seja o princípio mais nobre da substância, mas porque o indivíduo é o primeiro ente que subsiste em si mesmo, e não se predica de outro.

Com efeito, “substância primeira” significa “aquilo que é e subsiste por si”, e “não se diz de outro”. Ora, entre as coisas que têm ser por si, o indivíduo material é o primeiro que existe na ordem da natureza sensível, porque é composto e subsistente.

A forma, de fato, é princípio de ser, mas não subsiste sozinha: ela existe naquilo de que é forma.
A matéria tampouco subsiste, porque é potência pura.
Somente o composto, enquanto ato e potência unidos, tem ser completo, e por isso é substância primeira.

Assim, a forma é substância em ato, mas não “primeira” quanto à subsistência.
O indivíduo material é “substância primeira”, porque é aquilo que existe em si e sustenta todas as propriedades e acidentes.

Por isso, Aristóteles, ao distinguir entre forma, matéria e composto, ensina que:
— a forma é causa essendi;
— a matéria é causa possibilitatis;
— o composto é id quod est, o ser concreto e subsistente.

A substância primeira, portanto, é o sujeito último de toda predicação, e fundamento do ser real.
Em toda ordem de conhecimento, o que primeiro se conhece é o universal; mas em toda ordem de ser, o que primeiro existe é o singular.

Daí que Alberto explique:
“Substantia prima dicitur individuum, quia hoc solum habet esse completum, nec est in alio sicut in subiecto.”
A substância primeira é chamada indivíduo, porque só ele tem o ser completo, e não está em outro como em sujeito.

Ainda, a razão pela qual Aristóteles chama “este homem” e “este cavalo” de substâncias primeiras é que nelas a essência é realizada concretamente, e nelas todas as outras coisas se sustentam.
O indivíduo é o fundamento da espécie no ser, como a espécie é o fundamento do indivíduo no conhecer.

Por conseguinte, embora a forma seja mais nobre segundo a perfeição metafísica, o indivíduo material é mais primeiro segundo a realidade existencial.
E é segundo essa ordem que a filosofia natural e a metafísica nomeiam o composto sensível de “substância primeira”.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a forma é substância quanto à essência, mas não quanto à subsistência. É princípio formal da substância, não o sujeito subsistente. Logo, o composto material é chamado substância primeira, porque é o que subsiste.
  2. À segunda, responde-se que a matéria, em si, é potência, mas unida à forma constitui o ente completo. Assim, embora o composto tenha potência, ele tem o ser em ato, e enquanto tal é substância primeira.
  3. À terceira, deve-se dizer que a simplicidade é primeira em perfeição, não em ordem de geração. Na natureza sensível, o primeiro a existir é o composto material, porque a forma e a matéria são princípios dele.
  4. À quarta, responde-se que as substâncias separadas são substâncias por excelência, mas não no mesmo gênero das substâncias materiais. A divisão em substância primeira e segunda refere-se às substâncias sensíveis consideradas por Aristóteles, e não às separadas.

Conclusão.

A substância primeira é o indivíduo material, porque é o primeiro ente que subsiste em si mesmo e é sujeito de todas as determinações e acidentes.

Por isso, Alberto conclui:
“Substantia prima est individuum materiale, quia hoc solum subsistit in se et sustentat alia.”
A substância primeira é o indivíduo material, porque somente ele subsiste em si e sustenta os demais.

Quaestio IV — Utrum substantia secunda sit species vel genus

(Se a substância segunda é a espécie ou o gênero)

Objeções.

  1. Parece que a substância segunda não é a espécie nem o gênero, mas a essência comum em si. Pois o gênero e a espécie são modos de predicação da essência, e não a essência mesma. Logo, se a substância segunda é a essência universal, ela não é nem espécie nem gênero, mas fundamento de ambos.
  2. Além disso, o gênero e a espécie são distinções lógicas, não reais. Mas a substância, enquanto tal, é do domínio do ser e não do pensamento. Logo, chamar a substância segunda de gênero ou espécie seria reduzir o real ao lógico.
  3. Ademais, segundo Aristóteles, “a substância é aquilo que nem se diz de um sujeito, nem está em um sujeito.” Ora, tanto o gênero quanto a espécie se dizem de um sujeito. Logo, não podem ser substâncias segundas no mesmo sentido que o indivíduo é substância primeira.
  4. Ainda, se a substância segunda fosse a espécie ou o gênero, toda substância universal seria somente um conceito da mente, sem fundamento real. Mas o universal tem raiz no real, pois há uma natureza comum a muitos indivíduos. Logo, a substância segunda não se identifica nem com gênero nem com espécie, mas com a natureza comum considerada em si mesma.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles diz nas Categorias:
“Substantiae secundae dicuntur species et genera substantiarum primarum, ut homo et animal.”
Logo, a substância segunda é propriamente a espécie e o gênero das substâncias primeiras.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a substância segunda se diz propriamente daquilo que é universal e predicável de muitos, e, portanto, é a espécie e o gênero, enquanto ambos significam a essência comum.

Com efeito, há tripla consideração naquilo que se chama “substância”:

  1. quanto à essência mesma (quidditas rei),
  2. quanto à existência em singular (esse in individuo),
  3. quanto à inteligibilidade universal (esse in intellectu).

A substância primeira corresponde ao segundo modo — o ser subsistente e singular;
a substância segunda corresponde ao terceiro — o ser inteligido como comum.

E, porque o intelecto, ao conhecer, abstrai das condições materiais e individuais, considera a natureza “homem”, “animal”, “corpo”, como algo que pode ser dito de muitos.
Nesse sentido, a natureza assim considerada é chamada espécie, se diz respeito aos indivíduos; e gênero, se diz respeito às espécies que nela se incluem.

Assim, Alberto explica:
“Substantia secunda dicitur species vel genus, secundum quod natura communis consideratur ut communicabilis multis.”
Ou seja: a substância segunda é dita espécie ou gênero segundo a natureza comum é considerada como comunicável a muitos.

Entretanto, não se deve pensar que essa natureza seja uma coisa distinta nas espécies e nos indivíduos, mas que é a mesma natureza, que existe de modo diverso conforme o grau de abstração.
No indivíduo, ela é existente (esse naturale);
na mente, é inteligida (esse intelligibile);
na definição, é dita universal (esse logicum).

Assim, quando dizemos “homem é animal”, falamos da substância segunda sob o aspecto de gênero e espécie; mas quando dizemos “Sócrates é homem”, referimo-nos à substância primeira.

Portanto, a substância segunda é gênero e espécie, não como dois entes diversos, mas como dois modos de predicação da mesma natureza universal.
O gênero expressa o ser comum mais amplo, e a espécie o ser comum mais determinado; ambos, porém, significam a mesma substância quanto ao real.

E porque a essência não se multiplica senão pela matéria individual, permanece una em razão, embora seja múltipla na existência.
Por isso, Aristóteles diz que “a substância segunda é a que se diz das primeiras”, indicando que o universal depende do singular quanto ao ser, mas é anterior quanto ao conhecer.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a essência comum é, de fato, fundamento tanto do gênero quanto da espécie; mas enquanto considerada na ordem da predicação, é chamada substância segunda sob o nome de gênero ou espécie.
  2. À segunda, responde-se que, embora o gênero e a espécie sejam noções lógicas, têm fundamento real na essência comum das coisas. Logo, a substância segunda não é mera ficção, mas uma abstração fundada no ser.
  3. À terceira, deve-se dizer que o gênero e a espécie, enquanto se dizem de muitos, não são substâncias “segundo o modo de existir”, mas “segundo o modo de significar”. São substâncias porque significam o que é em si, ainda que se predique de outros.
  4. À quarta, responde-se que a natureza comum é real nas coisas, mas universal só no intelecto. O nome “substância segunda” refere-se, pois, a essa mesma natureza enquanto universalizada pelo entendimento, o que se exprime sob as noções de espécie e gênero.

Conclusão.

A substância segunda é a espécie e o gênero, segundo o duplo modo da universalidade:
— espécie, em relação aos indivíduos;
— gênero, em relação às espécies subordinadas.

Por isso, Alberto conclui:
“Substantia secunda est genus et species secundum diversos gradus universalitatis, utrumque tamen significat naturam rei subsistentis.”
A substância segunda é gênero e espécie segundo diversos graus de universalidade, mas ambos significam a natureza da coisa subsistente.

Quaestio V — Utrum substantia sit causa essendi aliis

(Se a substância é causa do ser para as outras coisas)

Objeções.

  1. Parece que a substância não é causa do ser para as outras coisas, pois o ser é comum a tudo o que existe, e não parece provir mais da substância do que do acidente. Com efeito, cada acidente também tem o seu próprio modo de ser. Logo, não é próprio da substância causar o ser dos outros.
  2. Além disso, aquilo que é causa do ser em outro deve ter o ser por si mesmo, e de modo perfeito. Mas somente Deus tem o ser por si e absolutamente. Logo, somente Deus é causa do ser para os outros, e não a substância criada.
  3. Ademais, segundo Aristóteles, “a substância não se encontra nas categorias do relativo”. Ora, ser causa pertence ao relativo, pois implica uma relação de causa e efeito. Logo, a substância, enquanto tal, não pode ser dita causa do ser para as outras coisas.
  4. Ainda, se a substância fosse causa do ser para os acidentes, então, destruída a substância, cessaria todo acidente. Mas Aristóteles ensina que certos acidentes podem subsistir na imaginação mesmo quando o sujeito é removido, como a cor percebida na mente. Logo, a substância não é causa do ser dos acidentes senão acidentalmente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VII da Metafísica, diz:
“Substantia est causa essendi omnibus aliis.”
A substância é causa do ser para todas as outras coisas.

E o Filósofo acrescenta que os acidentes não podem existir sem o sujeito substancial, do qual recebem o fundamento do ser. Logo, a substância é causa do ser para o que está nela.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a substância é causa do ser para as outras coisas de dois modos:

  1. Per se et formaliter, enquanto contém o ser de modo essencial;
  2. Per accidens et materialiter, enquanto é o sujeito no qual os acidentes existem.

No primeiro sentido, a substância é dita causa do ser porque é id quod habet esse in se, o que tem o ser em si e por si. O acidente, ao contrário, tem o ser in alio, isto é, depende de outro para subsistir.

A substância é, portanto, o fundamento ontológico do ser de todos os demais entes no mesmo gênero, e o princípio do ser segundo a natureza da coisa.

Com efeito, tudo o que se predica de uma coisa, predica-se porque há uma substância que suporta tais predicados. A brancura é dita “ser branca” somente porque existe uma substância branca. O ser da brancura é dependente do ser do sujeito branco.

Daí Aristóteles dizer que “substantia est prima in esse”, a substância é a primeira no ser, porque nela se encontra o ser de modo próprio e absoluto, enquanto nos acidentes há o ser apenas por participação.

Além disso, entre as substâncias há também ordem de causalidade:
— Deus é causa do ser de todas as substâncias criadas;
— a substância criada é causa do ser dos seus acidentes;
— a forma substancial é causa do ser da matéria, enquanto a atualiza;
— o composto é causa do ser do conjunto de acidentes que dele dependem.

Assim, em cada nível do ser, a substância exerce causalidade do ser sobre o que dela procede.

Por conseguinte, diz Alberto:
“Substantia dicitur causa essendi aliis, quia ab ea dependet esse accidentium et eorum quae sunt in ea.”
A substância é chamada causa do ser para os outros porque deles depende o ser dos acidentes e de tudo o que está nela.

No entanto, a substância não é causa eficiente do ser no sentido de o produzir a partir do nada — isso compete apenas a Deus —, mas é causa formal e material, como fundamento e sujeito no qual o ser é comunicado.

E porque o ser é participado de modo diverso segundo os graus de perfeição, a substância, estando mais próxima do ser puro, comunica-o às realidades inferiores que nela se apoiam.

Por isso, Aristóteles e os comentadores dizem que “ens dicitur primum de substantia et secundum de accidentibus”, o ser se diz primeiro da substância e só depois dos acidentes.

Logo, toda predicação de ser nos acidentes é analógica e dependente da substância como causa.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o ser, embora comum a tudo, é recebido diversamente segundo os modos de cada natureza. Os acidentes têm o ser de modo dependente, a substância de modo independente. Por isso, a substância é dita causa do ser dos acidentes, não quanto ao ato do ser em si, mas quanto ao modo pelo qual os acidentes o recebem.
  2. À segunda, responde-se que somente Deus é causa eficiente universal do ser, mas a substância criada pode ser causa instrumental ou formal, comunicando o ser aos acidentes, como a forma comunica o ser à matéria.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora “ser causa” seja relação, a substância pode ser dita causa não enquanto entra na categoria do relativo, mas enquanto é fundamento de onde a relação procede. Assim, a substância é princípio, não termo de relação.
  4. À quarta, responde-se que os acidentes não podem subsistir realmente sem a substância, mas podem permanecer intencionalmente no intelecto ou na imaginação. Contudo, no ser real, cessando a substância, cessam os acidentes.

Conclusão.

A substância é causa do ser para as outras coisas, porque é o fundamento e o sujeito no qual os acidentes existem, e o primeiro no qual o ser se encontra de modo pleno.

Assim, Alberto conclui:
“Substantia est causa essendi aliis, quia ipsa habet esse per se, et alia habent esse per participationem ipsius.”
A substância é causa do ser para os outros porque ela tem o ser por si, e os outros o têm por participação dela.

Quaestio VI — Utrum essentia et substantia differant

(Se essência e substância diferem)

Objeções.

  1. Parece que a essência e a substância diferem. Pois a essência é aquilo pelo qual uma coisa é o que é, enquanto a substância é aquilo que existe por si. Ora, o que constitui a razão de uma coisa e o que constitui seu existir parecem ser distintos. Logo, essência e substância não são o mesmo.
  2. Além disso, a essência é dita como universal, pois pode ser concebida em muitos, ao passo que a substância é dita como singular e individual. Mas o universal e o singular são opostos. Logo, essência e substância diferem.
  3. Ademais, segundo Avicena, a essência é indiferente ao ser, podendo existir tanto nas coisas quanto apenas no intelecto, mas a substância é aquilo que existe na realidade. Logo, essência e substância não são idênticas, pois uma é concebida abstratamente e a outra concretamente.
  4. Ainda, toda definição é feita segundo a essência, e toda definição é universal. Ora, a substância é particular em seu existir, como “este homem”. Logo, essência e substância não se identificam, mas se distinguem pelo modo de consideração.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles diz no Livro VII da Metafísica:
“Substantia est id quod est ens per se, et hoc est quod significatur per definitionem, id est per essentiam.”
E Alberto comenta:
“Substantia et essentia idem sunt secundum rem, sed differunt secundum rationem.”
Logo, essência e substância não diferem quanto à coisa, mas somente quanto à razão de inteligir.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência e a substância são uma só e mesma realidade, mas diferem segundo o modo de significar e segundo a razão pela qual o intelecto as considera.

Com efeito, “substância” significa o ente que subsiste por si (per se existens), e “essência” significa aquilo pelo qual algo é o que é (id per quod res est id quod est).
Trata-se, portanto, de distinção de razão e não de realidade.

Na coisa, há uma só realidade: aquilo que tem ser em si é o mesmo que aquilo cuja essência o define.
No entanto, o intelecto pode considerar essa mesma realidade de dois modos:
— como subsistente e existente por si (substantia);
— como princípio formal pelo qual a coisa é o que é (essentia).

Assim, a essência é considerada em ordem à definição e à inteligibilidade, e a substância em ordem à existência e à subsistência.

Por exemplo: o homem é uma substância enquanto existe como “este homem”, mas é uma essência enquanto se considera “o que é o homem”, isto é, “animal racional”.
É a mesma natureza, porém vista sob aspectos diversos.

A diferença entre ambos os termos nasceu da dupla via do conhecimento humano:
— pelo intelecto, que conhece o quid est (essência);
— pelos sentidos, que apreendem o hoc est (existente).

Daí que, em Deus, onde o ser e o que é são idênticos (ipsum esse subsistens), não há distinção nem de razão entre essência e substância.
Mas nas criaturas, cuja essência é participada e o ser é recebido, há distinção de razão, não de coisa.

Por isso, Alberto explica:
“Essentia dicit rationem quidditatis; substantia dicit modum subsistendi.”
A essência exprime a razão de “quididade”; a substância exprime o modo de subsistir.

A essência é, portanto, a forma inteligível do ser, enquanto a substância é o sujeito existente dessa forma.
A essência, por si, pode ser conhecida sem referência ao ser atual; a substância, não.

Contudo, como ambas se referem ao mesmo fundamento real, Aristóteles diz que “a substância é o que se significa pela definição”, isto é, pela essência.
Assim, toda essência substancial é uma substância em potência de existir, e toda substância existente é uma essência em ato de ser.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o “aquilo pelo qual algo é” e o “aquilo que é” não são dois entes distintos, mas duas noções da mesma realidade. A essência é o princípio formal, a substância o ente subsistente que resulta desse princípio.
  2. À segunda, responde-se que a essência é universal quanto à concepção, mas singular quanto à existência. O universalidade da essência provém da abstração do intelecto, não da realidade mesma.
  3. À terceira, deve-se dizer que Avicena distingue a essência “segundo a consideração do intelecto” e “segundo o ser real”. No primeiro sentido, pode ser pensada sem existir; no segundo, é idêntica à substância.
  4. À quarta, responde-se que a definição é universal quanto ao modo de conhecer, mas aquilo que ela define é individual quanto ao ser. Assim, o que é definido (essentia) é o mesmo que o que subsiste (substantia), embora concebido sob razão diversa.

Conclusão.

A essência e a substância não diferem quanto à realidade, mas apenas quanto ao modo de inteligir.
A essência é a natureza enquanto inteligida; a substância é a mesma natureza enquanto subsistente.

Por isso, Alberto conclui:
“Essentia et substantia unum sunt secundum rem; differunt solum secundum rationem considerationis.”
Essência e substância são uma só coisa segundo a realidade, diferindo apenas segundo o modo de consideração.

Quaestio VII — Utrum essentia sit forma vel compositum

(Se a essência é forma ou composto)

Objeções.

  1. Parece que a essência é a forma somente, e não o composto. Pois Aristóteles diz que “a forma é o que faz com que a coisa seja o que é” (Metaph., VII, c. 7). Ora, a essência é aquilo pelo qual uma coisa é o que é. Logo, a essência é a forma, e não o composto.
  2. Além disso, a essência é o princípio de inteligibilidade, e somente a forma é princípio de inteligibilidade, pois a matéria é indeterminada e inapreensível pela razão. Logo, a essência não pode ser o composto, mas apenas a forma.
  3. Ademais, aquilo que é universal é abstraído da matéria, e a essência é universal. Ora, o composto não pode ser universal, porque é singular e concreto. Logo, a essência é a forma, não o composto.
  4. Ainda, nas substâncias separadas não há matéria, e todavia nelas há essência. Logo, a essência não depende do composto, mas se identifica com a forma.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no mesmo livro, ensina:
“Essentia est id quod significatur per definitionem, et definitio significat hoc aliquid compositum.”
A essência é aquilo que se significa pela definição, e a definição significa algo composto.

Logo, a essência não é apenas a forma, mas o composto de matéria e forma.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência se identifica com o composto nas substâncias materiais, mas com a forma nas substâncias imateriais.

Com efeito, a essência é aquilo pelo qual a coisa é o que é (id quo res est quod est).
Ora, nas substâncias materiais, o que existe é o composto de matéria e forma; portanto, a essência dessas substâncias deve incluir ambos, ainda que de modo diverso.

A forma é o princípio formal do ser;
a matéria é o princípio potencial e receptivo;
o composto é o ente completo, que subsiste.

Assim, a essência é a síntese inteligível do que constitui a realidade da coisa, e, portanto, inclui tanto a forma quanto a matéria enquanto esta é ordenada à forma.

Diz Alberto:
“In substantiis materialibus essentia est compositum, quia includit formam et materiam ut partes rei completæ; sed in substantiis separatis essentia est forma tantum.”
Nas substâncias materiais, a essência é o composto, porque inclui a forma e a matéria como partes da coisa completa; nas separadas, a essência é apenas a forma.

Logo, a essência se diz em dois modos:

  1. Formaliter, enquanto exprime a natureza pela qual a coisa é inteligida — e então parece coincidir com a forma;
  2. Re formaliter, enquanto exprime a totalidade do ser que subsiste — e então inclui o composto.

A essência, portanto, é aquilo que se define, e toda definição implica referência ao composto, mesmo quando a definição é da forma, pois a forma, como princípio, é sempre a forma de algo.

Por isso, Aristóteles observa que “a definição do círculo não é da matéria sensível, mas é da matéria inteligida” — mostrando que, mesmo quando se abstrai da matéria física, há sempre um composto inteligível, pois toda forma implica potência correlata.

Nas substâncias imateriais, como as inteligências e Deus, não há composição de matéria e forma, mas ainda assim há composição entre essência e ser (exceto em Deus). Nelas, a essência coincide com a forma porque são puramente formais.

Em suma, a essência é sempre “aquilo pelo qual a coisa é o que é”, mas o que é considerado “a coisa” varia conforme a natureza:
— nas substâncias compostas, é o composto;
— nas separadas, é a forma.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a forma é princípio da essência, mas não a essência toda. A essência inclui a forma enquanto atualiza a matéria; por isso, é dito que a essência é o composto.
  2. À segunda, responde-se que a forma é princípio de inteligibilidade, mas a inteligibilidade da essência não exclui a matéria enquanto ordenada à forma. A matéria pura é inapreensível, mas a matéria determinada é incluída na essência da coisa composta.
  3. À terceira, deve-se dizer que o universal é abstraído da matéria individual, não da matéria comum. A essência é universal não porque exclui toda matéria, mas porque abstrai as condições individuais da matéria.
  4. À quarta, responde-se que, nas substâncias separadas, a essência é a forma, porque nelas não há matéria. A definição da essência, portanto, é variável conforme o modo de ser da coisa definida.

Conclusão.

A essência é forma nas substâncias imateriais e composto nas substâncias materiais.
Nas substâncias compostas, inclui a matéria e a forma como princípios constitutivos da coisa; nas separadas, coincide com a forma pura.

Por isso, Alberto conclui:
“Essentia est forma in substantiis immaterialibus, compositum in materialibus, quia semper dicit totum id quo res est quod est.”
A essência é forma nas substâncias imateriais e composto nas materiais, porque sempre exprime o todo pelo qual a coisa é o que é.

Quaestio VIII — Utrum essentia sit eadem in omnibus individuis speciei

(Se a essência é a mesma em todos os indivíduos de uma espécie)

Objeções.

  1. Parece que a essência é absolutamente a mesma em todos os indivíduos da mesma espécie. Pois a espécie é uma pela identidade da essência em muitos. Ora, se a essência não fosse a mesma, não haveria verdadeira unidade específica. Logo, a essência deve ser numericamente idêntica em todos os indivíduos.
  2. Além disso, o intelecto, ao abstrair o universal, o faz a partir de muitos indivíduos, e esse universal é uma e a mesma natureza comum a todos. Ora, o intelecto não pode abstrair aquilo que não é realmente comum. Logo, a essência é realmente a mesma em todos os indivíduos.
  3. Ademais, segundo Aristóteles, “as coisas que se dizem segundo a espécie são uma na forma e diferem pela matéria”. Mas a essência, enquanto princípio formal, é o que constitui a espécie. Logo, a essência é absolutamente a mesma em todos os indivíduos, e só a matéria os distingue.
  4. Ainda, toda diferença numérica provém da matéria. Ora, a essência, enquanto abstraída da matéria, é a forma. Logo, naquilo que é considerado segundo a essência, não há distinção entre os indivíduos da mesma espécie.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VII da Metafísica, diz:
“In his quae sunt in materia, unumquodque est tale propter materiam; species autem non est una numero in his.”
Nas coisas que estão na matéria, cada uma é tal por causa da matéria; a espécie, porém, não é uma em número nelas.

Logo, a essência é a mesma quanto à espécie, mas não quanto ao número.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência é a mesma em todos os indivíduos quanto à espécie, mas não quanto ao número.

Com efeito, a essência, enquanto natureza comum, é abstraída das condições individuais e materiais; por isso, é idêntica quanto à definição e quanto à forma.
No entanto, quando considerada segundo o ser existente em cada indivíduo, ela é multiplicada segundo a divisão da matéria.

Assim, há duas maneiras de considerar a essência:

  1. Secundum rationem, enquanto natureza comum, que é una em definição e inteligibilidade — e, sob esse aspecto, é a mesma em todos os indivíduos da espécie;
  2. Secundum esse, enquanto existente na matéria individual — e, sob esse aspecto, difere numericamente, porque cada indivíduo possui o ser próprio e distinto.

Portanto, a essência é una em espécie, mas múltipla em número.
Em espécie, porque a forma e a definição são as mesmas;
em número, porque a matéria, princípio de individuação, é diversa.

Por isso, Alberto ensina:
“Essentia est eadem secundum rationem, sed multiplicatur secundum esse propter materiam.”
A essência é a mesma segundo a razão, mas multiplica-se segundo o ser, por causa da matéria.

E isso se confirma pela comparação com a ciência e a realidade:
— no intelecto, há uma única natureza comum, abstraída e universal;
— na realidade, essa mesma natureza é recebida em diversas matérias e, por isso, numericamente distinta.

Assim como a arte do ferreiro é uma só quanto à espécie, mas múltipla quanto aos instrumentos que a exercem, assim também a essência é uma só quanto à definição, mas múltipla segundo os indivíduos nos quais se concretiza.

Logo, quando dizemos que “a essência do homem é a mesma em Sócrates e Platão”, dizemos a verdade quanto à espécie, mas não quanto ao número: porque há uma só definição de homem, mas dois seres distintos que a realizam.

Em Deus, todavia, a essência e o ser são idênticos; por isso, não há multiplicação possível.
Nas criaturas compostas, a essência é realmente distinta do ser, e assim é capaz de multiplicação.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a unidade específica não requer identidade numérica da essência, mas apenas semelhança perfeita quanto à forma. A essência é a mesma secundum speciem, não secundum numerum.
  2. À segunda, responde-se que o intelecto abstrai a natureza comum, não enquanto numericamente idêntica, mas enquanto idêntica segundo a definição. A abstração não suprime a multiplicidade material, mas apenas a ignora.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora a forma seja a mesma em razão, não é a mesma em existência, porque cada indivíduo possui sua própria forma materialmente individuada.
  4. À quarta, responde-se que a distinção numérica provém da matéria, mas essa matéria é inseparável da existência dos entes compostos. Logo, a essência, enquanto existente, é necessariamente múltipla.

Conclusão.

A essência é a mesma em todos os indivíduos quanto à espécie, mas diversa quanto ao número.
É uma pela definição e pela forma, mas múltipla segundo o ser recebido em matérias diversas.

Por isso, Alberto conclui:
“Essentia est una secundum rationem speciei, sed diversa secundum numerum individui.”
A essência é una segundo a razão da espécie, mas diversa segundo o número do indivíduo.

Quaestio IX — Utrum essentia habeat esse reale in rebus

(Se a essência tem ser real nas coisas)

Objeções.

  1. Parece que a essência não tem ser real nas coisas, mas apenas no intelecto. Pois Aristóteles diz, no Livro VII da Metafísica, que “a essência é aquilo que se significa pela definição”. Ora, a definição é um ato do intelecto. Logo, a essência existe apenas no intelecto, e não nas coisas.
  2. Além disso, a essência é comum a muitos, e o comum não pode existir senão no pensamento, pois na realidade tudo o que existe é singular. Logo, a essência, sendo comum, não tem ser real, mas apenas intencional.
  3. Ademais, o ser pertence ao composto e não à essência, porque a essência é princípio formal e o ser é ato. Ora, aquilo que é ato do outro não pode existir realmente no mesmo modo que o outro. Logo, a essência, enquanto princípio formal, não tem ser real, mas apenas conceitual.
  4. Ainda, tudo o que é real é individual. Ora, a essência, enquanto tal, é universal. Logo, não é real, mas uma abstração mental derivada das coisas.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles afirma:
“In his quae sunt in materia, essentia est ipsa res.”
Nas coisas que estão na matéria, a essência é a própria coisa.

E Alberto comenta:
“Essentia habet esse reale in re, sed aliud ab esse quod est actus.”
A essência tem ser real na coisa, mas diverso do ser enquanto ato.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência tem ser real nas coisas, mas de modo diverso do ser enquanto ato existencial.

Com efeito, a essência é aquilo pelo qual a coisa é o que é, enquanto o ser é aquilo pelo qual a coisa é existente.
Assim, essência e ser não são dois entes separados, mas dois aspectos do mesmo ente: um, segundo a sua quididade; outro, segundo a sua atualidade.

A essência é real na coisa, porque é o princípio intrínseco pelo qual a coisa é constituída como tal; mas não é real no mesmo sentido que o ato de ser (esse), pois este é uma atualização ulterior da essência.

Diz Alberto:
“Essentia est fundamentum essendi; esse est actus ipsius essentiae.”
A essência é o fundamento do ser; o ser é o ato da própria essência.

Portanto, negar ser real à essência seria negar a própria realidade das coisas compostas, pois nelas o ser é recebido na essência, e esta é o recipiente do ato de ser.

Assim como a potência é real antes de ser atualizada, também a essência é real antes de ser existencialmente atuada.
Ela não é uma ficção do intelecto, mas um princípio real e formal que dá estrutura à coisa.

O erro dos que negam à essência o ser real nasce da confusão entre esse essentiae e esse existentiae.
O primeiro é o ser enquanto inteligível na coisa, fundamento de sua estrutura e definição;
o segundo é o ser enquanto ato de existir no mundo.

No intelecto, a essência existe secundum rationem;
na realidade, existe secundum rem, isto é, como princípio formal que compõe a natureza da coisa.

Assim, diz Alberto:
“In rebus compositis essentia non est aliquid praeter rem, sed est ipsa res secundum quod determinata est ad hoc esse.”
Nas coisas compostas, a essência não é algo fora da coisa, mas é a própria coisa enquanto determinada a este modo de ser.

Logo, há uma tríplice existência da essência:

  1. in re, como forma da coisa, fundamento real do ente;
  2. in anima, como conceito inteligido;
  3. in Deo, como exemplar eterno e causa de todas as essências criadas.

Dessa forma, a essência é real nas coisas criadas, exemplar em Deus e intencional no intelecto humano.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a essência é significada pela definição, mas não se restringe ao intelecto. O intelecto abstrai a essência a partir das coisas, mas o fundamento dessa abstração está nelas mesmas.
  2. À segunda, responde-se que o universal, enquanto universal, existe apenas na mente; mas a essência, enquanto princípio formal, existe realmente nas coisas, embora não com universalidade atual.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora o ser seja ato e a essência potência em relação a ele, a potência real não deixa de ter realidade. Assim, a essência é real enquanto princípio que recebe o ato de ser.
  4. À quarta, responde-se que a essência é universal segundo a razão, mas individual segundo a existência. O universal é um modo de conhecer; a essência é um modo de ser.

Conclusão.

A essência tem ser real nas coisas, não apenas no intelecto, mas como princípio formal que constitui a natureza dos entes.
É o que faz com que as coisas sejam o que são, antes de receberem o ato de existir.

Por isso, Alberto conclui:
“Essentia est realis in rebus sicut fundamentum et receptaculum essendi; in intellectu est abstracta; in Deo est causa exemplaris.”
A essência é real nas coisas como fundamento e receptáculo do ser; no intelecto é abstraída; em Deus é causa exemplar.

Quaestio X — Utrum esse sit aliud ab essentia

(Se o ser é distinto da essência)

Objeções.

  1. Parece que o ser não é distinto da essência, pois Aristóteles diz que “o ser é aquilo que se diz em todas as categorias” e que “a essência é o que é significada por cada uma delas”. Ora, o que se diz em todas é o mesmo que aquilo que se significa nelas. Logo, o ser e a essência não se distinguem.
  2. Além disso, o que não se distingue na realidade não deve ser distinguido pela razão. Ora, o ser e a essência são inseparáveis na coisa: não há essência sem ser, nem ser sem essência. Logo, não são distintos.
  3. Ademais, toda distinção real implica composição. Ora, o ser é ato puríssimo, e a essência é aquilo pelo qual a coisa é o que é. Se houvesse distinção real entre ambos, haveria composição no próprio ato de ser, o que é impossível.
  4. Ainda, segundo Avicena, “o ser é o necessário da essência”. Ora, o necessário não é algo além daquilo a que pertence, mas é sua própria atualidade. Logo, o ser não é algo distinto da essência, mas é a essência enquanto realizada.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VII da Metafísica, ensina:
“Esse et quod est sunt diversa: unum enim significat actum, aliud id cui accidit actus.”
O ser e aquilo que é são diversos: um significa o ato, o outro aquilo a que o ato pertence.

E Alberto acrescenta:
“Esse est actus essentiae, et ideo aliud est ab ea realiter.”
O ser é o ato da essência, e por isso é realmente distinto dela.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o ser e a essência são realmente distintos em todos os entes criados, mas idênticos somente em Deus.

Com efeito, em toda criatura há uma composição fundamental entre aquilo que é (quod est) e o ser pelo qual é (quo est).
A essência é o que determina o ente a ser tal coisa;
o ser é aquilo pelo qual essa essência está em ato e existe.

A essência é, portanto, potência em relação ao ser; o ser é o ato da essência.
Essa distinção é real, porque uma pode ser concebida sem a outra:
— a essência pode ser inteligida sem referência ao ato de existir (por exemplo, a natureza humana);
— o ser, por si, não implica nenhuma essência determinada (por exemplo, o ser enquanto ser é comum a tudo).

Assim, há entre ambos a mesma relação que há entre potência e ato.

Diz Alberto:
“Essentia est id quod recipit esse; esse est actus quo essentia completur in re.”
A essência é aquilo que recebe o ser; o ser é o ato pelo qual a essência se completa na realidade.

Logo, o ser é participado pela essência. E essa participação é a medida da contingência e da dependência de toda criatura.
Somente Deus é ipsum esse subsistens, o próprio ser subsistente, no qual não há distinção entre o que é e o ser.
Nas criaturas, o ser é recebido de outro, e, portanto, distinto daquilo que o recebe.

Essa distinção é também necessária para explicar a causalidade divina: se o ser não fosse distinto da essência, nenhuma coisa dependeria de outra para existir, e toda essência seria necessária por si — o que é falso.

Além disso, se o ser e a essência fossem idênticos nas criaturas, todas as essências existiriam eternamente, o que contradiz a experiência e a doutrina da criação.

Portanto, em toda criatura o ser é ato participado, e a essência é sujeito receptor desse ato.

Em Deus, porém, o ser e a essência são um só e mesmo ato, simples e absoluto, porque Ele é o próprio ser.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que Aristóteles fala do ser enquanto se diz em todas as categorias, ou seja, do ser predicamental, não do ser metafísico. Esse ser categorial se refere ao ente já constituído, e não ao ato de existir que é o fundamento de todos.
  2. À segunda, responde-se que a inseparabilidade do ser e da essência não implica identidade real, mas união necessária. A forma e o ser são inseparáveis no composto, e todavia distintos em realidade.
  3. À terceira, deve-se dizer que a composição que resulta da distinção de ser e essência não destrói a simplicidade do ato de ser, mas se refere à limitação do recipiente. O ato é simples, mas a potência que o recebe é limitada.
  4. À quarta, responde-se que Avicena chama “necessário da essência” ao ser enquanto lhe compete segundo a ordem da existência, mas não quanto à identidade real. Mesmo para Avicena, o ser é acrescentado à essência como ato a uma potência.

Conclusão.

O ser é realmente distinto da essência em todos os entes criados, pois é o ato pelo qual a essência existe.
Na essência está a possibilidade de ser; no ser, a atualização dessa possibilidade.
Somente em Deus o ser e a essência são idênticos, pois Ele é o próprio ser subsistente.

Por isso, Alberto conclui:
“In creaturis aliud est esse et essentia; in Deo autem idem, quia ipse est esse suum.”
Nas criaturas, o ser é distinto da essência; em Deus, é o mesmo, porque Ele é o seu próprio ser.

Quaestio XI — Utrum esse sit actus essentiae

(Se o ser é o ato da essência)

Objeções.

  1. Parece que o ser não é o ato da essência. Pois o ato é aquilo que procede de um princípio e move à perfeição. Ora, a essência não é princípio do ser, mas antes o ser parece anterior a ela, já que sem o ser nada poderia existir. Logo, o ser não é ato da essência, mas a essência é ato do ser.
  2. Além disso, o ato e a potência estão no mesmo gênero. Ora, o ser não pertence a um gênero, pois, como ensina Aristóteles, “o ser não é um gênero, mas o mais comum de todos os predicados”. Logo, o ser não pode ser ato da essência, que pertence a um gênero.
  3. Ademais, o ato é determinado pela potência que atualiza. Ora, o ser é o mais indeterminado de todos, enquanto a essência é determinada. Logo, o ser não é ato da essência, mas o inverso: a essência determina o ser.
  4. Ainda, segundo Avicena, “a essência é o que é necessário para que algo seja o que é”. Ora, o ser não acrescenta à essência nenhuma determinação essencial, mas apenas a faz existir. Logo, não é ato da essência, mas simples concomitante de sua existência.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles diz:
“Esse est actus entis, sicut vivere est actus viventis.”
O ser é o ato do ente, assim como viver é o ato do vivente.

E Alberto comenta:
“Esse est perfectio omnium actuum et actus essendi.”
O ser é a perfeição de todos os atos e o ato do ser.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o ser é propriamente o ato da essência, e este é o mais íntimo e profundo de todos os atos.

Com efeito, todo ente composto de potência e ato exige um princípio pelo qual sua potência se atualize.
A essência, enquanto tal, é potência em relação ao ser, e o ser é ato em relação à essência.

Pois a essência significa o que a coisa é (quid est), e o ser significa que a coisa é (quia est).
Logo, a essência é potência de existir, e o ser é a atualização dessa potência.

Assim, a relação entre essência e ser é a mais fundamental de todas as relações de ato e potência.
A forma atualiza a matéria; o ser atualiza a essência.
Sem o ser, a essência seria pura possibilidade; com o ser, ela se torna ente em ato.

Diz Alberto:
“Esse est actus essentiae, sicut forma est actus materiae, quia complet quod erat in potentia.”
O ser é ato da essência, assim como a forma é ato da matéria, porque completa aquilo que estava em potência.

Por isso, a composição de essência e ser é o fundamento ontológico de todas as outras composições na criatura.
Na medida em que a essência participa do ser, existe; e na medida em que o ser é participado, é limitado pela essência.

Assim, o ser é ato universal e ilimitado, enquanto a essência é potência delimitadora que o recebe e determina.
O ser é comparado à luz; a essência, ao corpo transparente que a recebe conforme sua capacidade.

Logo, todo ente finito é composto de uma essência receptiva e de um ser participado.
Essa composição explica a contingência e a dependência do ente criado.

Em Deus, porém, não há tal composição, pois n’Ele o ser e a essência são idênticos; Ele é actus purus — ato puro — sem potência.
Em tudo o que é criado, ao contrário, há distinção real, e o ser é o ato pelo qual a essência é algo no real.

Diz ainda Alberto:
“Esse est actus intimus et perfectissimus, quia dat esse omnibus actibus; et ideo in eo consistit actualitas totius entis.”
O ser é o ato mais íntimo e perfeito, porque dá ser a todos os atos; por isso, nele consiste a atualidade de todo ente.

O ser é, portanto, o fundamento da perfeição de todas as formas e potências.
Nada é ato senão pelo ser; nada é forma senão na medida em que participa do ser.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o ser não procede da essência como de uma causa eficiente, mas como ato que a completa. A essência não é anterior ao ser na ordem do tempo ou da produção, mas na ordem de natureza, como potência ao ato.
  2. À segunda, responde-se que, embora o ser não pertença a um gênero, ele é ato de todos os gêneros, porque fundamenta a atualidade de todos. Assim, a objeção procede de confusão entre “ser como gênero lógico” e “ser como ato metafísico”.
  3. À terceira, deve-se dizer que o ser é indeterminado apenas quanto ao conteúdo conceitual, mas determinadíssimo quanto ao ato, porque é a atualização de todas as determinações. A essência, ao recebê-lo, não o determina como ato, mas como participação finita.
  4. À quarta, responde-se que Avicena fala do ser como consequência necessária da essência apenas segundo o intelecto divino, no qual a existência é dada por criação. No ente criado, porém, o ser é recebido como ato na essência, e, portanto, é sua perfeição.

Conclusão.

O ser é o ato da essência, e o ato mais íntimo e perfeito, porque confere à essência a atualidade do existir.
Sem o ser, a essência é pura possibilidade; com o ser, é realidade subsistente.

Por isso, Alberto conclui:
“Esse est actus et perfectio essentiae; et sicut forma dat esse materiae, sic esse dat esse essentiae.”
O ser é ato e perfeição da essência; e assim como a forma dá o ser à matéria, o ser dá o ser à essência.

Quaestio XII — Utrum essentia sit potentia respectu esse

(Se a essência é potência em relação ao ser)

Objeções.

  1. Parece que a essência não é potência em relação ao ser, pois a potência é princípio de movimento ou de mudança, como ensina Aristóteles no Livro IX da Metafísica. Ora, a essência, enquanto tal, não se move nem muda, mas é aquilo pelo qual a coisa é o que é. Logo, não é potência em relação ao ser.
  2. Além disso, a potência é sempre inferior ao ato e depende dele. Ora, a essência é aquilo que confere à coisa sua determinação própria e, portanto, parece mais nobre do que o ser enquanto simples ato. Logo, não pode ser potência em relação ao ser, mas antes o ser depende da essência.
  3. Ademais, a potência está para o ato como o imperfeito para o perfeito. Ora, a essência, considerada em si mesma, é perfeita na ordem da definição. Logo, não é potência em relação ao ser, que é apenas sua realização existencial.
  4. Ainda, em Deus não há potência alguma, mas pura atualidade. Ora, Deus tem essência e ser. Logo, a essência não é potência em relação ao ser, pois em Deus há essência sem potência.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles afirma:
“Omnis forma est potentia respectu actus, nisi in eo quod est actus purus.”
Toda forma é potência em relação ao ato, exceto naquilo que é ato puro.

E Alberto acrescenta:
“Essentia est potentia respectu esse, sicut materia respectu formae.”
A essência é potência em relação ao ser, assim como a matéria em relação à forma.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência é potência em relação ao ser, e isto de modo análogo à relação entre matéria e forma, porém mais profundamente, pois trata-se da composição metafísica mais íntima de todo ente criado.

Com efeito, em toda criatura há uma dupla composição:
— a primeira, entre matéria e forma, que constitui a substância;
— a segunda, entre essência e ser, que constitui o ente.

Na primeira composição, a forma é o ato da matéria;
na segunda, o ser é o ato da essência.
Assim, a essência está para o ser como a potência está para o ato.

A essência, enquanto “quididade”, significa o que uma coisa é, mas ainda não implica que ela exista.
Ela é, por assim dizer, uma potência de existir, um princípio receptivo do ato de ser.

Diz Alberto:
“Essentia est receptiva essendi, et ideo habet rationem potentiae ad ipsum.”
A essência é receptiva do ser, e por isso tem razão de potência em relação a ele.

Essa potência, porém, não é potência passiva no sentido físico, como a matéria que é movida, mas uma potência metafísica e formal, pela qual a essência se abre à recepção do ato de ser.

Deus, que é actus purus, não possui essa composição, pois n’Ele a essência e o ser são idênticos.
Mas toda criatura, sendo participante do ser, o recebe segundo a capacidade da sua essência.
Por isso, o ser é o ato que a essência não contém em si, mas que a perfaz.

Dessa relação procede toda limitação no ente criado:
quanto mais determinada e restrita é a essência, tanto mais limitado é o ser que ela participa.
Assim, a essência humana participa do ser finito próprio à sua natureza racional; a essência angélica participa do ser mais puro; e a essência divina é o próprio ser.

A essência é, portanto, potência ontológica, não no sentido de carência, mas de receptividade ordenada à atualização existencial.
O ser, por sua vez, é ato ontológico, conferindo à essência sua perfeição última e tornando-a ente em ato.

Diz ainda Alberto:
“Esse complet essentiam sicut lumen complet diaphanum.”
O ser completa a essência assim como a luz completa o transparente.

E como a potência é medida e determinada pelo ato que a atualiza, assim também toda essência é limitada pelo modo de ser que recebe.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a potência de que se fala aqui não é princípio de movimento, mas de recepção. A essência não muda, mas recebe o ser que a atualiza. É potência em sentido metafísico, não físico.
  2. À segunda, responde-se que a essência é nobre quanto à quididade, mas o ser é nobre quanto à atualidade. E como o ato é superior à potência, o ser é mais nobre que a essência, porque a realiza.
  3. À terceira, deve-se dizer que a essência é perfeita quanto à definição, mas imperfeita quanto à existência. O ser é a perfeição suprema que lhe falta e que a torna real.
  4. À quarta, responde-se que em Deus não há distinção entre essência e ser, e, portanto, não há potência. Mas nas criaturas, nas quais o ser é recebido, a essência é potência em relação ao ser.

Conclusão.

A essência é potência em relação ao ser, porque é o princípio receptivo que se atualiza pela participação do ato de existir.
Essa relação é a mais fundamental de toda a metafísica, sendo a raiz da contingência e da dependência das criaturas em relação ao Ser primeiro.

Por isso, Alberto conclui:
“Essentia est potentia respectu esse, quia est susceptiva ipsius actus essendi; et hoc est in omni creatura, non in Deo.”
A essência é potência em relação ao ser, porque é suscetível do ato de ser; e isso se verifica em toda criatura, mas não em Deus.

Quaestio XIII — Utrum compositio essentiae et esse sit realis vel rationis tantum

(Se a composição de essência e ser é real ou apenas de razão)

Objeções.

  1. Parece que a composição de essência e ser é apenas de razão, pois tudo o que é um em realidade não se compõe senão segundo o modo como o intelecto o considera. Ora, a essência e o ser não podem ser separados na coisa real — pois nada pode existir sem ser, nem ser sem essência. Logo, a composição entre ambos é apenas lógica, e não real.
  2. Além disso, a distinção real requer diversidade de princípios constitutivos. Ora, o ser não acrescenta algo realmente distinto à essência, mas apenas o ato de existir. Logo, a diferença é apenas segundo a razão.
  3. Ademais, o que é participado não difere realmente do que participa, senão segundo o modo de participação. Ora, o ser é participado pela essência. Logo, não há real composição entre ambos, mas apenas distinção conceitual.
  4. Ainda, toda composição real exige uma união de partes que, separadas, possam subsistir. Ora, a essência não subsiste sem o ser, nem o ser sem a essência. Logo, não há entre ambos composição real, mas apenas mental.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles ensina:
“Esse et quod est sunt diversa.”
O ser e aquilo que é são diversos.

E Alberto comenta:
“Diversitas illa non est solum rationis, sed rei, quia esse est actus essentiae.”
Essa diversidade não é apenas de razão, mas de realidade, porque o ser é ato da essência.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a composição de essência e ser é real nas criaturas, mas apenas de razão em Deus.

Pois em Deus não há distinção entre o que é (quod est) e o ser (esse), porque Ele é ipsum esse subsistens — o próprio ser subsistente.
Mas em toda criatura há distinção verdadeira entre ambos, e, portanto, composição real.

Com efeito, toda criatura é ente por participação.
Ora, o que participa de algo é realmente distinto daquilo que participa, pois o que é por outro não é idêntico ao que é por si.
A essência criada não é o ser por si mesma, mas o recebe de outro, e assim é potência em relação ao ato de existir.

Diz Alberto:
“Compositio essentiae et esse est realis in creaturis, quia recipitur esse ab alio, et est actus receptus.”
A composição de essência e ser é real nas criaturas, porque o ser é recebido de outro, e é ato recebido.

Tal composição não é de duas coisas completas, como corpo e alma, mas de um princípio potencial e de um princípio atual, cuja união constitui o ente.
O ser é o ato pelo qual a essência se torna realmente existente; a essência é o sujeito que recebe esse ato.

Por isso, embora a distinção possa ser concebida pelo intelecto, ela tem fundamento na própria realidade, e não apenas na mente.
A razão distingue porque há distinção ontológica que ela reconhece, e não porque a inventa.

Em Deus, ao contrário, não há composição, pois n’Ele o ser não é recebido, mas é o próprio ser por essência.
Por isso, a distinção é apenas de razão quanto ao nosso modo de conhecer, e não quanto à coisa.

Assim, em resumo:
— Em Deus, o ser e a essência são um só e mesmo ato simples.
— Nas criaturas, o ser e a essência estão unidos por composição real, pois um é ato e o outro potência.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora a essência e o ser não possam existir separadamente, isso não impede que sejam realmente distintos, assim como a matéria e a forma não se separam, e todavia são distintos na realidade.
  2. À segunda, responde-se que o ser não acrescenta um novo gênero à essência, mas um novo grau de realidade: acrescenta ato àquilo que antes era apenas possibilidade.
  3. À terceira, deve-se dizer que a participação do ser pela essência implica distinção real, pois o participado é ato, e o participante, potência. Logo, há composição real, embora íntima.
  4. À quarta, responde-se que não é necessário que as partes de uma composição real subsistam separadamente; basta que tenham razão diversa na coisa, como a matéria e a forma, ou a potência e o ato. Assim é a essência e o ser.

Conclusão.

A composição de essência e ser é real nas criaturas, mas de razão em Deus.
Toda criatura é composta de uma essência receptiva e de um ser participado;
em Deus, não há distinção, pois Ele é a própria identidade entre o que é e o ser.

Por isso, Alberto conclui:
“In Deo sola ratio distinguit, in creatura res distinguit; unde ibi compositio est realis, hic tantum mentis.”
Em Deus, só a razão distingue; na criatura, é a própria realidade que distingue;
por isso, ali a composição é mental, aqui é real.

Quaestio XIV — Utrum in substantiis separatis sit compositio essentiae et esse

(Se nas substâncias separadas há composição de essência e ser)

Objeções.

  1. Parece que nas substâncias separadas não há composição de essência e ser, pois tudo o que é separado da matéria é ato puro, e, portanto, sem potência. Ora, a essência, enquanto distinta do ser, é potência em relação a ele. Logo, nas substâncias separadas não há distinção real entre essência e ser.
  2. Além disso, toda composição implica composição de partes diversas, que ou são materiais, ou de ato e potência. Ora, as substâncias separadas não têm matéria, e se nelas houvesse potência e ato, já não seriam imateriais. Logo, nelas não há composição de essência e ser.
  3. Ademais, quanto mais perfeita é uma substância, mais se aproxima de Deus, que é ato puro e em quem não há distinção de essência e ser. Ora, as substâncias separadas são as mais perfeitas entre as criaturas. Logo, nelas não há composição de essência e ser, mas identidade simples.
  4. Ainda, Dionísio diz que “as substâncias superiores são mais simples que as inferiores.” Ora, a composição de essência e ser implica certa dualidade. Logo, nas substâncias separadas, que são superiores, tal composição não pode existir.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles ensina:
“Esse et quod est non sunt idem nisi in primo.”
O ser e aquilo que é não são o mesmo senão no primeiro (isto é, em Deus).

E Alberto comenta:
“In substantiis separatis est esse receptum, non per essentiam, sed ab alio.”
Nas substâncias separadas, o ser é recebido, não pela própria essência, mas de outro.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que nas substâncias separadas há composição de essência e ser, mas não de matéria e forma.

Com efeito, as substâncias separadas — isto é, os anjos e inteligências — são compostas não materialmente, mas metafisicamente.
Não há nelas matéria, porque são simples e incorpóreas; mas há nelas uma potência ontológica, a saber, a essência, que recebe o ato do ser.

Assim, ainda que sejam simples quanto à substância, não são simples quanto ao ser; pois o seu ser é recebido e limitado pela essência.
A essência é potência em relação ao ser, e o ser é ato em relação à essência.

Diz Alberto:
“In substantiis separatis est compositio realis inter id quod est et ipsum esse; et haec est causa quod non sint actus puri.”
Nas substâncias separadas há composição real entre aquilo que é e o ser mesmo; e essa é a razão por que não são atos puros.

Pois se nelas não houvesse distinção, seriam idênticas ao próprio Ser subsistente, isto é, a Deus.
Mas porque o seu ser é recebido, dependem da Causa primeira que lhes comunica o ato de existir.

A simplicidade das substâncias separadas não exclui toda composição, mas apenas a composição material.
Elas são simples quanto à estrutura física, compostas quanto à estrutura metafísica.

Em Deus, o ser é idêntico à essência;
nos anjos, o ser é participado e recebido;
nas substâncias corporais, o ser é recebido em uma essência composta de matéria e forma.

Portanto, a gradação da simplicidade é tríplice:
— nos corpos, há composição de matéria, forma, essência e ser;
— nos anjos, de essência e ser;
— em Deus, nenhuma composição.

Assim, mesmo nas substâncias separadas há distinção real entre o que são (quid sunt) e que são (quia sunt).

Por isso, Alberto escreve:
“Esse in eis est finitum per essentiam sicut lumen per diaphanum; et ideo non sunt ipsum esse, sed habent esse.”
O ser nelas é limitado pela essência, assim como a luz é limitada pelo transparente; por isso, não são o próprio ser, mas têm o ser.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que as substâncias separadas não são atos puros, pois embora não tenham matéria, têm potência quanto ao ser, na medida em que o recebem de outro.
  2. À segunda, responde-se que a composição de essência e ser não é de partes materiais, mas de princípios metafísicos: a essência, como potência; o ser, como ato.
  3. À terceira, deve-se dizer que a perfeição das substâncias separadas consiste em estarem mais próximas do ato puro, não em serem ato puro. Assim, nelas ainda há composição, mas mais simples e elevada.
  4. À quarta, responde-se que a simplicidade hierárquica não exclui toda distinção, mas a material e quantitativa; a distinção de essência e ser é compatível com a pureza espiritual.

Conclusão.

Nas substâncias separadas há composição real de essência e ser, embora sem matéria.
Essa composição é o sinal de que todo ser criado, por mais elevado que seja, é participado e dependente do Ser primeiro.
Só em Deus a essência é o próprio ser; em todas as outras substâncias, a essência tem o ser recebido e finito.

Por isso, Alberto conclui:
“In substantiis separatis est compositio essentiae et esse, quia habent esse participatum; in solo Deo est identitas simplicissima, ubi esse est essentia.”
Nas substâncias separadas há composição de essência e ser, porque possuem ser participado; somente em Deus há identidade simplicíssima, onde o ser é a essência.

Quaestio XV — Utrum Deus sit ipsa essentia suum esse

(Se Deus é sua própria essência e ser)

Objeções.

  1. Parece que Deus não é sua própria essência e ser, pois toda essência é aquilo pelo qual algo é, e todo ser é aquilo pelo qual algo existe. Ora, aquilo pelo qual algo é e aquilo que algo é parecem princípios correlatos, e não idênticos. Logo, se Deus é sua essência, não é seu ser; e se é seu ser, não é sua essência.
  2. Além disso, aquilo que é comum a muitos não é idêntico a nenhum em particular. Ora, o ser é comum a todos os entes. Logo, o ser não pode ser idêntico à essência divina, pois isso faria de Deus algo comum e não singular.
  3. Ademais, se Deus fosse o próprio ser, tudo o que participa do ser participaria de Deus segundo a essência, e assim todas as coisas seriam divinas. Mas isto é falso e herético. Logo, Deus não é o próprio ser, mas apenas possui o ser por excelência.
  4. Ainda, toda identidade perfeita exclui relação de causa e efeito. Ora, Deus é causa de todos os seres. Logo, se fosse o próprio ser, não poderia causar o ser em outros.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro XII da Metafísica, afirma:
“In primum movente non est aliud quid est et quod est, sed est ipsum quod est.”
No primeiro motor não há distinção entre o que é e o ser, mas Ele é o próprio ser.

E Alberto comenta:
“Deus est ipsum esse per essentiam, quia esse suum non est receptum, sed subsistens.”
Deus é o próprio ser por essência, porque seu ser não é recebido, mas subsistente.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que Deus é sua própria essência e seu próprio ser, sem distinção real, mas com identidade absoluta e simples.

Com efeito, tudo o que é composto de essência e ser tem o ser recebido de outro, e, portanto, não é o próprio ser, mas algo que tem o ser.
Ora, o primeiro princípio deve ser aquilo que possui o ser de si mesmo e não por outro.
Logo, nele o ser e a essência são o mesmo, pois se fossem distintos, dependeria de outro para existir — o que repugna à natureza do Primeiro.

Diz Alberto:
“In Deo idem est esse et quod est, quia non habet esse ab alio, sed est ipsum esse subsistens.”
Em Deus, o ser e aquilo que é são o mesmo, porque Ele não tem o ser de outro, mas é o próprio ser subsistente.

Assim, o ser divino não é participado, nem recebido, mas é o próprio ato puro de existir.
Nas criaturas, o ser é limitado pela essência e recebido; em Deus, o ser é ilimitado, infinito e idêntico à essência.

A distinção que encontramos entre essência e ser em todas as criaturas provém da composição de potência e ato.
Mas Deus é ato puro, sem qualquer potencialidade; e, por isso, sua essência é sua existência.

Essa verdade é também o fundamento de todos os nomes divinos: quando dizemos que Deus é bom, sábio, justo, dizemos apenas modos diversos do mesmo ser simples, pois em Deus o ser é a raiz de toda perfeição.

E como o ser é o ato de todos os atos e a perfeição de todas as perfeições, segue-se que Deus, sendo o próprio ser, é também a fonte de toda perfeição criada.

Diz ainda Alberto:
“Esse Dei est ipsum intelligere, velle, vivere; et ideo non est aliquid quod participat esse, sed ipsum esse subsistens.”
O ser de Deus é o próprio inteligir, querer e viver; e, por isso, Ele não é algo que participa do ser, mas o próprio ser subsistente.

Assim, em Deus não há distinção entre essência, ser, ato e operação. Tudo é um mesmo e único ato infinito, absoluto e simples.

Por isso, a simplicidade divina não é ausência, mas plenitude: o ser de Deus contém eminenter todas as perfeições dos entes criados.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, nos entes compostos, essência e ser são correlatos e distintos, mas em Deus não há tal correlação, porque Ele é o próprio ser. A essência divina não é aquilo pelo qual Deus é algo, mas é o próprio “ser” enquanto tal.
  2. À segunda, responde-se que o ser é comum apenas enquanto participável, mas em Deus é o ser em sua pureza absoluta, não comunicado a outro senão por analogia de participação. Assim, o ser comum é efeito do ser divino, não sua identidade.
  3. À terceira, deve-se dizer que as criaturas participam do ser divino segundo o modo de suas essências, não segundo a essência divina mesma. Assim, não se tornam divinas, mas entes dependentes daquele que é o próprio ser.
  4. À quarta, responde-se que a causalidade não é impedida pela identidade do ser em Deus, pois Ele comunica o ser não por participação de algo exterior, mas por difusão de seu próprio ato, permanecendo Ele mesmo indiviso e imutável.

Conclusão.

Deus é sua própria essência e ser, sem distinção real nem composição.
Ele é o próprio ser subsistente, ato puro, plenitude do ser e causa universal de tudo o que existe.
Em todas as criaturas há distinção entre essência e ser; em Deus, há identidade perfeita e absoluta.

Por isso, Alberto conclui:
“Deus est ipsum esse subsistens, in quo nullum est aliud ab esse; et ideo est primum et simplex omnium.”
Deus é o próprio ser subsistente, no qual nada é distinto do ser; e por isso é o primeiro e o mais simples de todos.

Quaestio XVI — Utrum esse creatum participet esse divinum

(Se o ser criado participa do ser divino)

Objeções.

  1. Parece que o ser criado não participa do ser divino, pois a participação requer certa semelhança entre o participado e o participante. Ora, entre o ser divino, que é infinito, e o ser criado, que é finito, não há proporção alguma. Logo, o ser criado não pode participar do ser divino.
  2. Além disso, tudo o que participa de algo recebe parte daquilo que participa. Ora, o ser divino é indivisível e simples. Logo, não pode ser participado, pois não pode ser dividido em partes.
  3. Ademais, o que é participado é comum a muitos, mas o ser divino é singular e incomunicável, pois é o próprio Deus. Logo, o ser criado não pode participar dele.
  4. Ainda, aquilo que é participado se multiplica nos participantes. Ora, o ser divino é absolutamente uno e imutável. Logo, não pode haver multiplicação dele nos entes criados; portanto, não é participado.

Em contrário (Sed contra).

O Apóstolo diz:
“In ipso vivimus, movemur et sumus.”
Em Deus vivemos, nos movemos e existimos (At 17,28).

E Alberto comenta:
“Omne esse creatum est participatio primi esse, sicut lumen participatur a sole.”
Todo ser criado é participação do primeiro ser, assim como a luz é participada do sol.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que todo ser criado participa do ser divino, mas de modo analógico e limitado, não por identidade de essência.

Com efeito, o ser é o primeiro e mais universal de todos os atos.
Deus é o próprio ser por essência, ipsum esse subsistens;
as criaturas não são o ser, mas têm o ser por participação.

Ora, aquilo que possui algo participado, o recebe de quem o possui essencialmente.
Logo, o ser criado é recebido do ser divino, que é a sua causa exemplar e eficiente.

Diz Alberto:
“Esse omnium est fluxus a primo esse, quod est Deus; et ideo omne ens est participatio ipsius.”
O ser de todas as coisas é um fluxo do primeiro ser, que é Deus; e, por isso, todo ente é participação dele.

Essa participação, contudo, não é de modo unívoco, como se as criaturas fossem partes do ser divino, mas por analogia de proporcionalidade: o ser criado imita o ser divino conforme sua capacidade finita.

Assim como os raios de luz participam da claridade do sol, sem diminuir a fonte luminosa, assim também o ser de cada criatura é um reflexo limitado do ser absoluto.

E porque o ser divino é o ato puro e infinito, cada ente criado o recebe segundo a medida da sua essência.
Por isso, há graus de ser conforme os graus de perfeição das naturezas:
nos corpos, o ser é participado de modo material e limitado;
nas almas e inteligências, de modo espiritual e mais elevado;
em Deus, o ser é pleno e sem limitação.

Portanto, há uma verdadeira hierarquia ontológica: tudo o que existe é uma participação do Ser primeiro, e essa participação é o vínculo entre o Criador e a criatura.

Diz ainda Alberto:
“Participatio esse est ipsa creatio; et esse creatum non est aliud quam esse participatum.”
A participação do ser é a própria criação; e o ser criado não é outra coisa senão ser participado.

Por conseguinte, a participação não introduz divisão em Deus, porque Ele comunica o ser sem perder nada de Si, assim como o fogo acende outro fogo sem diminuir sua chama.

Assim, Deus é a causa universal do ser, e todas as criaturas são participações diversas de sua plenitude.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora não haja proporção de igualdade entre o ser divino e o ser criado, há proporção de dependência e semelhança analógica. O ser criado imita o ser divino na medida da sua capacidade, não segundo o mesmo grau, mas segundo certa semelhança proporcional.
  2. À segunda, responde-se que a participação não implica divisão material, mas comunicação de perfeição. O ser divino é comunicado sem divisão, assim como a luz é comunicada a muitos lugares permanecendo una.
  3. À terceira, deve-se dizer que o ser divino é incomunicável segundo a essência, mas comunicável segundo o efeito. As criaturas não participam da essência divina, mas da semelhança do ser divino.
  4. À quarta, responde-se que o ser divino não se multiplica em si mesmo, mas nas suas participações finitas. Cada criatura o reflete segundo uma limitação determinada, mas Ele permanece simples e imutável.

Conclusão.

O ser criado participa do ser divino, não por identidade ou divisão, mas por dependência e semelhança analógica.
O ser de todas as coisas é um raio do Ser absoluto, e toda criatura é uma imagem finita do Ato puro.

Por isso, Alberto conclui:
“Esse creatum est participatio primi esse, non per essentiam sed per similitudinem; et hoc est fundamentum omnis ordinis entium.”
O ser criado é participação do primeiro ser, não pela essência, mas pela semelhança; e isso é o fundamento de toda a ordem dos entes.

Quaestio XVII — Utrum essentia creata possit existere sine participatione esse

(Se a essência criada pode existir sem participação do ser)

Objeções.

  1. Parece que a essência criada pode existir sem participação do ser, pois o ser é um ato extrínseco, e a essência é algo intrínseco. Ora, o que é intrínseco pode subsistir sem o que é extrínseco. Logo, a essência criada pode existir sem participação do ser.
  2. Além disso, toda participação pressupõe uma potência receptiva. Ora, as formas separadas são atos puros e não têm potência. Logo, nelas a essência pode existir sem o ser participado.
  3. Ademais, o ser criado é algo recebido, e tudo o que é recebido é limitado. Ora, a essência criada, enquanto essência, é determinada em si mesma, ainda antes de participar do ser. Logo, ela pode existir sem o ser participado, ao menos como quididade distinta.
  4. Ainda, o intelecto pode conceber a essência das coisas sem conceber o seu ser, e o que pode ser concebido sem o ser pode existir sem ele, porque a existência segue a inteligibilidade. Logo, a essência criada pode subsistir sem participação do ser.

Em contrário (Sed contra).

Agostinho diz no De Trinitate:
“In Deo vivere, sapere, esse unum est; in creatura vero aliud est esse, aliud vivere, aliud sapere.”
Em Deus, viver, conhecer e ser são uma só e mesma coisa; mas na criatura, ser é distinto de viver e de conhecer.

E Alberto comenta:
“Essentia creata non potest esse nisi participando esse, quia ipsa est in potentia ad esse.”
A essência criada não pode existir senão participando do ser, porque ela está em potência em relação ao ser.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que nenhuma essência criada pode existir sem participação do ser, pois a essência, enquanto tal, é potência em relação ao ser, e o ser é o ato de toda essência.

Toda criatura, por mais perfeita que seja, tem o seu ser recebido. Ora, o que é recebido é participado, e o que é participado depende de outro para existir.

Assim, a essência criada, enquanto essência, não tem o ser de si mesma, mas somente pela participação do ser que lhe vem do Primeiro Ser.

Diz Alberto:
“Essentia creata est pura potentia respectu esse; et ideo non habet esse nisi per actum ab alio infusum.”
A essência criada é pura potência em relação ao ser; por isso, não tem o ser senão pelo ato infundido de outro.

Com efeito, distinguir essência e ser é próprio do ente criado; unir ambos é próprio de Deus.
Pois em Deus, o ser é a própria essência; nas criaturas, o ser é participado, e a essência é o recipiente desse ato.

Portanto, remover o ser da essência criada é destruir o próprio ente, assim como retirar o ato destrói a potência enquanto existente.

Diz ainda Alberto:
“Sicut materia non potest esse sine forma, ita nec essentia creata sine esse; quia esse est actus eius essentialis.”
Assim como a matéria não pode existir sem a forma, assim também a essência criada não pode existir sem o ser, porque o ser é seu ato essencial.

A distinção que o intelecto faz entre essência e ser é uma distinção de razão fundada na realidade; mas, na ordem real, não há essência criada subsistente sem ser.

Ainda que a essência possa ser concebida sem o ser, ela não pode existir sem ele. A distinção lógica não implica separação ontológica.

Por isso, toda essência criada é como uma capacidade ontológica de receber o ser; e essa capacidade não se realiza senão quando participa do ato de existir que procede de Deus.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o ser não é ato extrínseco, mas ato intrínseco e constitutivo do ente. Ele não se adiciona de fora, mas perfaz a essência em sua atualidade. Logo, sem o ser, a essência criada não é nada.
  2. À segunda, responde-se que as formas separadas não são atos puros absolutamente, mas apenas quanto à matéria. Têm, contudo, potencialidade quanto ao ser, enquanto o recebem do Criador.
  3. À terceira, deve-se dizer que a determinação da essência enquanto quididade não é existência real, mas apenas conceitual. Assim, a essência criada é distinta do ser pela razão, mas não subsiste sem ele na realidade.
  4. À quarta, responde-se que o intelecto pode conceber separadamente a essência e o ser, porque abstrai; mas na realidade, não podem existir separados. O que o intelecto distingue, a natureza une.

Conclusão.

A essência criada não pode existir sem participação do ser, porque o ser é seu ato próprio e atualizador.
Toda essência criada é potência em relação ao ser, e esse ato vem somente do Ser primeiro.
Sem participar do ser, a essência criada não é coisa alguma, mas apenas possibilidade pensada.

Por isso, Alberto conclui:
“Omnis essentia creata dependet ab esse participato; et sicut lumen non est nisi participando lucem, ita nec essentia est nisi participando esse.”
Toda essência criada depende do ser participado; assim como a luz não existe senão participando da claridade, assim também a essência não existe senão participando do ser.

Quaestio XVIII — Utrum esse et essentia se habeant ut actus et potentia

(Se o ser e a essência se relacionam como ato e potência)

Objeções.

  1. Parece que o ser e a essência não se relacionam como ato e potência, pois o ato é sempre posterior à potência quanto à perfeição, e o ser é anterior à essência quanto à natureza e à causalidade. Logo, o ser não pode ser ato da essência, mas antes sua causa ou princípio extrínseco.
  2. Além disso, a potência é o que tende ao ato e o recebe. Ora, o ser não é recebido pela essência como por uma potência, mas é a condição mesma pela qual toda essência subsiste. Logo, não se relacionam como ato e potência, mas como sujeito e acidente.
  3. Ademais, se o ser fosse ato da essência, seguir-se-ia que, cessando o ser, cessaria a essência. Mas a essência, enquanto inteligível, permanece no intelecto mesmo quando não existe no real. Logo, o ser não é ato da essência, mas algo que lhe sobrevém.
  4. Ainda, o ato e a potência pertencem à mesma ordem de realidade, mas o ser e a essência pertencem a ordens diversas — uma de atualidade, outra de quididade. Logo, não podem se relacionar como ato e potência.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles afirma:
“Esse est actus omnium actuum et perfectio omnium perfectionum.”
O ser é o ato de todos os atos e a perfeição de todas as perfeições.

E Alberto comenta:
“Essentia se habet ad esse sicut potentia ad actum, quia per ipsum esse fit actu ens.”
A essência se relaciona com o ser como a potência com o ato, porque é pelo ser que ela se torna ente em ato.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o ser e a essência se relacionam como ato e potência, mas de modo mais eminente do que qualquer outra relação desse tipo encontrada na ordem física ou material.

Pois em todas as criaturas há composição real entre essência e ser: a essência significa o quid de uma coisa, o ser significa o quod est — o ato pelo qual o quid se torna ens in actu.

A essência, enquanto tal, é aquilo que pode existir; o ser é o que faz com que ela exista. Assim, a essência é potência ontológica, e o ser é ato puro que a atualiza.

Diz Alberto:
“Esse est actus essentiae, sicut forma est actus materiae.”
O ser é ato da essência, assim como a forma é ato da matéria.

Mas essa analogia é apenas proporcional, não unívoca. Pois a matéria e a forma pertencem à ordem física, ao passo que a essência e o ser pertencem à ordem metafísica.
A matéria recebe a forma e se torna corpo; a essência recebe o ser e se torna ente.

Em toda criatura, portanto, a essência é princípio potencial de ser, e o ser é o ato que a perfaz.
Se o ser fosse removido, a essência permaneceria apenas como conceito, e não como realidade.

Por isso, o ser é a atualidade de todas as coisas e o fundamento de toda a perfeição.
E porque toda potência é medida pelo ato que a atualiza, segue-se que toda essência é limitada pelo modo de ser que recebe.

Assim, quanto mais perfeita é uma natureza, mais próximo está o seu ser do ato puro; e quanto mais imperfeita, mais distante está, e mais potência conserva em si.

Em Deus, não há tal distinção, porque n’Ele a essência é o próprio ser; e, portanto, não há composição nem relação de ato e potência, mas identidade absoluta.
Nas criaturas, porém, há verdadeira composição: a essência está em potência para o ser, e o ser é seu ato último e perfeitíssimo.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora o ser seja anterior à essência quanto à causalidade universal, em cada ente ele é o ato da essência, e não princípio extrínseco. Pois o ser não é adicionado de fora, mas infundido como ato interior e formal.
  2. À segunda, responde-se que a essência é potência não física, mas metafísica. Ela não é recipiente como a matéria, mas sujeito receptivo no plano do ser. Por isso, o ser não é acidente, mas ato constitutivo.
  3. À terceira, deve-se dizer que a essência, enquanto concebida no intelecto, não é essência real, mas apenas abstrata. A essência real não pode subsistir sem o ser. A permanência no intelecto é apenas lógica, não ontológica.
  4. À quarta, responde-se que a diferença de ordem não impede a relação proporcional. O ser e a essência pertencem a ordens diversas, mas o princípio que as une é o mesmo: o ato atualiza a potência em toda a hierarquia do ente.

Conclusão.

O ser e a essência se relacionam como ato e potência, porque é pelo ser que a essência é atualizada e se torna ente.
O ser é o ato primeiro e último, a perfeição que completa a essência e a eleva da possibilidade à realidade.
Toda distinção entre ato e potência, forma e matéria, encontra sua analogia suprema nessa relação fundamental entre ser e essência.

Por isso, Alberto conclui:
“Esse est actus essentiae, et essentia est potentia respectu esse; unde omnis creatura componitur ex his duobus, in Deo vero utrumque est unum et idem.”
O ser é o ato da essência, e a essência é potência em relação ao ser; por isso, toda criatura se compõe de ambos, mas em Deus ambos são um e o mesmo.

Quaestio XIX — Utrum essentia determinat modum essendi

(Se a essência determina o modo de ser)

Objeções.

  1. Parece que a essência não determina o modo de ser, pois o ser é ato simples e universal, anterior a toda determinação. Ora, o que é anterior não pode ser determinado por aquilo que é posterior. Logo, não é a essência que determina o modo de ser, mas o ser que determina o modo da essência.
  2. Além disso, o modo de ser segue a causa eficiente, que confere o ato segundo a sua intenção. Ora, a essência é apenas princípio formal e não eficiente. Logo, não é a essência que determina o modo de ser, mas a causa agente.
  3. Ademais, se a essência determinasse o modo de ser, todas as essências do mesmo gênero teriam o mesmo modo de existir. Mas vemos que há diversos modos de ser entre coisas da mesma essência — por exemplo, os homens vivem de modos diversos. Logo, o modo de ser não se determina pela essência.
  4. Ainda, o modo de ser pertence à ordem do ato, mas a essência pertence à ordem da potência. Ora, o ato não é determinado pela potência, mas o contrário. Logo, a essência não determina o modo de ser.

Em contrário (Sed contra).

Diz Dionísio:
“Omnis virtus divina secundum modum recipientis participatur.”
Toda virtude divina é participada segundo o modo do recipiente.

E Alberto comenta:
“Essentia recipit esse secundum modum suum; unde essentia est quae determinat modum essendi.”
A essência recebe o ser segundo o seu modo; portanto, é ela que determina o modo de ser.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência determina o modo de ser, porque o ser é ato da essência, e todo ato se mede pelo sujeito que o recebe.

Com efeito, o ser, enquanto ato puro e absoluto, é comum e indiferenciado; mas, ao ser recebido pela essência, torna-se ser determinado — isto é, esse tale, o ser desta ou daquela coisa.

Assim, a essência é para o ser o que a matéria é para a forma: princípio de determinação e limitação.
O ser é universal e ilimitado; a essência, ao recebê-lo, o restringe segundo sua própria natureza.

Diz Alberto:
“Esse, secundum se, est infinitum; sed limitatur per essentiam, sicut lumen per medium diaphanum.”
O ser, em si mesmo, é infinito; mas é limitado pela essência, assim como a luz é limitada pelo meio transparente.

Portanto, toda a diversidade de modos de ser nas criaturas procede da diversidade de essências.
O ser do anjo é espiritual e simples, porque a essência angélica é pura forma;
o ser do homem é composto e racional, porque sua essência é forma em matéria;
o ser do corpo é material e corruptível, porque a essência corpórea é potencial e limitada.

Em Deus, porém, não há distinção: a essência divina é o próprio ser; e, por isso, não há n’Ele limitação ou modo participativo, mas ser infinito e absoluto.

Mas em toda criatura, a essência é medida da participação no ser, de modo que o grau de ser segue o grau da essência.
Por isso, Alberto escreve:
“Secundum modum essentiae est modus essendi; unde in diversis naturis diversa est participatio essendi.”
Segundo o modo da essência é o modo de ser; por isso, em naturezas diversas há diversa participação do ser.

Assim, o ser não é multiplicado em si mesmo, mas nos modos de sua recepção; e esses modos são determinados pela essência de cada ente.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o ser é anterior em si mesmo, mas nas criaturas é recebido, e, por isso, depende da essência quanto à determinação. O que é universal em si se torna particular no recipiente.
  2. À segunda, responde-se que a causa eficiente confere o ser, mas o confere conforme a capacidade da essência que o recebe. Assim, o modo de ser não procede apenas do agente, mas principalmente do recipiente.
  3. À terceira, deve-se dizer que a diversidade de modos de viver entre os homens não é diversidade essencial, mas acidental. A essência humana determina o modo de ser do homem enquanto homem, e não os modos acidentais de sua operação.
  4. À quarta, responde-se que, embora a essência seja potência em relação ao ser, é potência ordenada e proporcionada, que mede e configura o ato recebido. Assim, o ato não é determinado pela potência enquanto imperfeita, mas enquanto medida da recepção.

Conclusão.

A essência determina o modo de ser, porque é o princípio que limita e especifica o ato de existir recebido.
O ser é universal e ilimitado em si mesmo, mas torna-se particular e finito conforme a essência que o participa.
Por isso, toda a ordem do real é uma hierarquia de modos de ser fundada na diversidade essencial das naturezas.

E Alberto conclui:
“Essentia dat esse tali modo, et secundum mensuram suae perfectionis recipit perfectionem esse.”
A essência dá o ser de tal modo, e segundo a medida de sua perfeição recebe a perfeição do ser.

Quaestio XX — Utrum essentia sit principium individuationis

(Se a essência é o princípio de individuação)

Objeções.

  1. Parece que a essência é o princípio de individuação, pois é pela essência que cada coisa é o que é. Logo, se o ser individual difere do universal, essa diferença deve proceder da essência mesma que constitui a coisa.
  2. Além disso, tudo que distingue uma coisa de outra pertence àquilo que a constitui. Ora, a essência constitui a coisa em seu ser próprio. Logo, é pela essência que se distingue um indivíduo de outro.
  3. Ademais, a forma é aquilo pelo qual a matéria é determinada e especificada. Ora, a forma pertence à essência. Logo, é a essência que dá a individualidade à coisa.
  4. Ainda, se a essência não fosse princípio de individuação, seria necessário que outro princípio lhe sobreviesse para individualizá-la, o que implicaria composição infinita. Logo, a essência é princípio suficiente de individuação.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles diz no Livro das Categorias:
“Substantia prima est quae nec in subiecto est nec de subiecto dicitur.”
A substância primeira é aquela que não está em sujeito nem se diz de sujeito.

E Alberto comenta:
“Individuatio non fit per essentiam communem, sed per signatam materiam vel per aliquid additum ad essentiam.”
A individuação não se dá pela essência comum, mas pela matéria designada ou por algo acrescentado à essência.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que a essência, enquanto tal, não é o princípio de individuação, mas o fundamento comum sobre o qual se dá a individuação por algo que a determina a ser haec res, “esta coisa”.

Pois a essência significa o que é comum a todos os indivíduos de uma espécie — o homem enquanto homem, o cavalo enquanto cavalo, e assim por diante.
Mas o indivíduo é o ser concreto e determinado, hic homo, “este homem”.

Logo, a essência, enquanto universalizável, é princípio de identidade específica, não de individuação.
A individuação requer algo que limite a essência à sua existência singular.

Nas substâncias corporais, esse princípio é a matéria signata quantitate, isto é, a matéria determinada por quantidade e situação;
nas substâncias separadas, é a própria forma total que, sendo única e não recebida em matéria, é o princípio de sua individualidade.

Assim, Alberto distingue dois modos de individuação:
per materiam signatam, nas coisas compostas;
per formam subsistentem, nas substâncias simples.

A essência, portanto, é potência para a individuação, mas não o ato que a realiza.
Ela fornece o conteúdo inteligível que pode ser multiplicado em diversos indivíduos, mas a determinação singular vem do princípio que a contrai.

Por isso, Alberto afirma:
“Essentia secundum se est indifferens ad unum et multa; sed recipit unitatem per principium determinans, quod est materia vel forma subsistens.”
A essência em si é indiferente ao uno e ao múltiplo; mas recebe unidade pelo princípio determinante, que é a matéria ou a forma subsistente.

Assim, o que faz Pedro ser este homem e não apenas homem é a determinação da natureza humana nesta porção de matéria sob tais dimensões e circunstâncias.
Sem essa determinação, a essência permaneceria universal e não individual.

Em Deus, porém, a essência e o ser são idênticos e absolutamente simples; portanto, n’Ele não há individuação distinta, mas unidade absoluta.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a essência é causa daquilo que é comum na coisa, não daquilo que é próprio e individual. O ser individual é a essência acrescida de princípios de determinação.
  2. À segunda, responde-se que distinguir pertence não apenas à constituição formal, mas também à condição material do ente. Por isso, o princípio de distinção nas coisas compostas é material, não essencial.
  3. À terceira, deve-se dizer que, embora a forma pertença à essência, não é enquanto forma comum, mas enquanto forma contraída pela matéria, que ela confere a individualidade.
  4. À quarta, responde-se que a individuação não requer outro princípio essencial, mas apenas a aplicação da essência comum à matéria determinada. Assim, não há regressão infinita, porque a determinação material basta para completar o indivíduo.

Conclusão.

A essência não é o princípio de individuação, mas o sujeito comum que é individualizado por algo que a determina.
Nas coisas compostas, esse princípio é a matéria signata quantitate; nas simples, é a forma subsistens; em Deus, a identidade perfeita de essência e ser.

Assim se compreende que o universal é anterior à multiplicidade apenas segundo a razão, e o indivíduo é o ente verdadeiro na ordem da existência.

E Alberto conclui:
“Individuatio non fit per essentiam, sed per illud quod facit esse hoc aliquid; et hoc est materia determinata in corporalibus, forma in separatis, et essentia ipsa in Deo.”
A individuação não se dá pela essência, mas por aquilo que faz ser este algo; e isto é a matéria determinada nas coisas corporais, a forma nas separadas e a própria essência em Deus.

ALBERTI MAGNI — SUPER LIBROS METAPHYSICORUM ARISTOTELIS

LIBER OCTAVUS – DE MOTU ET INFINITO

(Livro Oitavo — Sobre o Movimento e o Infinito)

Quaestio I — Utrum motus sit actus entis in potentia.
Se o movimento é o ato de um ente em potência.

Quaestio II — Utrum motus sit in omni genere entis.
Se o movimento existe em todo gênero de ente.

Quaestio III — Utrum motus sit in substantia.
Se há movimento na substância.

Quaestio IV — Utrum motus sit in quantitate.
Se há movimento na quantidade.

Quaestio V — Utrum motus sit in qualitate.
Se há movimento na qualidade.

Quaestio VI — Utrum motus sit in loco.
Se há movimento no lugar.

Quaestio VII — Utrum omnis motus sit continuus.
Se todo movimento é contínuo.

Quaestio VIII — Utrum sit possibile motum infinitum esse.
Se é possível que exista movimento infinito.

Quaestio IX — Utrum motus habeat principium et finem in tempore.
Se o movimento tem princípio e fim no tempo.

Quaestio X — Utrum tempus sit mensura motus.
Se o tempo é medida do movimento.

Quaestio XI — Utrum tempus sit reale vel rationis tantum.
Se o tempo é algo real ou apenas de razão.

Quaestio XII — Utrum sit possibile esse tempus infinitum.
Se é possível que o tempo seja infinito.

Quaestio XIII — Utrum sit aliquis motus aeternus.
Se existe algum movimento eterno.

Quaestio XIV — Utrum motus caelestis sit aeternus.
Se o movimento celeste é eterno.

Quaestio XV — Utrum sit unus motus primus a Deo.
Se há um movimento primeiro proveniente de Deus.

Quaestio XVI — Utrum Deus moveat per intellectum vel per voluntatem.
Se Deus move por intelecto ou por vontade.

Quaestio XVII — Utrum in Deo sit motus metaphorice dictus.
Se em Deus há movimento dito de modo metafórico.

Quaestio XVIII — Utrum infinitum sit in actu vel in potentia tantum.
Se o infinito existe em ato ou somente em potência.

Quaestio XIX — Utrum infinitum secundum quantitatem possit esse reale.
Se o infinito segundo a quantidade pode ser real.

Quaestio XX — Utrum infinitum secundum qualitatem possit esse reale.
Se o infinito segundo a qualidade pode ser real.

Quaestio XXI — Utrum infinitum secundum numerum sit possibile.
Se o infinito segundo o número é possível.

Quaestio XXII — Utrum infinitum conveniat Deo proprie.
Se o infinito convém propriamente a Deus.

Quaestio I — Utrum motus sit actus entis in potentia

(Se o movimento é o ato de um ente em potência)

Objeções.

  1. Parece que o movimento não é o ato de um ente em potência, pois o ato é próprio do ente em ato, e não do ente em potência. Se o movimento é ato, não poderia pertencer àquilo que ainda está em potência, mas somente ao que já é.
  2. Além disso, o ato é algo fixo e determinado, enquanto o movimento é instável e imperfeito. Ora, o que é imperfeito não pode ser propriamente chamado de ato, mas de passagem ao ato. Logo, o movimento não é ato do ente em potência, mas caminho para o ato.
  3. Ademais, todo ato é perfeição da coisa; mas o movimento, por ser inacabado, pertence à imperfeição. Assim, não é ato, mas imperfeição do ato.
  4. Ainda, segundo Aristóteles, o movimento é “actus existentis in potentia, prout est in potentia”. Ora, isso parece contraditório, pois aquilo que está em potência não é ainda ato. Logo, o movimento não é ato, mas meio entre potência e ato.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, define:
“Motus est actus entis in potentia, prout in potentia.”
O movimento é o ato de um ente em potência, enquanto está em potência.

E Alberto comenta:
“Motus est actus imperfectus, quia est in medio inter potentiam et actum perfectum.”
O movimento é um ato imperfeito, porque está no meio entre a potência e o ato perfeito.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o movimento é verdadeiramente ato, mas não ato perfeito, e sim ato imperfeito, ou ato em trânsito, porque é a atualização da potência enquanto ainda não chegou à completude do ato.

Para compreender isso, é preciso distinguir três estados do ser:
(1) o ser em pura potência;
(2) o ser em movimento;
(3) o ser em ato perfeito.

O primeiro é o que pode ser e ainda não é;
o segundo é o que já começou a ser, mas ainda não completou o seu ser;
o terceiro é o que é plenamente, tendo atingido o termo do movimento.

Assim, o movimento não é pura potência, porque há nele alguma atualidade;
nem é ato completo, porque a potência ainda não se extinguiu.
É, pois, o ato da potência enquanto tal — o que significa um ato em curso, não consumado.

Diz Alberto:
“Motus est actus potentiae inquantum nondum totaliter reducta est in actum.”
O movimento é o ato da potência enquanto ainda não foi totalmente reduzida ao ato.

O movimento, portanto, é a atualização gradual de uma potência, em que coexistem simultaneamente o ser e o poder-ser.
Por isso, ele se situa no meio da hierarquia ontológica: entre o repouso da potência pura e a perfeição do ato.

É também por essa razão que o movimento é o princípio do tempo, pois o tempo mede a passagem da potência ao ato.
O movimento é, portanto, uma realidade ontológica intermediária — um ato em progresso, uma perfeição incompleta.

E porque todo movimento supõe um sujeito, é necessário que o ente em potência já exista de algum modo para que o movimento ocorra nele.
A matéria se move pela forma, a potência se move pelo ato, e o ser em movimento é, por isso, composto de ambos.

Assim, o movimento é ato em relação à potência e potência em relação ao ato final.
Ele é o “entre” metafísico — o que torna o ser dinâmico, transitivo e participado.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o movimento pertence ao ente em potência, não enquanto pura potência, mas enquanto é potência em ato. Pois no movimento, a potência já participa de alguma atualidade.
  2. À segunda, responde-se que a imperfeição do movimento não o priva do nome de ato, mas o qualifica como ato imperfeito. Assim como a infância é ato imperfeito do homem perfeito, assim o movimento é ato imperfeito do repouso final.
  3. À terceira, deve-se dizer que a perfeição do ato se entende em graus. O movimento é ato enquanto dá ser em via de perfeição; é imperfeito porque tende a outro mais alto. Logo, é ato por essência, imperfeito por condição.
  4. À quarta, responde-se que o movimento é ato de um ente em potência enquanto está em potência, não por ser pura potência, mas porque essa potência já começou a ser atualizada. Assim, o movimento é o ato intermediário entre dois extremos — potência e ato.

Conclusão.

O movimento é o ato do ente em potência enquanto tal, isto é, a atualização incompleta que torna o ser transitivo.
É ato em relação à potência e potência em relação ao ato final.
Por isso, é o princípio do tempo e da mutabilidade, e a expressão mais própria da passagem do possível ao real.

E Alberto conclui:
“Motus est actus imperfectus potentiae, et per eum manifestatur ordo rerum a potentia ad actum; unde est radix temporis et imago aeternitatis in mutabilibus.”
O movimento é o ato imperfeito da potência, e por ele se manifesta a ordem das coisas da potência ao ato; por isso, é a raiz do tempo e a imagem da eternidade nas coisas mutáveis.

Quaestio II — Utrum motus sit in omni genere entis

(Se o movimento existe em todo gênero de ente)

Objeções.

  1. Parece que o movimento existe em todo gênero de ente, pois em tudo há passagem da potência ao ato. Ora, o movimento é justamente essa passagem. Logo, onde quer que haja potência e ato, há movimento.
  2. Além disso, toda coisa criada participa de mudança e sucessão, pois nada criado é absolutamente imóvel. Ora, o movimento é a causa de toda mudança. Logo, em todos os gêneros de ente há movimento.
  3. Ademais, o ser é comum a todas as categorias, e o movimento pertence ao ser enquanto ser, pois é ato do ente em potência. Logo, sendo o ser comum a tudo, o movimento também deve estar em tudo.
  4. Ainda, o intelecto se move ao conhecer, a vontade se move ao desejar, e até o número cresce por adição. Logo, o movimento existe também nos gêneros espiritual, moral e matemático.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, afirma:
“Motus est tantum in his quae habent materiam.”
O movimento existe apenas nas coisas que têm matéria.

E Alberto comenta:
“Motus non est in omni genere entis, sed solum in physicis, quia ibi est transitus de potentia ad actum secundum subiectum materiale.”
O movimento não está em todo gênero de ente, mas somente nas coisas físicas, porque ali há passagem da potência ao ato segundo um sujeito material.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o movimento não existe em todo gênero de ente, mas apenas naqueles em que há matéria sujeita à mutabilidade.

Com efeito, o movimento implica uma passagem real da potência ao ato no mesmo sujeito; e isso só é possível onde há algo que permaneça no processo de mudança — isto é, onde há matéria.

Por isso, o movimento pertence ao domínio das coisas naturais e corporais, nas quais a matéria é o sujeito da sucessão.

Diz Alberto:
“Motus est actus entis in potentia secundum quod in potentia, et ideo non est nisi ubi est potentia passiva subiecti materiali.”
O movimento é o ato do ente em potência enquanto está em potência; e, por isso, só existe onde há potência passiva de um sujeito material.

Nos entes puramente espirituais, como os anjos e as almas separadas, não há movimento propriamente dito, porque neles não há matéria nem sucessão real de ato.
Há, sim, mutação intencional — passagem do não conhecer ao conhecer, do não querer ao querer — mas isso é movimento apenas de modo metafórico, não físico nem ontológico.

Também nas entidades matemáticas — número, ponto, linha, figura — não há movimento real, pois não têm ser fora da abstração do intelecto.
O aumento ou a diminuição numérica são apenas modos lógicos de sucessão, não movimento natural.

E nas formas universais, como o gênero, a espécie ou a essência, o movimento é impossível, pois são imutáveis por definição.
O universal não muda, mas os indivíduos sob ele mudam.

Portanto, o movimento pertence somente aos entes materiais e físicos, e dentro destes, a quatro gêneros principais:
— à substância, quanto à geração e corrupção;
— à quantidade, quanto ao aumento e diminuição;
— à qualidade, quanto à alteração;
— e ao lugar, quanto à locomoção.

Fora desses gêneros, não há movimento verdadeiro, mas somente analogias de movimento.

Assim, Alberto escreve:
“Motus non est in omni genere, sed in his tantum quae recipiunt formam in materia. In aliis autem dicitur motus per similitudinem, sicut dicitur motus intellectus et voluntatis.”
O movimento não está em todo gênero, mas somente naqueles que recebem forma na matéria. Nos outros, fala-se de movimento por semelhança, como se diz do movimento do intelecto e da vontade.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora todo ente criado possua potência e ato, nem toda passagem entre eles é movimento real. O movimento exige sucessão temporal e sujeito material, o que não existe em todos os gêneros.
  2. À segunda, responde-se que a mutabilidade espiritual e a mutabilidade física diferem essencialmente. A primeira é sucessão intencional, a segunda é sucessão real. Só esta constitui movimento propriamente dito.
  3. À terceira, deve-se dizer que o ser é comum a todos, mas o movimento não é propriamente do ser enquanto ser, e sim do ser material. O ser espiritual é ato sem movimento, porque é ato puro.
  4. À quarta, responde-se que o movimento do intelecto e da vontade é apenas por analogia: há ali passagem de um termo cognoscido a outro, mas não transformação ontológica no sujeito.

Conclusão.

O movimento não existe em todo gênero de ente, mas apenas na ordem dos entes materiais, onde há potência passiva e sucessão no sujeito.
Nos seres espirituais e nos entes matemáticos, o movimento é dito somente de modo metafórico, não real.
O movimento, portanto, é próprio do domínio físico e constitui a expressão sensível da passagem da potência ao ato na matéria.

E Alberto conclui:
“Motus proprie est in rebus naturalibus, ubi est materia subiecta alterationi; in aliis autem est solum per analogiam ad illum, ut dicitur motus mentis vel voluntatis.”
O movimento propriamente dito está nas coisas naturais, onde a matéria é sujeito da alteração; nos outros, existe apenas por analogia, como se fala do movimento da mente ou da vontade.

Quaestio III — Utrum motus sit in substantia

(Se há movimento na substância)

Objeções.

  1. Parece que há movimento na substância, pois a substância é o primeiro dos predicamentos e o sujeito de todas as mutações. Ora, o que é sujeito de mudança também pode mudar quanto a si mesmo. Logo, há movimento na substância.
  2. Além disso, toda geração e corrupção são mudanças substanciais. Ora, a geração e a corrupção são espécies de movimento. Logo, há movimento na substância.
  3. Ademais, as substâncias naturais passam de não-ser a ser, e de ser a não-ser. Ora, essa passagem é movimento. Logo, o movimento pertence à substância.
  4. Ainda, Aristóteles diz que “a natureza é princípio do movimento e do repouso naquilo em que está por si e não por acidente”. Ora, a natureza é a essência da substância natural. Logo, o movimento está na substância.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, distingue:
“Motus est actus existentis in potentia secundum quod in potentia.”
E acrescenta:
“Substantia non est susceptiva talis motus nisi per accidens, quia non manet idem subiectum.”
A substância não é suscetível de tal movimento senão por acidente, porque não permanece o mesmo sujeito.

E Alberto comenta:
“In generatione et corruptione non est motus proprie, sed successio entis et non entis.”
Na geração e na corrupção não há movimento propriamente dito, mas sucessão do ser e do não-ser.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que não há movimento propriamente dito na substância, mas apenas sucessão de estados substanciais — generatio e corruptio — nas quais o ser e o não-ser alternam-se sem continuidade de sujeito.

Com efeito, o movimento requer continuidade e permanência de um mesmo sujeito que passa de uma forma a outra.
Ora, na mudança substancial, o sujeito (isto é, a matéria primeira) permanece, mas a forma substancial cessa e outra começa — de modo que não há um mesmo ente que mude, mas um novo ente que surge e outro que deixa de ser.

Diz Alberto:
“Motus proprie est ubi manet idem secundum subiectum et variatur secundum formam accidentalem; in substantia vero manet solum materia, quae non est ens in actu.”
O movimento propriamente dito existe onde o mesmo sujeito permanece e varia segundo a forma acidental; na substância, porém, permanece apenas a matéria, que não é ente em ato.

Portanto, a geração e a corrupção não são movimentos em sentido estrito, mas passagens instantâneas da potência ao ato substancial, sem meio contínuo entre o ser e o não-ser.
Assim, entre o não-ser do homem e o ser do homem não há um meio contínuo, mas uma transição instantânea.

Por isso, Aristóteles distingue o movimento da geração:
— o movimento é a mudança de algo já existente segundo o acidente;
— a geração é a produção de algo que antes não existia.

A diferença é que o movimento é no ente, e a geração é para o ente.

Diz ainda Alberto:
“In mutatione substantiae non est motus, quia non est medium inter esse et non esse; sed est conversio materiae in formam.”
Na mudança da substância não há movimento, porque não há meio entre o ser e o não-ser; há apenas conversão da matéria em forma.

Contudo, pode-se dizer que há movimento “por analogia” na substância, enquanto a geração e a corrupção possuem certa semelhança com o movimento acidental — pois nelas há passagem ordenada de potência a ato, embora não contínua.

Assim, o movimento pertence à substância apenas de modo impróprio e analógico.
De modo próprio, ele existe somente nas alterações acidentais, em que o sujeito permanece o mesmo.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a substância é o sujeito dos movimentos acidentais, mas não muda quanto ao seu próprio ser, a não ser por geração ou corrupção, que não são movimentos propriamente ditos.
  2. À segunda, responde-se que a geração e a corrupção são ditas “movimentos” apenas impropriamente, por participação do nome. São passagens instantâneas de não-ser a ser e de ser a não-ser.
  3. À terceira, deve-se dizer que a passagem de não-ser a ser é sucessão, não movimento, porque carece de continuidade. O movimento exige um meio entre os extremos, e a geração não o tem.
  4. À quarta, responde-se que a natureza é princípio do movimento, não enquanto essência substancial, mas enquanto fonte de operações e mudanças acidentais.

Conclusão.

Não há movimento propriamente dito na substância, porque o movimento exige continuidade de sujeito, e na geração e corrupção não há tal continuidade de ente.
A mudança substancial é instantânea, não contínua; sucessão de formas, não passagem gradual.
Portanto, a substância muda somente per accidens, não per se.

E Alberto conclui:
“In substantia est mutatio, sed non motus; quia generatio et corruptio non habent medium inter extrema, sed instantaneam conversionem materiae in formam.”
Na substância há mudança, mas não movimento; porque a geração e a corrupção não têm meio entre os extremos, mas conversão instantânea da matéria na forma.

Quaestio IV — Utrum motus sit in quantitate

(Se há movimento na quantidade)

Objeções.

  1. Parece que não há movimento na quantidade, pois o movimento requer sucessão de formas no mesmo sujeito. Ora, a quantidade é uma medida fixa da substância, e, sendo tal, não admite sucessão de formas, mas apenas adição ou subtração. Logo, não há movimento na quantidade.
  2. Além disso, toda mudança de quantidade se dá por adição ou corrupção de matéria, e isso pertence ao movimento substancial, não à quantidade enquanto tal. Logo, o movimento não está na quantidade, mas na substância.
  3. Ademais, o movimento exige um meio contínuo entre dois extremos. Ora, entre uma quantidade maior e uma menor não há meio de quantidade, pois o número e a extensão não admitem infinitas divisões reais, mas apenas de razão. Logo, o movimento não pode estar na quantidade.
  4. Ainda, o aumento e a diminuição não parecem ser movimentos próprios, mas efeitos de geração e corrupção. Logo, o movimento não é intrínseco à quantidade, mas extrínseco a ela.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro V da Física, diz:
“Motus in quantitate est augmentum et diminutio.”
O movimento na quantidade é o aumento e a diminuição.

E Alberto comenta:
“Sicut in substantia est generatio et corruptio, sic in quantitate est augmentatio et diminutio, quae sunt motus proprii secundum hoc genus.”
Assim como na substância há geração e corrupção, assim também na quantidade há aumento e diminuição, que são os movimentos próprios desse gênero.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que há movimento na quantidade, mas de modo próprio e restrito, isto é, enquanto se considera o aumento e a diminuição como espécies de movimento.

Com efeito, a quantidade, enquanto medida do corpo, pode crescer ou diminuir segundo a adição ou subtração de matéria.
Mas a adição e a subtração mesmas não pertencem à essência da quantidade, e sim à substância corpórea que a sustenta.
Por isso, o movimento quantitativo é um movimento per accidens, cuja formalidade, contudo, pertence à quantidade como predicamento.

Diz Alberto:
“Motus in quantitate non est per mutationem formae, sed per variationem subiecti secundum mensuram.”
O movimento na quantidade não se dá por mudança de forma, mas por variação do sujeito segundo sua medida.

Assim, quando um corpo cresce, sua quantidade muda por acréscimo de matéria, e quando diminui, muda por perda de matéria.
No entanto, o que permanece o mesmo é o sujeito corporal, cuja extensão é agora maior ou menor.
Logo, há continuidade de sujeito e alteração gradual de medida, o que basta para constituir verdadeiro movimento.

O movimento na quantidade é, portanto, o segundo tipo de movimento físico, depois do movimento substancial.
Ele é mais próprio que a geração, porque conserva o mesmo sujeito em continuidade e admite gradações intermediárias entre os extremos.

Por isso, Alberto o chama de movimento “secundum magis et minus”, isto é, segundo o mais e o menos, o aumento e a diminuição.

Diz ainda:
“In augmento et diminutione est actus potentiae quae est quantitas, prout est in potentia ad maius et minus.”
No aumento e na diminuição está o ato da potência que é a quantidade, enquanto está em potência para o mais e o menos.

Portanto, o movimento quantitativo não se refere à forma substancial nem à forma acidental, mas à quantidade mesma enquanto pode ser maior ou menor.

E como o crescimento é contínuo, o movimento quantitativo é verdadeiramente movimento, não simples sucessão.

Mas deve-se observar que o aumento é movimento natural apenas nos corpos vivos, onde há princípio interno de nutrição e crescimento;
nos corpos inanimados, o aumento é acidental, resultante de causas externas.

Assim, Alberto conclui:
“In viventibus augmentatio est naturalis, quia principium est intrinsecum; in inanimatis est violenta, quia fit ab extrinseco agente.”
Nos seres vivos o aumento é natural, porque o princípio é intrínseco; nos inanimados é violento, porque vem de um agente exterior.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora a quantidade seja medida fixa da substância, ela admite variação segundo o acréscimo ou diminuição do sujeito material. Assim, há sucessão de estados quantitativos, e isso basta para o movimento.
  2. À segunda, responde-se que a matéria é instrumento do movimento quantitativo, não sua essência. O aumento pertence à quantidade enquanto medida do corpo, e não apenas à substância enquanto tal.
  3. À terceira, deve-se dizer que entre o maior e o menor há infinitos meios de quantidade segundo a divisão potencial, o que basta para continuidade do movimento. O infinito atual não é necessário.
  4. À quarta, responde-se que, embora o aumento dependa da geração e da corrupção como causas remotas, ele é movimento próprio e formal da quantidade, porque tem seu próprio sujeito e medida.

Conclusão.

movimento na quantidade, e esse movimento é o aumento e a diminuição, pelos quais a medida corporal se altera continuamente no mesmo sujeito.
Esse movimento é próprio do gênero quantitativo, natural nos seres vivos e acidental nos inanimados.

Por isso, Alberto conclui:
“Motus in quantitate est augmentum et diminutio, et est verus motus, quia manet idem subiectum et variatur secundum mensuram.”
O movimento na quantidade é o aumento e a diminuição, e é verdadeiro movimento, porque o mesmo sujeito permanece e varia segundo a medida.

Quaestio V — Utrum motus sit in qualitate

(Se há movimento na qualidade)

Objeções.

  1. Parece que não há movimento na qualidade, pois o movimento requer sucessão contínua entre contrários ou intermediários. Ora, as qualidades, como calor e frio, branco e preto, são opostas por contrariedade absoluta e não admitem intermediário real. Logo, nelas não há movimento, mas apenas mudança instantânea.
  2. Além disso, o movimento implica passagem gradual da potência ao ato. Ora, as qualidades, enquanto formas simples, não admitem graus reais de participação, mas apenas modos de intensificação do mesmo estado. Logo, o movimento na qualidade não é real, mas lógico.
  3. Ademais, se houvesse movimento na qualidade, deveria haver também tempo e lugar próprios a essa mudança. Ora, a alteração qualitativa não requer movimento local, e pode ocorrer instantaneamente, como no resfriamento súbito do ferro. Logo, não há verdadeiro movimento na qualidade.
  4. Ainda, a qualidade, segundo Aristóteles, é um acidente fixo da substância, e o que é fixo não é sujeito de movimento. Logo, a qualidade não se move.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro V da Física, ensina:
“Motus in qualitate est alteratio.”
O movimento na qualidade é a alteração.

E Alberto comenta:
“Sicut in quantitate est augmentatio et diminutio, sic in qualitate est alteratio, quae est motus proprius secundum hoc genus.”
Assim como na quantidade há aumento e diminuição, assim também na qualidade há alteração, que é o movimento próprio desse gênero.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que há movimento na qualidade, e esse movimento chama-se alteração (alteratio), a qual consiste na passagem gradual de uma disposição qualitativa a outra.

Com efeito, a qualidade, enquanto acidente, pode intensificar-se ou enfraquecer-se no mesmo sujeito.
Por exemplo: o corpo aquecido pode tornar-se mais quente, e o corpo frio pode tornar-se morno e depois quente.
Há, portanto, gradação contínua entre os extremos, o que é suficiente para constituir movimento.

Diz Alberto:
“Motus in qualitate est actus potentiae qualitativae, prout est in potentia ad magis et minus.”
O movimento na qualidade é o ato da potência qualitativa enquanto está em potência para o mais e o menos.

A alteração difere da geração, porque na alteração o sujeito permanece o mesmo, e somente a disposição acidental se transforma.
Enquanto na geração há conversão da matéria em forma substancial, na alteração há modificação de forma acidental sem perda do sujeito.

Assim, o calor não surge por geração, mas por intensificação; o branco não nasce como nova substância, mas como modificação da cor no mesmo corpo.

O movimento qualitativo é, portanto, mais perfeito que o quantitativo, porque pertence mais intimamente à forma, e não apenas à matéria.
Ele atinge a essência do sensível, que é a capacidade de sofrer alteração.

Por isso, Aristóteles chama a alteração de movimento mais próprio da natureza, porque nela o corpo mostra sua aptidão formal para receber contrários.

E Alberto acrescenta:
“Alteratio est motus sensibilis maxime manifestus, quia secundum eam corpora sentiuntur moveri.”
A alteração é o movimento sensível mais manifesto, porque segundo ela os corpos são percebidos como movendo-se.

A alteração se dá de três modos:

  1. Secundum qualitatem activam, como o calor e o frio;
  2. Secundum habitum, como a aquisição ou perda de uma disposição;
  3. Secundum formam accidentalem, como o brilho, a cor ou o sabor.

Em todos esses casos, há um sujeito que permanece, uma qualidade que varia, e uma continuidade perceptível entre os extremos.

Contudo, deve-se notar que a alteração não é sempre gradual em tempo sensível; certas alterações intensas podem parecer instantâneas, embora tenham movimento intrínseco imperceptível.

Por isso, Alberto afirma:
“Ubi non apparet medium, non semper deficit motus, sed potest esse sub momento, sicut in illuminatione et calefactione violenta.”
Onde não aparece meio, não é necessário que falte o movimento, mas ele pode existir sob um instante, como na iluminação e no aquecimento violento.

Assim, a alteração é um movimento real, embora variável em velocidade, intensidade e modo segundo a natureza do sujeito e da causa.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que entre contrários há sempre meios proporcionais segundo a intensidade. Entre o quente e o frio há o morno; entre o branco e o preto, o cinzento. Assim, há movimento possível entre os extremos.
  2. À segunda, responde-se que, embora a forma qualitativa seja simples, sua presença no sujeito admite graus de participação. O mais e o menos constituem o movimento enquanto ato imperfeito da potência qualitativa.
  3. À terceira, deve-se dizer que a alteração não requer movimento local, porque é movimento intrínseco. O fato de ocorrer rapidamente não a torna instantânea em essência, mas apenas veloz na execução.
  4. À quarta, responde-se que a qualidade é fixa enquanto termo, mas móvel enquanto disposição. A brancura enquanto tal é imóvel; mas o tornar-se branco é movimento.

Conclusão.

movimento na qualidade, e esse movimento é a alteração, pela qual o mesmo sujeito passa gradualmente de uma disposição qualitativa a outra, conservando sua substância.
Esse movimento é mais íntimo e formal do que o quantitativo, pois atinge a capacidade ativa e passiva das coisas naturais.

E Alberto conclui:
“Alteratio est motus in qualitate, et est actus potentiae qualitativae, prout perficitur successive inter contraria in eodem subiecto.”
A alteração é o movimento na qualidade, e é o ato da potência qualitativa enquanto se aperfeiçoa sucessivamente entre os contrários no mesmo sujeito.

Quaestio VI — Utrum motus sit in loco

(Se há movimento no lugar)

Objeções.

  1. Parece que não há movimento no lugar, pois o lugar não é algo real, mas apenas relação entre o corpo e o que o circunda. Ora, não se pode mover em uma relação, mas apenas em algo que exista em si mesmo. Logo, o movimento não está no lugar, mas apenas segundo o lugar.
  2. Além disso, o movimento local requer um meio contínuo pelo qual o corpo passe. Ora, o meio é o espaço, e o espaço, segundo Aristóteles, não é substância nem acidente, mas algo dependente dos corpos. Logo, não há movimento “no” lugar, mas “de” um lugar a outro.
  3. Ademais, o movimento local é o mais geral e comum, porque se aplica a todos os corpos. Ora, o universal não está em um gênero, mas é anterior a todos. Logo, o movimento local não é em lugar algum, mas é princípio de todos os outros movimentos.
  4. Ainda, aquilo em que algo está, não se move consigo, mas permanece imóvel. Ora, o lugar é aquilo em que o corpo está. Logo, o lugar deve permanecer imóvel, e o corpo se mover relativamente a ele. Mas se o lugar é imóvel, não há movimento “no” lugar, mas “quanto ao” lugar.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro IV da Física, ensina:
“Motus localis est primus et communissimus omnium motuum.”
O movimento local é o primeiro e o mais comum de todos os movimentos.

E Alberto comenta:
“Motus in loco dicitur proprie, quia in eo est actus potentiae corporea secundum ordinem ad ubi et ad circumstantiam.”
O movimento no lugar é dito propriamente, porque nele está o ato da potência corpórea segundo a ordenação ao “onde” e ao que circunda.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que há movimento no lugar, e esse movimento é o movimento local (motus secundum locum), que consiste na translação de um corpo de um ponto do espaço a outro, conservando sua substância e quantidade.

Com efeito, o lugar, segundo Aristóteles, é “superficies corporis ambientis” — a superfície do corpo que envolve o corpo móvel.
O movimento local é, portanto, a variação contínua da relação entre o corpo móvel e o corpo que o circunda.

Diz Alberto:
“Motus in loco est translatio corporis mobilis secundum ordinem ad circumstans immobile.”
O movimento no lugar é a translação do corpo móvel segundo a relação ao circundante imóvel.

Assim, quando o corpo se move, não muda sua substância, nem sua quantidade ou qualidade, mas apenas o ubi, isto é, a posição relativa ao ambiente.

O movimento local é o mais perfeito dos movimentos físicos, porque não altera a natureza do corpo, mas manifesta a atualidade de sua potência espacial.
É também o mais universal, porque todo corpo está em algum lugar e pode ser deslocado.

Por isso, Alberto o chama de “motus nobilissimus”, o movimento mais nobre, por não destruir nem corromper o sujeito, mas conservar-lhe o ser na mudança.

Além disso, o movimento local é o fundamento do tempo, porque o tempo mede a continuidade do deslocamento.
O tempo é número do movimento segundo o antes e o depois, e o movimento local é o primeiro em que essa numeração se torna evidente.

Portanto, o movimento no lugar é a expressão sensível da continuidade do ser no espaço, e o tipo mais próprio de movimento para os corpos físicos.

Contudo, Alberto observa que o movimento local não é em todo lugar, mas de um lugar a outro:
“Motus non est in loco sicut in continente, sed in ipso mobili secundum ordinem ad locum.”
O movimento não está no lugar como em continente, mas no próprio móvel segundo a relação ao lugar.

Assim, dizer que há movimento “no lugar” é dizer que há mudança na relação do corpo com o ambiente, não que o lugar mesmo se mova.
O lugar é imóvel; o corpo é móvel.

Dessa distinção nasce a definição rigorosa de Alberto:
“Motus localis est actus corporis in potentia ad ubi, prout est in potentia ad aliud ubi.”
O movimento local é o ato do corpo em potência ao “onde”, enquanto está em potência a outro “onde”.

Por conseguinte, o movimento local é o primeiro de todos, porque independe de alteração intrínseca;
é o mais contínuo, porque o espaço é contínuo;
e é o mais sensível, porque é perceptível a todos os sentidos.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o lugar é relação real entre o corpo e o ambiente, e essa relação se altera de modo contínuo. Logo, o movimento “no lugar” é movimento real, embora o lugar não exista como substância.
  2. À segunda, responde-se que o meio é apenas o campo contínuo da relação espacial, e não precisa ser substância. O movimento é real enquanto relação variável, não enquanto espaço absoluto.
  3. À terceira, deve-se dizer que o movimento local é universal, mas não extragenérico. É o gênero mais comum de movimento físico, não porque não pertença a nenhum, mas porque está em todos os corpos materiais.
  4. À quarta, responde-se que o lugar é imóvel por definição, e o corpo se move em relação a ele. Dizer “em lugar” significa “com respeito ao ambiente fixo”, não “dentro de um recipiente em movimento”.

Conclusão.

movimento no lugar, e esse movimento é a translação (motus localis), pela qual o corpo muda continuamente sua posição em relação ao ambiente imóvel.
Esse movimento é o mais nobre e universal dos movimentos, pois conserva o sujeito em sua substância e expressa a continuidade do ser no espaço.

E Alberto conclui:
“Motus localis est primus motuum, in quo manifestatur perfectio mobilitatis, quia manet idem secundum essentiam et variatur secundum ubi.”
O movimento local é o primeiro dos movimentos, no qual se manifesta a perfeição da mobilidade, porque o mesmo sujeito permanece segundo a essência e varia segundo o lugar.

Quaestio VII — Utrum omnis motus sit continuus

(Se todo movimento é contínuo)

Objeções.

  1. Parece que nem todo movimento é contínuo, pois o movimento pode ocorrer por saltos ou intervalos. Ora, o movimento dos corpos celestes é contínuo, mas o de certas coisas geradas e corrompidas parece interrompido, como o da chama que se acende e apaga sucessivamente. Logo, nem todo movimento é contínuo.
  2. Além disso, a continuidade exige um sujeito uno e um tempo uno. Ora, há movimentos em sujeitos diversos, e há tempos que se interrompem. Logo, nem todo movimento é contínuo.
  3. Ademais, se o movimento fosse sempre contínuo, não haveria mudança instantânea. Ora, vemos que certas mudanças, como o congelamento da água ou o acendimento da luz, ocorrem de modo instantâneo. Logo, nem todo movimento é contínuo.
  4. Ainda, Aristóteles diz que o movimento é o ato do ente em potência enquanto tal. Ora, a potência não se atualiza senão por instantes distintos. Logo, o movimento, sendo ato da potência, é sucessão descontínua de atualizações, e não continuidade perfeita.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VI da Física, ensina:
“Omnis motus est continuus secundum naturam suam.”
Todo movimento é contínuo segundo sua própria natureza.

E Alberto comenta:
“Ubi est medium inter extrema et subiectum permanens, ibi est motus continuus.”
Onde há meio entre os extremos e sujeito permanente, aí o movimento é contínuo.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que todo movimento é contínuo por natureza, embora possa parecer interrompido por acidente.

O movimento, enquanto ato do ente em potência, é sucessão ordenada de estados intermediários entre dois extremos contrários — o início e o termo.
Ora, entre esses extremos há sempre um meio contínuo, porque a potência se reduz ao ato por gradações proporcionais.

Diz Alberto:
“Continuum est cuius partes sunt conjunctae secundum contactum et ordinem.”
O contínuo é aquilo cujas partes estão unidas por contato e ordem.

Ora, no movimento verdadeiro há união e ordem entre os instantes de tempo e as posições do sujeito: o que era “antes” torna-se “depois” sem lacuna.
Logo, o movimento é contínuo.

A descontinuidade só ocorre por acidente — quando o sujeito deixa de existir, ou quando a causa do movimento cessa.
Por exemplo, a pedra que cai sofre interrupção se for detida; mas em si mesma, sua tendência é a continuidade até o repouso natural.

Portanto, o movimento, quanto à sua essência, é contínuo; quanto ao seu exercício, pode ser interrompido.

Por isso, Alberto distingue entre continuidade essencial e continuidade temporal:
“Motus est continuus essentialiter, quia actus potentiae secundum ordinem partium temporis; sed potest esse discontinuus temporaliter, si causae vel subiecta deficiant.”
O movimento é contínuo essencialmente, porque é ato da potência segundo a ordem das partes do tempo; mas pode ser descontínuo temporalmente, se as causas ou os sujeitos falharem.

A continuidade do movimento depende de três condições:

  1. Subiectum permanens – o sujeito que permanece o mesmo durante a mudança;
  2. Tempus continuum – o tempo sem interrupção;
  3. Medium proportionatum – o meio proporcional entre os extremos.

Onde esses três estão unidos, o movimento é contínuo de modo necessário.

A razão disso é metafísica: o movimento é o modo da passagem entre potência e ato, e essa passagem não se dá por saltos, mas por transição ordenada.
O que muda instantaneamente, muda sem movimento, como a geração e a corrupção, que são transições de um ser a outro, não movimentos, mas substituições de formas.

Por isso, Aristóteles e Alberto distinguem:

  • “Generatio et corruptio sunt mutationes instantaneae, motus autem est successivus et continuus.”
    A geração e a corrupção são mudanças instantâneas; o movimento, porém, é sucessivo e contínuo.

Logo, onde há movimento, há continuidade.
O instante é limite do tempo, e o repouso é termo do movimento; entre ambos, há sempre continuidade.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que as interrupções sensíveis não são do movimento enquanto tal, mas de sua causa. A chama que se apaga não interrompe o movimento essencial do fogo, mas cessa seu ser atual.
  2. À segunda, responde-se que o movimento de sujeitos diversos é diverso, e o tempo de um não é o tempo do outro. Mas cada movimento particular, tomado em si, é contínuo enquanto dura no mesmo sujeito e tempo.
  3. À terceira, deve-se dizer que as mudanças instantâneas, como a iluminação, não são movimentos propriamente ditos, mas transições súbitas de ato a ato, sem meio contínuo. Logo, não pertencem à definição de movimento.
  4. À quarta, responde-se que a potência se atualiza por gradações sucessivas, não por saltos de instante a instante. O instante é apenas o limite entre dois tempos; o movimento é o que preenche o tempo.

Conclusão.

Todo movimento é contínuo por natureza, porque é a passagem ordenada da potência ao ato por meio de gradações proporcionais no mesmo sujeito e no mesmo tempo.
A descontinuidade só ocorre por acidente, quando o sujeito ou a causa cessam.

E Alberto conclui:
“Omnis motus naturalis est continuus, quia natura tendit in finem per media, et non per saltus.”
Todo movimento natural é contínuo, porque a natureza tende ao fim por meios graduais e não por saltos.

Quaestio VIII — Utrum sit possibile motum infinitum esse

(Se é possível que exista movimento infinito)

Objeções.

  1. Parece que é possível o movimento infinito, pois o tempo é infinito, e o movimento é a medida do tempo. Se o tempo não tem começo nem fim, o movimento, que o acompanha, também não teria limite. Logo, é possível um movimento infinito.
  2. Além disso, os corpos celestes movem-se perpetuamente, sem cessar nem se corromper. Mas o movimento deles não tem interrupção nem fim. Logo, há movimento infinito ao menos no céu.
  3. Ademais, o infinito pertence à natureza do contínuo, e todo movimento é contínuo. Logo, todo movimento contém infinitude em potência, e, portanto, é possível que algum seja infinito em ato.
  4. Ainda, Deus é causa do movimento, e sua potência é infinita. Ora, efeito adequado de causa infinita é movimento infinito. Logo, o movimento infinito é possível.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, afirma:
“Infinita actu neque est motus neque tempus.”
Nem o movimento nem o tempo são infinitos em ato.

E Alberto comenta:
“Infinita in actu non sunt in natura, sed solum in potentia; quia omne motum determinat subiectum et finis.”
As coisas infinitas em ato não existem na natureza, mas apenas em potência, porque todo movimento é determinado por um sujeito e por um fim.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que não é possível movimento infinito em ato, mas apenas em potência.

Com efeito, o movimento requer três coisas: um agente, um sujeito e um termo.
Se um desses faltasse, o movimento não poderia existir. Ora, o termo é necessariamente determinado, pois é o fim da passagem da potência ao ato.

Diz Alberto:
“Motus est transitus de potentia in actum determinatum; sed infinitum non habet determinationem, ergo non potest esse motus infinitus.”
O movimento é a transição da potência a um ato determinado; mas o infinito não tem determinação, portanto não pode haver movimento infinito.

O movimento é contínuo, mas não indefinido; é sucessão ordenada de partes finitas dentro de um tempo finito.
A infinitude que lhe pertence é apenas segundo a divisibilidade, não segundo a extensão real.

Assim, há duas espécies de infinito segundo Alberto:

  1. Infinito secundum divisionem, que é a possibilidade de subdividir o contínuo sem fim;
  2. Infinito secundum extensionem, que seria grandeza real sem limite.

O primeiro convém ao movimento em potência, o segundo é impossível na natureza.

Por isso, ele conclui:
“Motus est infinitus in potentia, quia semper potest addi pars post partem; sed in actu est finitus, quia semper determinatur per terminum.”
O movimento é infinito em potência, porque sempre se pode adicionar parte após parte; mas em ato é finito, porque sempre é determinado por um termo.

Quanto aos corpos celestes, seu movimento é perpétuo, mas não infinito: é sucessivo e sem cessação, mas cada volta tem medida e fim.
O movimento é sem fim no tempo, não no ato; há infinitude de repetições, não infinitude de extensão.

Alberto distingue, assim, entre motus perpetuus e motus infinitus:

  • O primeiro é movimento que não cessa no tempo;
  • O segundo seria movimento sem limite intrínseco, o que é impossível.

E acrescenta:
“Perpetuitas non est infinitas; quia perpetuum est secundum successionem temporis, infinitum autem esset sine ordine partium.”
A perpetuidade não é infinitude; porque o perpétuo é segundo a sucessão temporal, o infinito seria sem ordem de partes.

Logo, embora o movimento dos céus não cesse, ele é sempre finito em cada ato de rotação.
Deus é causa de sua continuidade, mas não de uma infinitude real no movimento.

Assim, o movimento infinito é impossível em ato, tanto por razão natural (pois todo ato é determinado), quanto por razão lógica (pois o infinito é privação de limite, e a determinação é o princípio do movimento).


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o tempo é infinito apenas segundo a sucessão, não em ato. O movimento, portanto, é finito em cada segmento de tempo.
  2. À segunda, responde-se que o movimento celeste é perpétuo, mas cada revolução é finita. A sucessão infinita de movimentos não constitui um único movimento infinito, mas uma série ordenada de movimentos finitos.
  3. À terceira, deve-se dizer que o movimento contém infinitude em potência, não em ato; pois sempre se pode acrescentar nova parte, mas nunca todas simultaneamente.
  4. À quarta, responde-se que a potência infinita de Deus causa movimento perpétuo, mas não movimento infinito em ato. O efeito finito convém à potência infinita enquanto ordenada à finitude da criação.

Conclusão.

Não é possível movimento infinito em ato, mas apenas em potência, enquanto a divisão e a sucessão temporal são indefinidas.
O movimento é sempre finito em cada ato, determinado por sujeito e fim.

E Alberto conclui:
“Infinita non sunt in actu in rebus naturalibus, sed solum in potentia; unde motus infinitus actu est impossibilis.”
As coisas infinitas não existem em ato nas realidades naturais, mas apenas em potência; por isso, o movimento infinito em ato é impossível.

Quaestio IX — Utrum motus habeat principium et finem in tempore

(Se o movimento tem princípio e fim no tempo)

Objeções.

  1. Parece que o movimento não tem princípio nem fim no tempo, pois o tempo é medida do movimento, e se o tempo é contínuo e infinito segundo a sucessão, o movimento que o acompanha deve também carecer de princípio e de fim.
  2. Além disso, o movimento é ato de potência ordenada ao ato. Ora, a potência é sempre anterior ao ato e nunca inteiramente exaurida, pois sempre permanece potência de um novo ato. Logo, o movimento, enquanto ato da potência, não pode ter princípio nem fim.
  3. Ademais, o movimento dos corpos celestes é eterno e ininterrupto. Mas o eterno não tem princípio nem fim. Logo, há movimento sem começo e sem término.
  4. Ainda, o que tem princípio e fim é limitado. Ora, o movimento, enquanto continuidade natural, pertence ao infinito em potência. Logo, não pode ser limitado por princípio e fim.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VIII da Física, ensina:
“Omnis motus qui est actu, habet principium et finem.”
Todo movimento que existe em ato tem princípio e fim.

E Alberto comenta:
“In quolibet motu finito necesse est inveniri terminum a quo et terminum ad quem; quorum primus est principium motus, secundus est finis.”
Em todo movimento finito é necessário encontrar o termo de onde e o termo para o qual; o primeiro é o princípio do movimento, o segundo é o fim.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que todo movimento em ato tem princípio e fim no tempo, embora o movimento como espécie natural possa ser contínuo e perpétuo segundo a sucessão.

Com efeito, o movimento é ato do ente em potência, e todo ato que é sucessivo exige dois extremos: o a quo, de onde começa, e o ad quem, para onde tende.
Sem esses extremos, não há continuidade, mas eternidade, e o movimento pertence à ordem do tempo, não à do ser eterno.

Diz Alberto:
“Motus est actus incompletus inter principium et finem, et propter hoc in tempore est, quod est numerus motus secundum prius et posterius.”
O movimento é ato incompleto entre princípio e fim, e por isso está no tempo, que é o número do movimento segundo o antes e o depois.

Todo movimento, enquanto considerado em ato, é finito, pois há um sujeito determinado e uma forma determinada segundo a qual se move.
Se fosse sem princípio nem fim, seria ato completo e eterno, e deixaria de ser movimento.

Assim, o movimento é o que está entre dois repousos:

  • o repouso anterior, no qual o sujeito estava em potência pura;
  • o repouso posterior, no qual atinge o termo de seu ato.

Portanto, em toda passagem real há um antes e um depois — o antes é o princípio, o depois é o fim.

Mesmo no caso do movimento celeste, que é perpétuo, cada revolução tem princípio e fim: o início e o término de um ciclo.
O todo é sem cessar, mas cada ato é limitado.

Por isso, Alberto distingue:

  1. Motus totus perpetuus, que não cessa segundo a espécie;
  2. Motus particularis, que tem princípio e fim segundo o tempo.

E explica:
“Motus caeli est perpetuus specie, finitus autem numero et tempore, quia singulae revolutiones habent principium et finem.”
O movimento do céu é perpétuo quanto à espécie, mas finito quanto ao número e ao tempo, porque cada revolução tem princípio e fim.

A razão metafísica disso é que o tempo mede o movimento, e o tempo é constituído de partes ordenadas.
Logo, onde há partes do tempo, há princípio e fim.
Somente o eterno é sem princípio, porque não é numerável; o tempo é numerável, e o movimento é contado por ele.

Por conseguinte, o movimento participa da finitude do tempo e da continuidade da natureza, sendo finito em ato, mas indefinido em potência.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o tempo é infinito segundo a sucessão, mas todo intervalo de tempo é finito. Assim, cada movimento particular tem princípio e fim, embora o todo do tempo não tenha limite segundo a ordem sucessiva.
  2. À segunda, responde-se que a potência é sempre anterior ao ato, mas o ato se completa em cada passagem. O movimento tem começo quando a potência se atualiza e termina quando o ato é alcançado.
  3. À terceira, deve-se dizer que o movimento celeste é eterno por sucessão, mas não infinito no ato; cada rotação é finita. A perpetuidade pertence à espécie, não ao ato singular.
  4. À quarta, responde-se que o movimento é infinito em potência quanto à divisibilidade, mas finito quanto ao ato e à execução. Por isso, o movimento não pode existir sem princípio nem fim.

Conclusão.

Todo movimento tem princípio e fim no tempo, porque é ato sucessivo de um sujeito finito que passa da potência ao ato determinado.
O movimento é perpétuo apenas quanto à espécie e à sucessão, mas em cada ato particular é limitado pelo início e pelo término.

E Alberto conclui:
“Motus in tempore finitur, quia tempus est mensura finiti, et solius aeternitatis est carere principio et fine.”
O movimento é finito no tempo, porque o tempo é medida do finito, e só a eternidade carece de princípio e de fim.

Quaestio X — Utrum tempus sit mensura motus

(Se o tempo é medida do movimento)

Objeções.

  1. Parece que o tempo não é medida do movimento, pois o tempo, segundo Aristóteles, é número segundo o antes e o depois. Ora, o número é medido, não mede. Logo, o tempo é medido pelo movimento, e não o contrário.
  2. Além disso, a medida deve ser mais certa e imutável que o medido. Ora, o movimento é variável, e o tempo depende dele. Logo, o tempo não pode medir o movimento, porque depende do mesmo.
  3. Ademais, a medida deve ser algo extrínseco ao medido, mas o tempo está no próprio movimento, e ambos se confundem segundo a continuidade. Logo, o tempo não mede o movimento, mas o acompanha.
  4. Ainda, o que mede deve ser proporcional a todas as espécies do medido. Ora, há movimentos rápidos e lentos, contínuos e interrompidos. Se o tempo fosse a medida, deveria variar com eles, e então não seria medida universal. Logo, o tempo não é medida do movimento.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro IV da Física, ensina:
“Tempus est numerus motus secundum prius et posterius.”
O tempo é o número do movimento segundo o antes e o depois.

E Alberto comenta:
“Tempus est mensura motus, sicut numerus est mensura continui; quia mensurat actum mobilis secundum successionem.”
O tempo é a medida do movimento, assim como o número é a medida do contínuo, porque mede o ato do móvel segundo a sucessão.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o tempo é verdadeiramente a medida do movimento, mas não por essência própria, e sim por analogia e participação.

Com efeito, a medida é aquilo pelo qual se conhece “quanto” uma coisa é. Ora, o movimento é sucessão ordenada de atos, e o tempo é o número que mensura essa sucessão segundo o antes e o depois.

Diz Alberto:
“Mensura est id per quod cognoscitur quantum rei; tempus autem determinat quantum durationis motus, ergo est mensura ejus.”
A medida é aquilo pelo qual se conhece o quanto de uma coisa; o tempo determina o quanto de duração do movimento, portanto é sua medida.

Assim, o tempo mede o movimento sob dois aspectos:

  1. Quantitativo, enquanto determina o quanto da duração;
  2. Ordenativo, enquanto dispõe os atos segundo o antes e o depois.

No primeiro aspecto, o tempo é como o número que conta as partes do movimento; no segundo, é como a regra que estabelece sua continuidade.

O tempo, porém, não mede o movimento extrinsecamente, como uma régua mede o comprimento, mas intrinsecamente, enquanto é correlato ao próprio movimento.
Pois tempo e movimento se implicam: sem movimento não há tempo, e sem tempo não há percepção da sucessão.

Por isso, Alberto distingue dois modos de mensuração:
“Tempus mensurat motum essentialiter, quia est mensura ejus durationis; sed motus mensurat tempus accidentaliter, quia per eum cognoscitur tempus.”
O tempo mede o movimento essencialmente, porque é medida de sua duração; mas o movimento mede o tempo acidentalmente, porque por ele se conhece o tempo.

Dessa forma, há uma reciprocidade: o tempo mede o movimento como ato da duração, e o movimento manifesta o tempo como sua expressão física.

A continuidade do tempo provém da continuidade do movimento, mas a mensuração provém da alma, que numera a sucessão.
O tempo é, portanto, simultaneamente físico e psíquico: físico quanto à continuidade, e psíquico quanto à numeração.

Diz ainda Alberto:
“Tempus est in anima secundum numerationem, in re autem secundum continuationem motus.”
O tempo está na alma segundo a numeração, e na realidade segundo a continuidade do movimento.

Por isso, o tempo não é o movimento, mas sua medida formal, isto é, a determinação de sua duração.
Ele é, pois, intermediário entre o ser e o ato, como imagem da eternidade nas coisas mutáveis.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o número em si é medido, mas enquanto aplicado a algo, mede. Assim também o tempo, enquanto conceito abstrato, é numerável; enquanto ato da alma que numera, é medida.
  2. À segunda, responde-se que, embora o movimento varie, o tempo o mede segundo o modo de sua variação. A medida não precisa ser imóvel em toda ordem, mas apenas proporcional ao medido.
  3. À terceira, deve-se dizer que o tempo mede o movimento intrinsecamente, não como continente, mas como relação ordenada. Assim, embora estejam ligados, um é princípio de conhecimento do outro.
  4. À quarta, responde-se que a variedade dos movimentos não impede a unidade da medida, porque o tempo mede todos segundo o mesmo fundamento — a sucessão. Assim como o número mede grandes e pequenos por uma mesma unidade, o tempo mede rápidos e lentos por um mesmo contínuo.

Conclusão.

O tempo é a medida do movimento, não extrinsecamente, mas por analogia, enquanto determina o quanto e a ordem da sucessão das partes do movimento.
Ele é a expressão formal da continuidade do ser no espaço e a imagem sensível da eternidade na mutabilidade.

E Alberto conclui:
“Tempus est mensura motus secundum prius et posterius, et est medium inter aeternitatem et mutationem.”
O tempo é a medida do movimento segundo o antes e o depois, e é o meio entre a eternidade e a mutação.

Quaestio XI — Utrum tempus sit reale vel rationis tantum

(Se o tempo é algo real ou apenas de razão)

Objeções.

  1. Parece que o tempo não é algo real, mas apenas de razão, pois o tempo é o número do movimento, e o número existe apenas na alma que conta. Ora, aquilo que existe somente na alma não é realidade extramental, mas ente de razão. Logo, o tempo não é real, mas de razão.
  2. Além disso, o tempo mede o movimento, e a medida, como o número, é operação intelectual. Portanto, o tempo não é coisa real, mas conceito ordenado pela mente.
  3. Ademais, se o tempo fosse algo real, deveria ter ser próprio distinto do movimento. Mas ele não se distingue do movimento senão pela consideração da alma. Logo, o tempo é apenas modo de pensar o movimento, e não algo que exista fora da mente.
  4. Ainda, tudo que é real tem continuidade substancial; mas o tempo é contínuo apenas segundo a imaginação e o discurso. Logo, o tempo não é real, mas aparência racional.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro IV da Física, ensina:
“Tempus est numerus motus secundum prius et posterius.”
O tempo é o número do movimento segundo o antes e o depois.

E Alberto comenta:
“Tempus habet fundamentum reale in motu, sed completur per rationem numerantis.”
O tempo tem fundamento real no movimento, mas é completado pela razão que o numera.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o tempo é parcialmente real e parcialmente de razão, pois contém em si dois aspectos inseparáveis:
um fundamento ontológico real e uma determinação racional.

O fundamento real do tempo está no movimento, que é sucessão real das partes do ser em ato;
a determinação racional está na alma, que apreende e numera essa sucessão como antes e depois.

Assim, há no tempo uma biface ontológica:

  • secundum rem, enquanto continuação do movimento;
  • secundum rationem, enquanto número do movimento.

Diz Alberto:
“Tempus in re est successio motus, in intellectu vero est numerus ejus.”
O tempo, na realidade, é a sucessão do movimento; no intelecto, é o número deste.

Essa duplicidade mostra que o tempo não é pura ficção da mente, pois tem base objetiva — o movimento real no mundo físico —,
mas também não é substância real, pois depende da operação cognitiva para ser conhecido e medido.

Logo, o tempo não é coisa, mas relação real fundada em movimento e formalizada pela inteligência.

Por isso, Alberto o define como um ens rationis cum fundamento in re — um ente de razão com fundamento na realidade.

E explica:
“Si esset solum in anima, non esset mensura motus, quia anima non causat successionem; et si esset solum in re, non esset numerus, quia numeratio est actus mentis.”
Se existisse apenas na alma, o tempo não seria medida do movimento, porque a alma não causa a sucessão;
e se existisse apenas na coisa, não seria número, porque a numeração é ato da mente.

Assim, o tempo é o entrelaçamento do real e do racional — é a consciência da mudança enquanto medida do ser móvel.

Essa concepção permite distinguir três graus de temporalidade:

  1. Tempus reale, que é o fluir do movimento das coisas;
  2. Tempus phantasticum, que é a imagem sensível do movimento na imaginação;
  3. Tempus numeratum, que é o tempo formal, conhecido e contado pela razão.

O primeiro é no mundo; o segundo, na alma sensitiva; o terceiro, na alma racional.
E todos convergem na unidade do fenômeno temporal que experimentamos.

Por isso, Alberto acrescenta:
“Tempus est in motu sicut in fundamento, in anima sicut in numero, et in Deo sicut in causa mensurante.”
O tempo está no movimento como em seu fundamento, na alma como em seu número, e em Deus como em sua causa mensurante.

Deus, sendo ato puro e imóvel, é o princípio que dá medida à sucessão temporal sem nela participar.
O tempo, portanto, é realidade derivada, dependente da mutabilidade criada, imagem da eternidade nas coisas que passam.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o tempo é número do movimento enquanto contado pela alma, mas é também movimento numerável enquanto existe fora dela. Logo, não é pura ficção, mas relação real-numérica.
  2. À segunda, responde-se que a medida é intelectual quanto à forma, mas fundada na realidade quanto ao conteúdo. Assim, o tempo é simultaneamente físico e inteligível.
  3. À terceira, deve-se dizer que o tempo distingue-se realmente do movimento como o número da coisa numerada: não por separação de ser, mas por diferença formal.
  4. À quarta, responde-se que a continuidade do tempo é real enquanto continuidade do movimento; e imaginária apenas quanto à sua representação mental.

Conclusão.

O tempo não é pura entidade da razão, nem coisa real em si, mas relação fundada no movimento e completada pela razão.
É ente de razão com fundamento real, expressão mista de realidade e intelecção, pela qual a alma humana participa da ordem mutável do mundo.

E Alberto conclui:
“Tempus est medium inter ens reale et ens rationis, habens fundamentum in motu et completionem in intellectu.”
O tempo é meio entre o ente real e o ente de razão, tendo fundamento no movimento e perfeição no intelecto.

Quaestio XII — Utrum sit possibile esse tempus infinitum

(Se é possível que o tempo seja infinito)

Objeções.

  1. Parece que é possível que o tempo seja infinito, pois o tempo mede o movimento, e há movimento eterno, como o movimento dos corpos celestes. Logo, se o movimento é eterno, também o tempo o será.
  2. Além disso, o tempo é o número do movimento segundo o antes e o depois. Ora, o antes e o depois não têm fim, porque sempre há algo que foi e algo que será. Logo, o tempo, que mede essa sucessão, é infinito.
  3. Ademais, o tempo é sucessão de partes divisíveis; e o divisível, por natureza, é infinito em potência. Mas o tempo nunca é todo presente, sendo sempre parte passada e parte futura. Logo, o tempo é infinito.
  4. Ainda, se o tempo tivesse começo, deveria haver um instante anterior ao tempo, o que é impossível; e se tivesse fim, haveria instante posterior ao tempo, o que também é contraditório. Logo, o tempo é eterno e infinito.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VIII da Física, ensina:
“Tempus non est infinitum in actu, sed in potentia.”
O tempo não é infinito em ato, mas em potência.

E Alberto comenta:
“Infinitum actu non est nisi in Deo; tempus autem est in rebus mutabilibus, quae finitae sunt secundum esse.”
O infinito em ato só existe em Deus; o tempo, porém, está nas coisas mutáveis, que são finitas quanto ao ser.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o tempo não é infinito em ato, mas em potência, isto é, quanto à sucessão interminável das partes que podem sempre ser acrescentadas ou passadas.

O infinito em ato é aquilo que contém todas as partes simultaneamente; o infinito em potência é aquilo que nunca é todo, porque sempre pode crescer ou diminuir.
O tempo pertence ao segundo modo.

Diz Alberto:
“Tempus non est totum simul, sed est fluxus partium secundum prius et posterius; ideo est infinitum in potentia, quia semper est aliquid futurum et aliquid praeteritum.”
O tempo não é todo simultâneo, mas fluxo de partes segundo o antes e o depois; por isso é infinito em potência, porque sempre há algo futuro e algo passado.

O tempo não pode ser infinito em ato porque isso implicaria eternidade, e a eternidade é atributo próprio de Deus, que é ato puro sem sucessão.
O tempo, ao contrário, é medido pelo movimento das coisas finitas, que têm princípio e fim.

O movimento celeste é dito perpétuo, não porque seja infinito em ato, mas porque é sem cessação de espécie — sua continuidade não implica infinitude atual, mas repetição ordenada.

Assim, há diferença entre perpetuitas e infinitas:

  • perpetuitas é duração sem interrupção, mas com partes sucessivas;
  • infinitas é ausência de toda limitação, inclusive sucessiva.

Diz Alberto:
“Tempus caeli est perpetuum specie, non infinitum actu; quia in perpetuitate est ordo partium, in infinitate autem nulla est ordo nec terminus.”
O tempo do céu é perpétuo quanto à espécie, mas não infinito em ato; pois na perpetuidade há ordem das partes, enquanto na infinitude não há ordem nem termo.

Além disso, o tempo está essencialmente ligado à mutabilidade: onde há mudança, há tempo; onde há imutabilidade, há eternidade.
Se o tempo fosse infinito em ato, o movimento seria igualmente sem princípio nem fim, o que negaria a contingência do mundo e a distinção entre Criador e criatura.

Portanto, o tempo, embora não tenha fim segundo a sucessão, tem sempre princípio e fim em cada movimento particular, e só Deus abarca toda a duração sem antes nem depois.

Por isso, Alberto declara:
“Tempus est infinitum in potentia, quia semper potest addi; sed non in actu, quia non est totum simul nec habet esse perfectum.”
O tempo é infinito em potência, porque sempre se pode acrescentar algo; mas não em ato, porque não é todo simultâneo nem possui ser perfeito.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o movimento celeste é eterno segundo sucessão, mas finito em cada rotação. O tempo, portanto, é indefinido, não infinito.
  2. À segunda, responde-se que o antes e o depois são sem fim em potência, mas não em ato; o tempo mede essa ordem, e assim participa da infinitude apenas segundo a possibilidade de continuidade.
  3. À terceira, deve-se dizer que a infinitude do tempo é segundo a divisibilidade, não segundo o ser. Pois o tempo nunca é todo, e o que nunca é todo não é infinito atual, mas sucessivo.
  4. À quarta, responde-se que o tempo não tem um “antes” fora de si, porque o instante inicial pertence-lhe como primeiro limite, e o mesmo quanto ao final. Assim, tem princípio e fim segundo os movimentos particulares, mas é indefinido quanto à sucessão.

Conclusão.

O tempo não é infinito em ato, mas apenas em potência, enquanto pode ser sempre prolongado pela sucessão das coisas mutáveis.
Ele é finito em cada parte, mas indefinido em continuidade; perpétuo quanto à ordem, limitado quanto ao ser.

E Alberto conclui:
“Tempus est infinitum potentia, finitum actu; perpetuum secundum speciem, terminatum secundum partes; imago aeternitatis, sed non ipsa aeternitas.”
O tempo é infinito em potência, finito em ato; perpétuo quanto à espécie, limitado quanto às partes; imagem da eternidade, mas não a própria eternidade.

Quaestio XIII — Utrum sit aliquis motus aeternus

(Se existe algum movimento eterno)

Objeções.

  1. Parece que nenhum movimento é eterno, pois todo movimento implica mudança e passagem do ser ao não ser, o que se opõe à eternidade. O eterno, de fato, é imutável, enquanto o movimento é o contrário da imutabilidade. Logo, não pode haver movimento eterno.
  2. Além disso, todo movimento supõe potência e ato. Mas a potência é limitada, e o ato consumado põe fim ao movimento. Assim, sendo finita a potência, finito será também o movimento.
  3. Ademais, se algum movimento fosse eterno, deveria proceder de causa eterna e imóvel. Ora, a causa eterna e imóvel é Deus. Mas Deus, sendo ato puro, não se move nem se altera. Logo, dele não pode proceder movimento eterno.
  4. Ainda, tudo que se move está sujeito ao tempo. Ora, o tempo não é infinito em ato, como foi provado acima. Logo, nenhum movimento pode ser infinito nem eterno.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VIII da Física, ensina:
“Motus caeli est perpetuus et aeternus, quia motor ejus est aeternus et immutabilis.”
O movimento do céu é perpétuo e eterno, porque seu motor é eterno e imutável.

E Alberto comenta:
“Est motus perpetuus in caelo, non per se aeternus, sed per participationem primi motoris.”
Há movimento perpétuo no céu, não por si mesmo eterno, mas por participação do primeiro motor.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que existe movimento eterno, não por essência própria, mas por dependência de causa eterna, isto é, de Deus, que é motor imóvel.

O movimento em si mesmo é finito quanto à potência e à duração das partes, mas pode ser perpétuo quanto à continuidade, se sua causa for sempre atual e jamais cessante.
Ora, o motor primeiro é ato puro, cuja operação é eterna e sem sucessão, mas que produz efeitos no tempo por influxo constante.

Assim, diz Alberto:
“Motus caeli est aeternus, quia motor ejus est aeternus; sed non est aeternus secundum modum Dei, quia habet successionem partium.”
O movimento do céu é eterno, porque seu motor é eterno; mas não é eterno segundo o modo de Deus, porque tem sucessão de partes.

O movimento eterno é, portanto, perpétuo na espécie e ordenado na duração — eterno quanto à continuidade, não quanto à simultaneidade.
Pois a eternidade divina é total e indivisa, enquanto a perpetuidade do movimento é sucessiva e numerável.

Alberto distingue três modos de duração:

  1. Aevum, que pertence às substâncias separadas — sem sucessão, mas com anterioridade lógica;
  2. Tempus, que pertence aos corpos mutáveis — com sucessão real e medida;
  3. Perpetuitas, que pertence ao movimento celeste — sem cessação, mas com ordem contínua de partes.

E explica:
“Motus caelestis est perpetuus, quia semper est; aeternitas vero est, quia est totum simul.”
O movimento celeste é perpétuo, porque sempre existe; a eternidade, porém, é porque tudo é simultâneo.

A diferença está, pois, no modo de duração:

  • o tempo flui e cessa,
  • a perpetuidade flui sem cessar,
  • a eternidade não flui.

O movimento eterno é aquele que não tem começo nem fim em sua espécie, mas tem partes sucessivas infinitas em potência.
É, portanto, reflexo temporal da imutabilidade divina, sustentado continuamente pela virtude do Motor primeiro.

Diz ainda Alberto:
“Motus caeli est aeternus, quia causa ejus est semper agens et semper eodem modo; unde non deficit effectus nisi causa deficiat.”
O movimento do céu é eterno, porque sua causa é sempre agente e sempre do mesmo modo; e o efeito não cessa a menos que a causa cesse.

Portanto, existe movimento eterno — não por necessidade da matéria, mas pela constância do ato divino que move sem mudar.
Esse movimento é, em sua ordem, o mais perfeito, pois imita a eternidade pela continuidade indefinida.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o movimento é oposto à imutabilidade quanto à forma própria, mas pode participar da imutabilidade por causa de seu motor, que é eterno. Assim, o movimento celeste é mutável nas partes, mas inalterável na espécie.
  2. À segunda, responde-se que a potência do móvel é finita, mas o influxo do motor é infinito quanto à duração. Logo, o movimento pode ser perpétuo por virtude do motor, embora cada parte dele seja finita.
  3. À terceira, deve-se dizer que Deus, embora imóvel, move como objeto de desejo e de intelecto, não por movimento próprio, mas por influxo de sua perfeição. Assim, o motor eterno causa movimento eterno sem alterar-se.
  4. À quarta, responde-se que o tempo não é infinito em ato, mas em potência, e o movimento eterno participa dessa infinitude potencial — é indefinido, não absolutamente infinito.

Conclusão.

Existe, portanto, movimento eterno, mas não por essência nem por si mesmo, e sim por participação da eternidade divina.
Tal movimento é o dos corpos celestes, cuja continuidade reflete a permanência do primeiro motor imóvel.
É o elo entre o tempo mutável e a eternidade imóvel — a sombra do ato divino no mundo móvel.

E Alberto conclui:
“Motus aeternus est per participationem aeterni motoris; et est perpetuus secundum successionem, non aeternus secundum totum simul.”
O movimento eterno existe por participação do motor eterno; e é perpétuo quanto à sucessão, mas não eterno quanto ao todo simultâneo.

Quaestio XIV — Utrum motus caelestis sit aeternus

(Se o movimento celeste é eterno)

Objeções.

  1. Parece que o movimento celeste não é eterno, pois tudo que é movido é mutável, e o que é mutável é finito. Ora, o céu é corpo natural e, portanto, mutável. Logo, seu movimento é finito e temporal, não eterno.
  2. Além disso, nenhum corpo pode ter potência infinita; mas onde o movimento é eterno, deve haver potência infinita para agir sem cessar. Logo, sendo finita a potência do corpo celeste, o movimento não pode ser eterno.
  3. Ademais, o movimento implica sucessão e divisão; o eterno, ao contrário, é indiviso e sem sucessão. Assim, é impossível que o movimento, que é sucessivo, seja eterno.
  4. Ainda, o movimento é ato do móvel em potência, e toda potência tende a cessar quando o ato é pleno. Logo, o movimento não pode durar perpetuamente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro VIII da Física, ensina:
“Caelum movetur motu aeterno, quia motor ejus est aeternus.”
O céu move-se com movimento eterno, porque o seu motor é eterno.

E Alberto comenta:
“Motus caelestis est perpetuus, quia est a causa quae semper est in actu.”
O movimento celeste é perpétuo, porque procede de uma causa que está sempre em ato.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o movimento celeste é eterno quanto à duração, mas não quanto à simultaneidade, isto é, é perpétuo segundo a sucessão das partes, mas não eterno segundo o todo indivisível.

O fundamento está no princípio aristotélico segundo o qual “o motor imóvel move eternamente”.
Deus, sendo ato puro, causa o movimento do céu não por necessidade de natureza, mas por ato de vontade e intelecto, que são eternos e imutáveis.

Diz Alberto:
“Motus caeli est ab aeterno, quia motor ejus nunquam fuit in potentia nec cessavit agere.”
O movimento do céu é desde sempre, porque o seu motor nunca esteve em potência nem cessou de agir.

Assim, o movimento celeste é contínuo e sem cessação de espécie, não por força própria do corpo, mas pela ação constante do motor espiritual — a inteligência separada que move o orbe por desejo do bem divino.

Há, portanto, duas causas do movimento celeste:

  1. A causa eficiente, que é o intelecto separado, agente eterno;
  2. A causa final, que é Deus, objeto amado e desejado eternamente.

Essas duas causas mantêm o movimento sem interrupção, de modo que o céu, embora corpo, move-se perpetuamente, imitando a perfeição do ato divino.

Alberto explica:
“Motus caeli est perpetuus, quia desiderium motoris separati non deficit; sed in inferioribus motus deficit propter mutationem appetitus.”
O movimento do céu é perpétuo porque o desejo do motor separado não cessa; mas nos inferiores o movimento cessa por mudança do apetite.

A eternidade desse movimento não significa que ele exista todo de uma vez — o que seria eternidade propriamente dita —, mas que não há princípio nem fim na ordem de sua espécie.
Cada rotação tem princípio e fim, mas a série das rotações é indefinida, podendo continuar sem interrupção enquanto durar a ordem do universo.

Por isso, Alberto distingue:

  • Aeternitas, que é sem princípio e sem sucessão;
  • Perpetuitas, que é sem interrupção, mas com sucessão;
  • Tempus, que é sucessão medida com começo e fim.

O movimento celeste é, pois, perpétuo, não eterno em sentido absoluto.

Diz ainda:
“Motus caeli dicitur aeternus, non quia sit totus simul, sed quia non habet terminum durationis.”
O movimento do céu é dito eterno, não porque seja todo simultâneo, mas porque não tem termo de duração.

Em outras palavras, é eterno secundum speciem, porque a espécie de movimento nunca cessa, ainda que cada parte particular tenha fim.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o céu, embora corpo natural, é incorruptível e não sujeito à mutação substancial; logo, pode ter movimento perpétuo, pois sua matéria não se corrompe nem se exaure.
  2. À segunda, responde-se que o motor do céu não age por potência finita, mas por virtude intelectual que procede de Deus; e essa virtude é participada sem desgaste, porque é espiritual e não material.
  3. À terceira, deve-se dizer que o movimento e a eternidade diferem quanto ao modo de duração: o movimento tem sucessão, a eternidade não; contudo, o primeiro pode imitar o segundo pela continuidade ininterrupta.
  4. À quarta, responde-se que o movimento do céu não tende a cessar, porque não há ato último que o esgote: o fim do movimento é a imitação do bem divino, e esse bem é infinito.

Conclusão.

O movimento celeste é eterno quanto à duração e perpetuidade, mas não eterno quanto à total simultaneidade.
É perpétuo por participação do motor eterno, cuja ação é inalterável e contínua.
Assim, o céu move-se sem cessar porque é movido por amor e intelecção do bem divino, que jamais cessa de atrair.

E Alberto conclui:
“Motus caeli est perpetuus et quasi aeternus, quia est imago aeternitatis in mobilibus; sed veram aeternitatem habet solus Deus.”
O movimento do céu é perpétuo e quase eterno, porque é imagem da eternidade nas coisas móveis; mas a verdadeira eternidade pertence somente a Deus.

Quaestio XV — Utrum sit unus motus primus a Deo

(Se há um movimento primeiro proveniente de Deus)

Objeções.

  1. Parece que não há um só movimento primeiro procedente de Deus, pois Deus é causa universal de todo o ser e, portanto, de todos os movimentos. Ora, o que é causa de todos igualmente não tem um efeito primeiro entre muitos, mas todos simultaneamente. Logo, não há um só movimento primeiro, mas uma pluralidade de movimentos oriundos de Deus.
  2. Além disso, se houvesse um movimento primeiro, dele deveriam proceder todos os outros como subordinados. Mas vemos muitos movimentos independentes, segundo as naturezas próprias das coisas e dos agentes. Logo, não há um único movimento primeiro, mas vários princípios motores diversos.
  3. Ademais, o movimento é ato do móvel em potência. Ora, os corpos celestes são muitos e distintos em espécie. Assim, cada um teria de possuir seu movimento próprio, proveniente de um motor próprio, e não de um único ato primeiro.
  4. Ainda, se houvesse um só movimento primeiro, ele seria o mais simples e uniforme. Mas os movimentos do céu são múltiplos — de rotação, de inclinação, de epiciclos. Logo, não pode haver um movimento primeiro único.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro XII da Metafísica, ensina:
“Deus est motor primus immobilis, a quo dependet motus primi caeli.”
Deus é o primeiro motor imóvel, do qual depende o movimento do primeiro céu.

E Alberto comenta:
“Est unus motus primus, quia est una causa prima simplex; et omnes alii motus ordinantur ad hunc sicut ad fontem.”
Há um único movimento primeiro, porque há uma única causa primeira simples; e todos os outros movimentos se ordenam a este como ao seu princípio.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que há um movimento primeiro proveniente de Deus, e que este movimento é o do primeiro céu, isto é, o motor diurno, que envolve e governa todos os outros.

A razão é que em toda ordem de causas deve haver um primeiro princípio imóvel, do qual os demais dependem por derivação.
Ora, Deus é o primeiro motor absolutamente imóvel e eterno, cuja operação é ato puro sem sucessão.
Por conseguinte, dele procede o primeiro movimento que é o mais simples, uniforme e universal — o movimento do orbe supremo.

Diz Alberto:
“Deus movet primum caelum per modum finis amati, et ille motus est primus omnium, quia est a causa prima.”
Deus move o primeiro céu pelo modo de fim amado, e este movimento é o primeiro de todos, porque vem da causa primeira.

Esse movimento é o mais perfeito, porque não é composto de contrariedade, nem tem princípio nem fim em sua espécie, e é o mais uniforme, pois se dá segundo o círculo — a figura sem começo nem termo.

A partir desse primeiro movimento derivam, por participação e subordinação, os demais movimentos celestes, e, por meio deles, todos os movimentos dos corpos inferiores.

Assim, o primeiro movimento é como a vibração universal do ser criado, cuja continuidade depende da presença constante do ato divino.

Alberto explica a hierarquia do movimento:

  1. O motor primeiro é Deus, ato puro, sem mudança.
  2. O motor secundário é a inteligência separada do primeiro céu.
  3. O movimento primeiro é a rotação do orbe exterior, que causa o dia e a noite.
  4. Deste dependem todos os outros movimentos celestes e naturais, como causas segundas movidas.

Por isso, diz:
“Omnis motus inferior participat aliquid de primo motu, sicut omnis lumen participat a primo lumine.”
Todo movimento inferior participa algo do primeiro movimento, assim como toda luz participa da primeira luz.

Esse movimento primeiro é, portanto, um, simples e contínuo, por imitação da simplicidade divina.
Não há pluralidade de movimentos primeiros, porque a pluralidade implica composição, e o primeiro motor é absolutamente simples.

Alberto distingue:

  • motus primus simpliciter, que é o do primeiro céu,
  • motus primus secundum genus, como o primeiro movimento de cada ordem natural.

Assim, Deus é causa primeira de todos, mas diretamente apenas do primeiro movimento universal; os demais derivam por encadeamento hierárquico.

Diz ele:
“Deus movet unum primum, quod movet omnia; non movet omnia immediate, sed per ordinem motuum subalternorum.”
Deus move um primeiro, que move todos; não move tudo imediatamente, mas por ordem de movimentos subordinados.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que Deus é causa universal de todos os movimentos, mas por meio de ordem hierárquica: um primeiro movimento é o canal através do qual sua causalidade se difunde aos demais.
  2. À segunda, responde-se que os diversos movimentos inferiores não são independentes, mas subordinados ao primeiro, ainda que diversifiquem segundo as naturezas dos corpos.
  3. À terceira, deve-se dizer que cada orbe tem seu motor próprio, mas todos dependem do primeiro motor, que move o orbe supremo; e desse movimento derivam todos os outros por ordenação.
  4. À quarta, responde-se que as diferenças dos movimentos celestes provêm da diversidade dos motores secundários e das proporções dos orbes, não da pluralidade de motores primeiros.

Conclusão.

Existe, pois, um único movimento primeiro proveniente de Deus, que é o movimento do primeiro céu, universal e contínuo, cuja causa é o amor intelectual do motor imóvel.
Dele procedem, por ordem e participação, todos os outros movimentos do cosmos, que são múltiplos apenas segundo a matéria, mas subordinados segundo a causa.

E Alberto conclui:
“Unus est motus primus a Deo, sicut unus est Deus motor primus; et sicut ipse est simplicissimus in esse, sic iste est simplicissimus in motu.”
Há um único movimento primeiro proveniente de Deus, assim como há um único Deus primeiro motor; e assim como Ele é o mais simples no ser, este é o mais simples no movimento.

Quaestio XVI — Utrum Deus moveat per intellectum vel per voluntatem

(Se Deus move por intelecto ou por vontade)

Objeções.

  1. Parece que Deus move apenas pelo intelecto, pois Aristóteles diz que o motor imóvel move como intellectus intelligens e como finis amatus, isto é, por ser pensado e desejado. Ora, o movimento como fim se dá pelo conhecimento, não pela vontade ativa, pois o fim move enquanto é conhecido. Logo, Deus move apenas por intelecto.
  2. Além disso, a vontade pressupõe sempre o bem apreendido pelo intelecto; portanto, o movimento da vontade depende do conhecimento. Se o intelecto é primeiro, segue-se que Deus move primariamente por ele, e não pela vontade.
  3. Ademais, Deus é ato puro. Ora, a vontade implica relação de potência em ordem ao objeto amado; e a potência não pode existir em ato puro. Logo, em Deus não há vontade motora, mas apenas inteligência que é causa do movimento como objeto do amor intelectual.
  4. Ainda, todo ato da vontade é acompanhado de inclinação ou de paixão segundo o objeto amado. Ora, em Deus não há paixão nem mudança. Logo, Ele não move por vontade, mas apenas por entendimento.

Em contrário (Sed contra).

Agostinho ensina no De Trinitate (liv. XV, c. 10):
“Deus omnia movet et gubernat voluntate sua.”
Deus move e governa todas as coisas por sua vontade.

E Alberto comenta:
“In Deo intellectus et voluntas non sunt diversa ut in nobis, sed idem secundum essentiam; unde movet simul per intellectum et per voluntatem.”
Em Deus, intelecto e vontade não são diversos como em nós, mas idênticos segundo a essência; por isso, Ele move ao mesmo tempo por intelecto e por vontade.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que Deus move simultaneamente por intelecto e por vontade, mas de modo distinto quanto à razão formal.
Ele move por intelecto enquanto é conhecido como fim último, e move por vontade enquanto quer o bem e o comunica às criaturas.

Diz Alberto:
“Motus ab intellectu est per modum finis, motus a voluntate est per modum efficientis; sed uterque in Deo est idem secundum rem.”
O movimento proveniente do intelecto é segundo o modo de fim, o proveniente da vontade é segundo o modo de eficiente; mas ambos são idênticos em Deus segundo a realidade.

O intelecto divino é o espelho no qual todas as coisas são conhecidas em ato; e a vontade divina é o amor que faz ser aquilo que é conhecido como bom.
Assim, Deus move as criaturas tanto como objeto inteligível que atrai (fim), quanto como causa eficiente que produz (amor).

A diferença é apenas de relação, não de essência:

  • enquanto conhecido, Deus move como fim;
  • enquanto amado, move como causa.

Mas em Deus, conhecer e amar são o mesmo ato simples, sem distinção real.

Diz ainda Alberto:
“In Deo idem est velle et intelligere, quia utrumque est ipsum esse perfectum.”
Em Deus, querer e entender são o mesmo, porque ambos são o próprio ser perfeito.

Por isso, o movimento proveniente de Deus é sem mudança: Ele não se move nem sofre movimento, mas move os outros por influxo do seu ato puro.
Seu intelecto concebe o bem universal; sua vontade ama esse bem e o comunica às criaturas na medida da participação possível.

Logo, Deus move por intelecto como causa exemplaris, e por vontade como causa eficiente e final.
A perfeição do movimento divino consiste precisamente em unir essas três causalidades: exemplar, eficiente e final, numa única operação simples.

Diz Alberto:
“Intellectus divinus est regula omnium formarum, voluntas autem est causa motus earum ad finem; et sic per intellectum ordinat, per voluntatem producit.”
O intelecto divino é a regra de todas as formas; a vontade é a causa do movimento delas para o fim; assim, pelo intelecto ordena, e pela vontade produz.

Portanto, o modo próprio de Deus mover é intellectu volendo, isto é, movendo pelo querer inteligente — ato único em que o conhecer e o amar são um só princípio.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que Aristóteles descreveu o movimento divino sob o aspecto de fim conhecido, porque não admitia a distinção entre vontade e intelecto como em nossa teologia; mas isso não exclui a vontade, e sim a pressupõe como amor do bem conhecido.
  2. À segunda, responde-se que, embora a vontade siga o intelecto quanto à ordem de concepção, ambos são simultâneos em Deus quanto ao ser. O intelecto conhece o bem, e a vontade o ama; ambos são o mesmo ato em essência.
  3. À terceira, deve-se dizer que a vontade em Deus não é potência passiva, mas ato puríssimo, que coincide com seu ser. Amar, em Deus, é ser — amare est esse Dei.
  4. À quarta, responde-se que a vontade divina não implica paixão, mas operação intelectual; é amor sem mudança, ato eterno e imutável que move os seres sem alterar-se.

Conclusão.

Deus move simultaneamente por intelecto e por vontade:
por intelecto, enquanto é conhecido como fim de todos os seres;
por vontade, enquanto quer o bem e comunica o ser.
Ambos os modos coincidem em um só ato de simplicidade absoluta — o ato divino do ser que conhece e ama tudo em si mesmo.

E Alberto conclui:
“Deus movet per intellectum ut lumen, et per voluntatem ut amor; et quia in ipso lumen et amor unum sunt, ideo motus ab eo unus et perfectissimus est.”
Deus move por intelecto como luz, e por vontade como amor; e porque nele a luz e o amor são um só, o movimento que procede dele é uno e perfeitíssimo.

Quaestio XVII — Utrum in Deo sit motus metaphorice dictus

(Se em Deus há movimento dito de modo metafórico)

Objeções.

  1. Parece que em Deus não há movimento nem mesmo metaforicamente, pois o movimento implica mudança, e a mudança é incompatível com a imutabilidade divina. Dizer que Deus se move, ainda que por metáfora, seria atribuir-lhe imperfeição, o que é herético.
  2. Além disso, todo movimento supõe potência e ato. Ora, em Deus não há potência alguma, mas ato puríssimo e simples. Logo, movimento — mesmo por metáfora — não lhe pode ser atribuído sem destruir a pureza do seu ser.
  3. Ademais, o movimento é sucessão de partes no tempo. Ora, em Deus não há tempo nem sucessão, mas eternidade. Logo, não se pode dizer que em Deus há movimento, nem propriamente nem metaforicamente.
  4. Ainda, aquilo que é dito metaforicamente de Deus deve guardar alguma semelhança analógica com a perfeição divina. Ora, o movimento, sendo imperfeito e transitório, não contém perfeição alguma que possa ser atribuída a Deus.

Em contrário (Sed contra).

Diz a Escritura no livro do Êxodo (33, 14):
“Ego ambulabo tecum et requiescam tibi.” — “Eu caminharei contigo e te darei repouso.”

E em Gênesis (3, 8):
“Audierunt vocem Domini Dei ambulantis in paradiso.” — “Ouviram a voz do Senhor Deus que andava no paraíso.”

Logo, o movimento é dito de Deus, mas em sentido figurado e metafórico, segundo o modo de ação divina.

E Alberto comenta:
“Motus in Deo dicitur non per translationem loci, sed per operationem providentiae et per effectum amoris.”
O movimento é dito de Deus, não como translação de lugar, mas como operação de sua providência e efeito de seu amor.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que em Deus não há movimento propriamente, mas pode-se falar de movimento metaforicamente, por semelhança quanto ao efeito e ao modo de ação sobre as criaturas.

Com efeito, o movimento significa passagem de potência a ato, ou de um estado a outro.
Como em Deus não há potência nem sucessão, o movimento não lhe convém em sentido próprio.
Mas porque Ele produz nas criaturas os efeitos de movimento — mudança, operação, transformação —, diz-se dele metaforicamente que se move.

Assim, a metáfora do movimento em Deus indica duas coisas:

  1. A eficácia ativa de sua providência, pela qual todas as coisas são conduzidas ao seu fim;
  2. A difusão de seu amor, pelo qual tudo é atraído à perfeição do bem.

Diz Alberto:
“In Deo motus significat non mutationem, sed influxum; non transitum de loco in locum, sed communicationem bonitatis.”
Em Deus, o movimento não significa mudança, mas influxo; não passagem de lugar em lugar, mas comunicação de bondade.

Quando se diz que Deus “anda”, entende-se que Ele opera; quando se diz que “vem”, entende-se que manifesta sua presença; quando se diz que “volta”, entende-se que retoma o pecador à graça.
Essas expressões são modos humanos de significar efeitos divinos.

A linguagem metafórica é necessária porque a nossa inteligência, confinada ao sensível, não pode apreender diretamente o ato puro; assim, aplica nomes tomados das criaturas para designar analogicamente o ser divino.

O movimento, então, quando atribuído a Deus, é metáfora da ação eterna pela qual Ele governa e conserva o universo.
Por isso, os santos doutores dizem que o “movimento de Deus” é a permanência de seu ato operativo, não sucessivo, mas simples e contínuo.

Diz Alberto:
“Motus Dei est actio ejus semper idem manens, per quam omnia moventur et ordinantur.”
O movimento de Deus é sua ação sempre idêntica, pela qual todas as coisas são movidas e ordenadas.

O movimento metafórico exprime, portanto, a presença dinâmica de Deus no mundo — o ato pelo qual tudo é continuamente sustentado no ser e conduzido ao fim.

Essa metáfora revela uma verdade teológica profunda: Deus é imóvel em si mesmo, mas causa de todo movimento fora de si.
Sua imobilidade é fonte de toda mobilidade — Ele é o centro imóvel que faz girar o cosmos.

Diz ainda:
“Immutabilitas Dei est radix motus universi; unde metaphorice dicitur moveri, quia causat omnem motum sine sui mutatione.”
A imutabilidade de Deus é a raiz do movimento do universo; por isso se diz metaforicamente que Ele se move, porque causa todo movimento sem mudar em si mesmo.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o movimento metafórico não atribui mudança a Deus, mas expressa a permanência de sua operação. Assim, não há imperfeição, mas plenitude de eficácia.
  2. À segunda, responde-se que o movimento supõe potência e ato no ser criado; mas em Deus, o mesmo movimento é ato puro, sem sucessão nem potência.
  3. À terceira, deve-se dizer que o tempo pertence ao movimento criado, e não ao ato divino. O movimento atribuído a Deus não é temporal, mas simbólico do influxo eterno.
  4. À quarta, responde-se que o movimento contém em si uma perfeição relativa — a passagem de potência ao ato —, e é nessa perfeição relativa que se baseia a metáfora, pois Deus é o ato supremo que produz o ato em tudo o que se move.

Conclusão.

Em Deus não há movimento real, mas movimento dito metaforicamente, segundo o modo de sua operação ad extra.
Tal movimento não é sucessão nem mudança, mas a difusão contínua de sua ação e amor, pela qual tudo se move, vive e existe.

E Alberto conclui:
“Deus movetur metaphorice, quia movet omnia efficaciter; et quietus in se, ubique operatur in aliis.”
Deus é dito mover-se metaforicamente, porque move tudo eficazmente; e, permanecendo quieto em si mesmo, opera em todas as coisas.

Quaestio XVIII — Utrum infinitum sit in actu vel in potentia tantum

(Se o infinito existe em ato ou somente em potência)

Objeções.

  1. Parece que o infinito existe em ato, pois o número pode ser aumentado indefinidamente, e, portanto, há uma infinitude atual de possibilidades. Ora, o possível que não cessa de poder ser adicionado parece existir realmente como infinito.
  2. Além disso, a matéria é dita ser infinita segundo a potência, e o tempo segundo a sucessão. Mas a potência e a sucessão são modos reais. Logo, o infinito, sendo fundado nelas, é real em ato.
  3. Ademais, Deus é infinito, e Deus é ato puríssimo. Logo, o infinito pode existir em ato.
  4. Ainda, a natureza não faz nada em vão; se a potência de crescer é sem limite, é porque a infinitude está de algum modo presente realmente nas coisas. Logo, há infinito em ato.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, ensina:
“Infinita in actu neque in magnitudine neque in numero neque in tempore sunt.”
O infinito em ato não existe nem na magnitude, nem no número, nem no tempo.

E Alberto comenta:
“Infinitum in actu est impossibile in rebus materialibus, quia omnis forma finita terminat materiam.”
O infinito em ato é impossível nas coisas materiais, porque toda forma finita dá termo à matéria.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o infinito não existe em ato nas coisas criadas, mas somente em potência, salvo em Deus, que é infinito em ato por sua própria essência.

O termo “infinito” (infinitum) é dito em oposição a “finito” (finitum), e o finito implica termo e limite.
Portanto, o infinito é aquilo que carece de termo.
Ora, o limite é ato, e o ilimitado é potência.
Logo, o infinito, enquanto tal, é essencialmente potência, e não ato.

Diz Alberto:
“Infinitum est quod non habet terminum, et terminus est actus; unde infinitum secundum rationem est potentia.”
O infinito é o que não tem termo, e o termo é ato; portanto, o infinito, segundo a razão, é potência.

Nas coisas corporais, toda quantidade é limitada pela forma e pela medida; e o número, sendo abstração do intelecto, é finito segundo o ato de contagem.
Assim, o infinito em ato é impossível na ordem dos entes criados, porque toda criatura participa do ser por medida e proporção.

Há, contudo, três modos de infinitude:

  1. Infinitum secundum quantitatem — na grandeza corporal, impossível em ato, possível em potência;
  2. Infinitum secundum divisibilitatem — no contínuo, que é divisível indefinidamente, mas nunca todo dividido;
  3. Infinitum secundum successionem — no tempo e no número, que podem crescer indefinidamente sem atingir totalidade atual.

Diz Alberto:
“Infinitum in potentia est in motu, in tempore et in numero; sed infinitum in actu est solius Dei, in quo est plenitudo essendi.”
O infinito em potência está no movimento, no tempo e no número; mas o infinito em ato pertence somente a Deus, em quem há plenitude do ser.

Em Deus, o infinito é ato absoluto, porque n’Ele não há limite, nem matéria, nem potencialidade.
Nas criaturas, ao contrário, o infinito é sempre relativo e potencial, pois sua essência depende de algo anterior que a delimita.

Assim, o infinito em ato é realmente existente apenas na ordem do ser divino, e todo o resto é infinito apenas em potência, segundo a possibilidade de adição, divisão ou sucessão.

O erro dos antigos naturalistas, como Anaximandro e Demócrito, consistiu em atribuir ao mundo físico uma infinitude atual de corpos ou de espaço, confundindo a infinitude do ato divino com a indefinição da matéria.

Diz Alberto:
“Infinitum mundi negatur, quia infinitum et actus se opponunt; et materia non est sine forma, quae est terminus.”
A infinitude do mundo é negada, porque o infinito e o ato se opõem; e a matéria não existe sem forma, que é o limite.

Portanto, o infinito criado não é ato, mas potência sem atualidade plena; somente em Deus é que o infinito coincide com o ato puro.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o número é infinito apenas em potência, pois o intelecto pode sempre acrescentar outro número, mas nunca compreender a totalidade infinita em ato.
  2. À segunda, responde-se que a matéria é infinita em potência enquanto pode receber formas indefinidas, e o tempo é infinito em potência enquanto pode continuar sem cessar; mas ambos são finitos em ato.
  3. À terceira, deve-se dizer que Deus é, de fato, infinito em ato, mas essa infinitude não é por negação de limite, e sim por plenitude de ser — non per privationem, sed per eminentiam. Assim, o infinito divino é perfeição, e o infinito criado seria imperfeição.
  4. À quarta, responde-se que a natureza tende indefinidamente ao ato, mas nunca o realiza plenamente; portanto, o infinito nela é desejo e não posse, potência e não ato.

Conclusão.

O infinito não existe em ato nas coisas criadas, mas somente em potência, enquanto podem ser sempre acrescentadas, divididas ou prolongadas.
O único infinito em ato é Deus, em quem o ser é plenitude sem limite nem sucessão.

E Alberto conclui:
“Infinitum in rebus creatis est potentia sine perfectione; in Deo est perfectio sine limite. In uno est defectus finis, in altero excessus essendi.”
O infinito nas coisas criadas é potência sem perfeição; em Deus é perfeição sem limite.
Num caso há defeito de termo; no outro, excesso de ser.

Quaestio XIX — Utrum infinitum secundum quantitatem possit esse reale

(Se o infinito segundo a quantidade pode ser real)

Objeções.

  1. Parece que o infinito segundo a quantidade pode ser real, pois a matéria é dita ser infinita, e toda matéria é quantitativa. Ora, o fundamento da quantidade é o corpo material; se a matéria é infinita, também o corpo será. Logo, o infinito segundo a quantidade é possível na realidade.
  2. Além disso, o espaço é sem limite, e o lugar é receptáculo de quantidades corporais. Logo, sendo o espaço infinito, também o corpo que o ocupa pode sê-lo.
  3. Ademais, se o tempo é infinito em sucessão, como provado anteriormente, e o tempo mede o movimento, o qual pertence aos corpos, então a quantidade que serve de sujeito ao movimento também deve poder ser infinita.
  4. Ainda, o poder de Deus é infinito. Ora, o poder infinito pode produzir um corpo de quantidade infinita, se o quiser. Logo, o infinito segundo a quantidade pode existir realmente.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, diz:
“Non est corpus infinitum in actu, neque magnitudo sensibilis infinita.”
Não há corpo infinito em ato, nem grandeza sensível infinita.

E Alberto comenta:
“Quantitas est mensura corporis, et mensura requirit terminum; ideo quantitas infinita est impossibilis.”
A quantidade é a medida do corpo, e toda medida requer limite; por isso, a quantidade infinita é impossível.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o infinito segundo a quantidade não pode ser real em ato, porque toda quantidade é essencialmente ordenada à medida e ao limite, e o limite é o ato da quantidade.

A quantidade (quantitas) é definida como aquilo que é divisível em partes homogêneas. Ora, a divisão implica término — princípio e fim —, e o que é sem termo não pode ser medido, logo, não é quantidade propriamente dita.

Diz Alberto:
“Quantitas sine termino non est quantitas, quia essentia ejus est mensurari; infinitum autem non mensuratur.”
A quantidade sem termo não é quantidade, porque sua essência consiste em ser medida; o infinito, porém, não pode ser medido.

Nas coisas materiais, o ser é recebido na matéria sob a forma e segundo uma proporção determinada; assim, toda grandeza corpórea tem extensão finita conforme sua forma.
A forma é o princípio do limite; e o ilimitado é matéria sem forma, isto é, potência sem determinação.

Portanto, o infinito segundo a quantidade não pode ser real, porque isso equivaleria à matéria sem forma, o que é o mesmo que não-ser atual.

Além disso, se houvesse corpo de quantidade infinita, ele não poderia mover-se nem ser movido, pois o movimento exige distinção de partes — início e termo —, e o infinito não tem termo.
Nem poderia haver outro corpo fora dele, o que anularia a multiplicidade dos entes e a ordem do universo.

Diz Alberto:
“Si corpus esset infinitum, locus ejus non esset, nec motus in eo; unde tolleretur ordo totius naturae.”
Se existisse corpo infinito, não haveria seu lugar, nem movimento nele; e, portanto, seria destruída a ordem de toda a natureza.

A infinitude da quantidade, portanto, só é possível em potência, isto é, na divisibilidade indefinida do contínuo ou na capacidade de aumento sem limite determinado.
Mas nunca em ato, porque a realidade corporal é sempre formalizada e finita.

Somente Deus é infinito em ato, e sua infinitude não é quantitativa, mas eminentemente simples e espiritual.

Por isso, Alberto distingue:

  • Infinitum secundum essentiam, que pertence só a Deus;
  • Infinitum secundum quantitatem, que é impossível em ato, possível em potência;
  • Infinitum secundum successionem, que é indefinido, não infinito.

Diz ainda:
“In quantitate est infinitum per augmentum potentiale, non per extensionem actualem.”
Na quantidade há infinitude por aumento potencial, não por extensão atual.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que a matéria é dita infinita apenas em potência, não em ato. Ela é capaz de receber formas indefinidamente, mas nunca todas ao mesmo tempo; portanto, o corpo material, que depende da forma, é sempre finito.
  2. À segunda, responde-se que o espaço não é coisa real fora dos corpos, mas relação de posição entre eles; não há, pois, “espaço infinito” senão como abstração mental, não como realidade física.
  3. À terceira, deve-se dizer que o tempo é infinito em potência quanto à sucessão, mas isso não implica corpo infinito, pois cada movimento particular é finito; o infinito do tempo é apenas indefinição, não grandeza real.
  4. À quarta, responde-se que o poder de Deus é infinito, mas não realiza o impossível. Fazer corpo de quantidade infinita é contradição em termos, pois quantidade infinita não é quantidade; o poder divino não faz o contraditório ser verdadeiro.

Conclusão.

O infinito segundo a quantidade não pode ser real, pois a essência da quantidade exige limite, e o ilimitado é pura potência sem ato.
A infinitude quantitativa é possível apenas segundo a divisibilidade e o aumento indefinido, mas não segundo existência atual.
Deus, que é infinito em ato, é causa e termo de todas as quantidades finitas, não um corpo entre corpos.

E Alberto conclui:
“Infinitum in quantitate est negatio termini; quantitas vero est affirmatio mensurae. Unde infinitum reale repugnat quantitati.”
O infinito na quantidade é negação do termo; a quantidade, porém, é afirmação de medida.
Por isso, o infinito real repugna à quantidade.

Quaestio XX — Utrum infinitum secundum qualitatem possit esse reale

(Se o infinito segundo a qualidade pode ser real)

Objeções.

  1. Parece que o infinito segundo a qualidade pode ser real, pois o bem e o mal crescem indefinidamente nas ações e nos hábitos. Ora, se o bem moral pode ser aumentado sem termo, também a qualidade que o exprime parece poder ser infinita.
  2. Além disso, a luz é dita ser tanto mais pura quanto mais próxima do primeiro princípio. Ora, a luz divina é infinita em perfeição. Logo, o infinito segundo a qualidade é possível.
  3. Ademais, as qualidades intensivas, como calor, brancura e som, admitem graus sem limite fixo; e se não há grau máximo determinado, parece haver possibilidade de infinitude real na intensidade qualitativa.
  4. Ainda, a potência do intelecto é capaz de ciência sem limite, e a sabedoria de Deus é infinita. Portanto, a qualidade que é ciência pode ser infinita em ato.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, ensina:
“In infinitis qualitatibus non est actus, quia intensio qualitatis finitur in termino.”
Nas qualidades infinitas não há ato, porque a intensidade da qualidade termina em um limite.

E Alberto comenta:
“Qualitas est forma mensurata per subjectum; ideo infinitum qualitatis destruit proportionem et modum formae.”
A qualidade é forma medida pelo sujeito; portanto, o infinito da qualidade destrói a proporção e o modo da forma.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o infinito segundo a qualidade não pode ser real nas criaturas, pois toda qualidade é ato determinado de um sujeito determinado; e a determinação é o contrário da infinitude.

A qualidade, como toda forma acidental, é ato de um sujeito segundo certa proporção. Se a proporção é finita, a forma também o é.
A infinitude qualitativa anularia a identidade e a estabilidade do sujeito, tornando-o ilimitado quanto ao modo de ser, o que é impossível fora de Deus.

Diz Alberto:
“Qualitas dicit perfectionem mensuratam; infinitum autem tollit mensuram, unde tollit perfectionem.”
A qualidade exprime perfeição mensurada; o infinito, porém, destrói a medida, e, portanto, destrói a perfeição.

Nas coisas sensíveis, toda qualidade possui grau máximo natural: o fogo não pode ser infinitamente quente, nem a brancura infinitamente intensa, porque o sujeito que a sustenta tem limites naturais de recepção.
O aumento da qualidade é contínuo apenas em potência, não em ato.

O mesmo vale para as qualidades espirituais: a ciência humana pode crescer indefinidamente quanto à aquisição, mas nunca alcança infinitude atual, porque o intelecto criado é limitado por sua essência.

Há, portanto, infinito qualitativo apenas em potência, segundo o aumento sucessivo e possível, não em ato.
Somente em Deus há infinito qualitativo em ato, porque n’Ele a perfeição é sem limite e sem medida, coincidindo com o ser.

Diz ainda Alberto:
“Solus Deus est infinitus in perfectione qualitatis, quia ejus bonitas et sapientia non mensurantur; in creaturis autem omnis perfectio est limitata.”
Somente Deus é infinito na perfeição da qualidade, porque sua bondade e sabedoria não têm medida; nas criaturas, toda perfeição é limitada.

O erro dos antigos pitagóricos e estoicos foi imaginar graus de virtude e calor que crescem sem termo real, como se o aumento contínuo pudesse transformar a potência em infinito atual — o que é impossível, pois toda forma criada é finita pelo ser que a contém.

Por isso, Alberto declara:
“Infinitum qualitatis est repugnans formae, quia forma determinat, infinitum indeterminat.”
O infinito da qualidade é incompatível com a forma, porque a forma determina, e o infinito indetermina.

Portanto, o infinito qualitativo, em ato, não é possível nas criaturas, mas apenas em Deus, em quem a forma e o ser são idênticos e ilimitados.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que o bem moral pode crescer indefinidamente apenas quanto à adição de atos, não quanto à intensidade atual. A virtude do homem sempre tem medida conforme sua natureza.
  2. À segunda, responde-se que a luz divina é infinita em ato, mas por identidade com o próprio ser divino, não como qualidade acidental. A luz criada é participada e, portanto, finita.
  3. À terceira, deve-se dizer que os graus de intensidade qualitativa são finitos na natureza; a infinitude deles é apenas de possibilidade mental, não de existência real.
  4. À quarta, responde-se que a ciência de Deus é infinita em ato porque é seu próprio ser; a ciência das criaturas, porém, é finita e medida pela capacidade do intelecto.

Conclusão.

O infinito segundo a qualidade não pode ser real nas criaturas, porque toda qualidade é forma medida e proporcionada ao sujeito que a recebe.
A infinitude qualitativa só é possível em potência ou por participação no ser divino, em quem toda perfeição é sem limite.

E Alberto conclui:
“Infinitum qualitatis est possibile secundum potentiam, non secundum actum; in Deo vero est infinitum per essentiam, quia ipse est mensura sine mensura.”
O infinito da qualidade é possível segundo a potência, não segundo o ato; mas em Deus é infinito por essência, porque Ele é medida sem medida.

Quaestio XXI — Utrum infinitum secundum numerum sit possibile

(Se o infinito segundo o número é possível)

Objeções.

  1. Parece que o infinito segundo o número é possível, pois o número é gerado pela adição da unidade, e nada impede que se possa sempre adicionar uma unidade a outra. Logo, a série dos números é infinita, e, portanto, o infinito numérico é possível.
  2. Além disso, a divisão do contínuo produz sempre novas partes numeráveis; e como o contínuo é divisível ao infinito, parece que também o número das partes é infinito em ato.
  3. Ademais, os astros e as substâncias espirituais são ditos em número quase infinito. Ora, se há realidades inumeráveis, parece haver número infinito atual de coisas.
  4. Ainda, Deus conhece todas as coisas criadas, e esse conhecimento é completo e atual. Se o número das coisas criadas fosse finito, o conhecimento divino seria limitado; portanto, há infinitude numérica real.

Em contrário (Sed contra).

Aristóteles, no Livro III da Física, ensina:
“Numerus infinitus actu non est, quia numerus est ex additione unitatum, quae non possunt simul esse infinitae.”
O número infinito em ato não existe, porque o número se compõe da adição de unidades, e estas não podem existir simultaneamente em número infinito.

E Alberto comenta:
“Infinita simul existentia destrueret proportionem numeri, quae est ordo finitorum.”
A existência simultânea de infinitos destruiria a proporção do número, que é a ordem dos finitos.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o infinito segundo o número é possível apenas em potência, e não em ato, porque o número depende essencialmente de limite e de ordem, que o infinito destrói.

O número é a pluralidade medida pela unidade.
Ora, toda medida supõe termo, e onde há ausência de termo, não há medida possível.
Assim, o número infinito em ato é impossível, pois a infinitude suprime a noção de medida e proporção.

Diz Alberto:
“Numerus est ex additione finita, et omnis additio requirit terminum; infinitum autem non habet terminum, ergo non est numerus.”
O número procede de adição finita, e toda adição requer termo; mas o infinito não tem termo, portanto, não é número.

No entanto, o número pode ser infinito em potência, isto é, segundo a possibilidade de sempre se adicionar outra unidade.
Essa infinitude é virtual, não atual, pois em nenhum momento a totalidade dos números pode existir simultaneamente.

Diz ainda:
“Numerus infinitus est in potentia, quia semper potest addi unitas, sed non est in actu, quia nunquam sunt omnes simul.”
O número infinito é em potência, porque sempre se pode acrescentar uma unidade, mas não é em ato, porque nunca estão todas juntas ao mesmo tempo.

O intelecto pode conceber a noção de série indefinida, mas não um número infinito existente.
Pois, se o infinito numérico existisse em ato, o universo seria simultaneamente composto de partes inumeráveis sem distinção de ordem — o que destruiria a harmonia da criação.

Além disso, o número é atributo do ser finito, porque é medição da pluralidade limitada; e a infinitude absoluta pertence somente a Deus, cuja unidade é sem número.

Assim, Deus é princípio do número, não número Ele mesmo:

  • enquanto unidade, é causa do uno nas coisas;
  • enquanto infinito, está além de toda contagem.

Diz Alberto:
“Numerus est in rebus per participationem unitatis; sed in Deo est unitas sine numeratione, quia est simplex.”
O número está nas coisas pela participação da unidade; mas em Deus há unidade sem numeração, porque Ele é simples.

Logo, o infinito numérico é possível apenas em potência discursiva — tanto na adição sem fim dos números quanto na divisão sem limite das quantidades —, mas não na realidade atual.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora o intelecto possa sempre adicionar uma unidade, ele nunca realiza essa adição em ato infinito. O processo é indefinido, não infinito atual.
  2. À segunda, responde-se que a divisão do contínuo é infinita apenas em potência, pois nenhuma divisão é realizada sem ato finito; a infinitude está na possibilidade, não na existência.
  3. À terceira, deve-se dizer que os astros e as substâncias espirituais são “inumeráveis” segundo nossa capacidade de contagem, não porque sejam infinitos em si. A criação, como toda obra de Deus, é ordenada e finita.
  4. À quarta, responde-se que o conhecimento divino é infinito quanto ao modo, não quanto ao número de coisas conhecidas; Deus conhece todas as coisas finitas de modo infinito, mas não porque elas sejam infinitas.

Conclusão.

O infinito segundo o número é impossível em ato, pois o número exige medida e termo, que o infinito exclui.
A infinitude numérica existe apenas em potência, como possibilidade indefinida de adição ou divisão, e pertence plenamente apenas à mente divina, não às coisas criadas.

E Alberto conclui:
“Infinitum numeri est potentia addendi sine termino, non multitudo actu infinita; et ideo Deus est supra numerum, sicut est supra omnem finem et mensuram.”
O infinito do número é a potência de acrescentar sem termo, não a multidão infinita em ato; e, por isso, Deus está acima do número, assim como está acima de todo fim e medida.

Quaestio XXII — Utrum infinitum conveniat Deo proprie

(Se o infinito convém propriamente a Deus)

Objeções.

  1. Parece que o infinito não convém propriamente a Deus, pois o infinito, enquanto tal, significa ausência de limite, e a ausência de limite é uma privação. Ora, em Deus não há privação alguma, mas pura perfeição. Logo, o infinito não lhe convém propriamente.
  2. Além disso, o infinito pertence às coisas quantitativas e materiais, que podem ser aumentadas sem termo. Ora, Deus é incorpóreo e absolutamente simples. Logo, o infinito, que implica extensão e indeterminação, não pode ser dito propriamente de Deus.
  3. Ademais, o infinito é contrário à forma, pois toda forma é determinante e limitadora. Ora, Deus é forma puríssima e ato puríssimo. Logo, chamar Deus de infinito seria contraditório à sua essência.
  4. Ainda, o nome de infinito é negativo, pois significa apenas a negação de um fim. Ora, o que é dito negativamente não exprime perfeição positiva. Logo, o infinito não se aplica propriamente a Deus.

Em contrário (Sed contra).

Diz Dionísio Areopagita, no De Divinis Nominibus (cap. V):
“Deus dicitur infinitus, quia non terminatur nec ratione nec essentia.”
Deus é chamado infinito, porque não é limitado nem pela razão nem pela essência.

E Alberto comenta:
“Infinitum Deo convenit non per privationem, sed per eminentiam; quia in eo est plenitudo sine termino.”
O infinito convém a Deus, não por privação, mas por eminência, porque nele há plenitude sem limite.


Respondeo dicendum quod.

Deve-se dizer que o infinito convém propriamente a Deus, mas não segundo o modo de negação imperfeita, e sim por via de superabundância e perfeição absoluta.

O termo infinitum tem dois sentidos:

  1. Privative, como negação de limite em algo que, por natureza, deveria tê-lo (por exemplo, a matéria sem forma);
  2. Eminenter, como ausência de limite em virtude de plenitude e perfeição (como em Deus).

O primeiro modo é imperfeito e pertence às criaturas; o segundo é perfeito e pertence unicamente a Deus.

Diz Alberto:
“In creaturis infinitum est defectus determinantis; in Deo est excessus perfectionis.”
Nas criaturas, o infinito é defeito do que deveria determinar; em Deus, é excesso de perfeição.

Em Deus, o ser não é limitado por nada fora dele — nem pela matéria, nem pela forma, nem por princípio superior.
Ele é ato puro, plenitude de ser, verdade e bondade; por isso, sua infinitude é a ausência de toda limitação, não por carência, mas por superabundância.

Assim, o infinito divino não significa indeterminação, mas auto-suficiência absoluta: Ele contém em si, eminentemente, todas as formas e perfeições criadas, sem que nenhuma o defina.

Diz ainda Alberto:
“Deus est infinitus, quia est totum esse in uno; et quia non est terminatus a contrario nec a genere nec a specie.”
Deus é infinito porque é todo o ser em um só; e porque não é limitado por contrário, gênero ou espécie.

O infinito divino é, portanto, infinito de ser, não de quantidade.
Enquanto o infinito material é privação de forma, o infinito divino é plenitude formal absoluta.
Por isso, o nome de “infinito” é aplicado a Deus de modo analógico, e não unívoco: o que é carência nos entes inferiores é perfeição supereminente no Criador.

Em Deus, o ser e a essência são idênticos; e, sendo o ser absolutamente simples e sem limite, segue-se que é infinito por sua própria natureza.
Assim, o infinito pertence a Ele per se et primo modo, isto é, essencialmente e de forma própria.

Diz Alberto:
“Infinitum non dicitur de Deo per negationem tantum, sed per affirmationem plenitudinis, quia omnem terminum transcendit.”
O infinito não é dito de Deus por mera negação, mas por afirmação de plenitude, porque transcende todo limite.

Portanto, o infinito é o nome mais universal e mais adequado à essência divina depois do nome “ser” (esse), pois expressa sua absoluta incondicionalidade e totalidade de perfeição.


Respostas às objeções.

  1. À primeira, deve-se dizer que, embora o termo “infinito” em si denote negação, quando aplicado a Deus significa superabundância, e não privação.
    A ausência de limite em Deus não é falta, mas plenitude de ser.
  2. À segunda, responde-se que o infinito corporal pertence à quantidade, o que é imperfeito; mas o infinito divino pertence à essência simples do ser, o que é perfeitíssimo.
    Portanto, o nome é comum, mas o modo é diverso.
  3. À terceira, deve-se dizer que Deus é forma puríssima e, justamente por isso, não é limitado por matéria alguma; e é essa ausência de limitação que se chama infinitude.
    Logo, a forma em Deus é infinita porque é ato puro, não porque careça de limite.
  4. À quarta, responde-se que, embora o nome “infinito” seja negativo na forma, é afirmativo no sentido: nega os limites para afirmar a plenitude.
    Assim como “imortal” significa “vida perfeita e imperecível”, também “infinito” significa “ser pleno e ilimitado”.

Conclusão.

O infinito convém propriamente a Deus, não como negação imperfeita, mas como plenitude de ser sem limite nem medida.
Em Deus, a infinitude é perfeição positiva, ato puro e totalidade do ser; n’Ele, o ilimitado não é privação, mas superabundância.

E Alberto conclui:
“Infinitum in Deo est plenitudo essendi sine termino; ideo non dicitur per defectum, sed per excellentiam.”
O infinito em Deus é plenitude de ser sem termo; por isso, não se diz por defeito, mas por excelência.

 

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