Desde a redemocratização, lá no final dos anos 80, o Brasil entrou numa fase em que todo o ambiente cultural foi sendo “lavado” e reprogramado para alinhar o que a população pensa com uma cartilha progressista importada, mas adaptada ao nosso jeitinho. E quando digo “lavado” não estou falando de algo simples como mudar o discurso de um jornal ou trocar os livros escolares. É algo mais profundo, no sentido que Olavo de Carvalho descreve em A Nova Era e a Revolução Cultural: uma operação de longo prazo, planejada para mudar mentalidade, valores e até mesmo aquilo que a gente considera “normal” sem que a pessoa perceba que foi condicionada.
Flávio Gordon, no Ministério da Verdade, pega essa linha e mostra que a principal ferramenta para essa transformação não é o debate aberto, mas o controle do fluxo de informação e a criação de um consenso artificial. Ele fala de jornalistas, professores e artistas agindo como guardiões do que pode ou não pode ser dito. É por isso que certas piadas que eram comuns nos anos 90 hoje são tratadas como crime moral. E isso não é coincidência, é método.
Lobaczewski, com sua Ponerologia Política, entra num nível ainda mais inquietante. Ele não fala só de ideias ou cultura, mas de quem está por trás: gente com distorções psicológicas profundas, mas com habilidade para manipular emoções e linguagens a ponto de transformar a sociedade inteira em um organismo doente. Segundo ele, quando essas figuras chegam ao topo, criam sistemas fechados onde só se sobe na hierarquia se repetir o credo oficial. Isso no Brasil virou quase um rito de passagem em redações, universidades e até em empresas privadas.
O Olavo mostrava que essa “revolução cultural” não se apresenta como revolução no sentido clássico, com bandeira na rua e barricada. Ela vem como atualização, modernização, inclusão, tolerância. Tudo palavras bonitas, mas que carregam um conjunto de ideias que, na prática, esvaziam referências antigas e plantam novas. O Flávio Gordon chama isso de “semântica invertida”: você pega uma palavra que todo mundo acha boa e dá pra ela um significado novo. “Diversidade” hoje não é diversidade de pensamento, é diversidade dentro de um único espectro ideológico.
No dia a dia, isso aparece quando você vê alguém no trabalho com medo de falar que é contra determinada pauta por receio de ser taxado de preconceituoso. Ou quando um aluno evita questionar um professor porque sabe que a nota dele pode depender de um alinhamento ideológico disfarçado de avaliação acadêmica. Lobaczewski explicaria isso como a instalação de “critérios de lealdade” à patocracia, onde a obediência ao dogma é mais importante que a competência.
Um exemplo claro: a mudança nos livros escolares. Antes, você tinha uma abordagem mais factual, datas, eventos, cronologia. Hoje, o que impera é a narrativa. Não importa tanto o que aconteceu, mas qual a interpretação ideologicamente adequada daquele evento. Gordon detalha como as editoras, muitas vezes financiadas por ONGs e fundações internacionais, passaram a priorizar conteúdos alinhados a essa agenda, e o Olavo já alertava que isso formaria uma geração incapaz de pensar fora do molde.
No campo cultural, a coisa é ainda mais evidente. Filmes, novelas e músicas, que antes refletiam valores populares, agora funcionam como vitrines de comportamentos-modelo. Lobaczewski diria que isso não é só arte, é engenharia psicológica aplicada. Gordon acrescentaria que, com as redes sociais, essa engenharia se tornou interativa: o público não só consome, mas também vigia e pune os que desviam da norma.
E aí chegamos no fenômeno mais perigoso: a auto-censura. O Olavo falava muito disso. Quando a pessoa, mesmo sem ameaça direta, já molda o que diz e pensa para não entrar em conflito com a narrativa dominante, a revolução cultural já cumpriu seu objetivo. Não é preciso polícia de pensamento se a própria vítima já carrega o fiscal na cabeça.
Isso se mistura com a visão de Lobaczewski sobre como sociedades ponerizadas normalizam o absurdo. O que antes era escândalo passa a ser rotina, e o que antes era normal passa a ser visto como escândalo. Quem viveu os anos 80 e 90 sabe que certas opiniões eram comuns na mesa do bar, no almoço de família, e hoje essas mesmas opiniões podem te custar emprego e reputação.
Flávio Gordon mostra como a mídia é usada para criar esse deslocamento. Um caso polêmico é tratado não com investigação equilibrada, mas com um enquadramento moral imediato: quem discorda já é “do mal” antes mesmo de ser ouvido. A consequência disso no cotidiano é que debates legítimos viram linchamentos.
O resultado desse cruzamento Olavo–Gordon–Lobaczewski é um cenário em que a cultura, que deveria ser um campo de expressão livre, vira ferramenta de controle social. No Brasil, isso ficou ainda mais intenso porque a redemocratização abriu espaço para que movimentos progressistas ocupassem áreas estratégicas antes mesmo de terem maioria política formal. Ou seja, ganharam o campo cultural antes do campo eleitoral.
Se você reparar, nas últimas décadas, mesmo quando a direita ou o centro-direita ganharam eleições, as políticas culturais, educacionais e de mídia permaneceram praticamente as mesmas. Isso é exatamente o que o Olavo dizia: quando a revolução cultural é bem-sucedida, a troca de governo não muda o regime cultural.
E não pense que isso é só teoria. Quem tem filhos na escola vê. Os trabalhos, as redações, as leituras obrigatórias já vêm filtradas. Gordon lembra que isso não é acidental, mas parte de um alinhamento internacional que conecta fundações estrangeiras, organismos multilaterais e grupos internos interessados em manter essa hegemonia.
Lobaczewski diria que, para quebrar esse ciclo, seria preciso expor a psicologia de quem mantém esse sistema, porque enquanto o público enxergar essas figuras como “líderes inspiradores” e não como operadores de um mecanismo patológico, a coisa só se aprofunda.
O Olavo, por sua vez, insistiria que a única forma de resistência é cultural antes de política. Não adianta querer mudar leis se a mentalidade do povo já foi moldada para rejeitar qualquer proposta fora do script.
Gordon completaria dizendo que essa resistência cultural exige também a criação de meios de comunicação paralelos, que não dependam do aval do establishment para existir. Caso contrário, todo esforço é capturado e neutralizado.
Enquanto isso, o cotidiano segue mostrando que a “lavagem” não é um evento, mas um processo contínuo. Uma piada que era aceitável ontem pode ser crime amanhã. Um livro que era leitura obrigatória pode ser banido. E tudo isso sempre com justificativa moral bonita, para que a resistência pareça maldade.
No final das contas, cruzando os três autores, a conclusão é clara: o Brasil pós-1989 não vive só uma disputa política, mas um regime cultural enraizado, no qual a mudança de mentalidade foi planejada, conduzida e consolidada com tanta eficiência que a maioria das pessoas nem percebeu que já pensa e fala dentro dos limites impostos.
E a prova disso está na reação das pessoas quando alguém ousa sair do script. Elas mesmas, sem ordem de ninguém, se mobilizam para atacar, punir e isolar o “desalinhado”. Esse é o estágio final da revolução cultural que Olavo, Gordon e Lobaczewski descreveram de ângulos diferentes, mas que no Brasil virou o ar que se respira sem que a gente note.
Depois que você entende o que Flávio Gordon chamou de A Corrupção da Inteligência, fica difícil olhar para a nossa elite intelectual e achar que ela está apenas equivocada. Ele mostra que boa parte dos intelectuais brasileiros não são apenas vítimas de más ideias, mas cúmplices conscientes de um projeto que usa a autoridade acadêmica para legitimar mudanças culturais que o povo nunca pediu. É como se o sujeito vestisse um jaleco de cientista social e, de dentro da sala de aula ou de um artigo de jornal, dissesse: “isso aqui é verdade porque eu estou dizendo que é”.
Plinio Corrêa de Oliveira, lá atrás, em Revolução Cultural e Contrarrevolução, já tinha descrito esse método de forma quase profética. Para ele, a transformação social não acontece de uma vez, mas em ondas. A cada fase, certos valores são corroídos, substituídos por outros, e quando o público se acostuma, a próxima fase já está pronta para ser implantada. A fase que vivemos desde 1989 é só um estágio avançado de um processo que começou bem antes, mas que a redemocratização acelerou, porque abriu espaço para o progressismo ocupar sem resistência as áreas culturais, educacionais e midiáticas.
Jessé Souza, com A Elite do Atraso, embora seja um autor alinhado à esquerda, é um prato cheio para entender a retórica progressista por dentro. O livro é vendido como uma denúncia contra as elites econômicas conservadoras, mas o que ele faz, na prática, é reforçar o mesmo esquema narrativo que Gordon denuncia: dividir a sociedade entre o “bem esclarecido” e o “mal ignorante”. É a cartilha clássica da revolução cultural — criar um inimigo interno para justificar a engenharia social.
Gordon mostra que a corrupção da inteligência não é só um fenômeno moral, mas também institucional. Universidades, sindicatos, ONGs e até órgãos do Estado funcionam como repetidores de um mesmo discurso, sempre com a roupagem de neutralidade científica. Plinio explicaria isso dizendo que é o “processo revolucionário” se entranhando nas estruturas para que, mesmo que haja mudança de governo, a engrenagem continue girando no mesmo sentido.
No dia a dia, essa engrenagem aparece quando você vê uma reportagem sobre “educação inclusiva” que, na prática, não ensina nada além de militância. Ou quando o noticiário dá mais espaço para pautas identitárias do que para discutir economia de forma séria. Gordon chamaria isso de corrupção deliberada da pauta pública; Plinio diria que é uma etapa planejada para deslocar o centro moral da sociedade; e Jessé, ironicamente, serviria de exemplo vivo ao escrever contra uma elite enquanto serve fielmente a outra.
O mais curioso é que Plinio não via a revolução cultural como um fenômeno isolado do Brasil, mas como parte de um movimento internacional que aqui encontrou terreno fértil. A partir de 1989, com a narrativa da “abertura” e da “liberdade reconquistada”, o que veio foi um bombardeio de novos padrões culturais embalados como modernidade. A elite acadêmica, segundo Gordon, foi a primeira a se render a essa lógica, não por ingenuidade, mas por interesse.
Jessé Souza entra no jogo como uma espécie de intelectual de vitrine: ataca o “patrimonialismo” e os “ricos exploradores” enquanto legitima o domínio de uma elite cultural que pensa igual a ele. É o típico “rebelde oficializado” — parece contestador, mas opera dentro dos limites impostos pelo mesmo sistema que diz combater. Isso é perfeito para manter o controle, porque dá ao público a sensação de pluralidade, quando, na prática, todos os lados do debate estão dentro do mesmo guarda-chuva ideológico.
Plinio alertava que essa fase de aparente pluralidade é a mais perigosa, porque o povo acredita que está escolhendo, quando na verdade está só trocando de embalagem. Gordon complementa dizendo que, nesse cenário, o papel da imprensa é criar um teatro de divergências para distrair o público enquanto os fundamentos culturais são reescritos.
Você vê isso nas discussões sobre educação sexual nas escolas, por exemplo. O debate público se foca em detalhes, enquanto a base ideológica que sustenta a pauta — a visão progressista de família e sexualidade — nunca é questionada no espaço oficial. É o que Plinio chamaria de “avanço mascarado”: você discute a velocidade, mas não a direção.
A “corrupção da inteligência” também se vê no jeito como acadêmicos brasileiros importam teorias estrangeiras sem o menor filtro crítico. Basta que algo esteja na moda nas universidades dos EUA ou da Europa para virar dogma aqui. Gordon denuncia isso como servilismo intelectual, e Jessé Souza, em vez de romper com essa lógica, reforça ao usar conceitos prontos para justificar suas teses, como se a realidade brasileira fosse um simples espelho da europeia.
No campo religioso, Plinio via a mesma estratégia sendo aplicada: infiltrar ideias contrárias à doutrina sob o pretexto de atualização e diálogo. Depois de 1989, isso só se intensificou, com figuras da própria Igreja adotando a linguagem progressista. É a revolução cultural entrando até nos espaços onde a resistência deveria ser natural.
Gordon diria que essa infiltração funciona porque a elite intelectual treinada para pensar em termos progressistas se vê como “mediadora da modernidade”. No cotidiano, isso significa que o professor que leciona história ou filosofia muitas vezes está mais preocupado em “formar cidadãos conscientes” (no sentido ideológico) do que em transmitir conhecimento objetivo.
O curioso é que Plinio e Gordon, vindos de contextos tão diferentes, concordariam num ponto central: a luta principal não é política, é cultural. A política é só a superfície visível de um embate muito mais profundo, que decide quais valores serão aceitos e quais serão expulsos da vida pública. Jessé, ainda que de forma não intencional, prova isso ao se dedicar tanto a moldar narrativas quanto a analisar fatos.
Isso explica por que, mesmo com alternância de poder, certas pautas nunca saem de cena. Plinio chamaria isso de irreversibilidade de etapas; Gordon de captura da inteligência; e Jessé, sem perceber, ajuda a consolidar o processo ao fingir que está combatendo os “donos do poder” enquanto defende a mesma matriz cultural que eles.
No dia a dia, essa captura é visível quando uma novela, uma série ou um influencer lança um discurso que se torna instantaneamente regra de conduta social. Ninguém votou nisso, mas todo mundo se sente obrigado a seguir, sob pena de ser cancelado. Gordon mostra que essa é a nova censura: não precisa mais de um Estado opressor, basta uma elite cultural com poder de moldar a opinião pública.
Plinio alertava que, quando a revolução chega a esse estágio, qualquer reação é tratada como retrógrada ou imoral. O adversário não é só derrotado, ele é desmoralizado. Isso garante que o público tenha medo até de se associar com quem pensa diferente.
E assim, a revolução cultural pós-1989 no Brasil não é só um capítulo isolado, mas a continuação de uma longa obra que começou antes, ganhou forma com a abertura política e hoje se mantém pela ação coordenada da elite intelectual corrupta, da engrenagem internacional que Plinio descreveu e dos falsos rebeldes como Jessé, que dão verniz acadêmico à cartilha.
No fim das contas, o que essas três obras mostram é que a maior mentira que contaram ao brasileiro é que ele está num debate aberto. Na prática, o script já foi escrito, e todo mundo que entra na arena cultural ou política só tem duas opções: seguir o texto ou ser cortado da peça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário